27 de agosto de 2025

Tepegoz

۞ ADM Sleipnir


Tepegoz (ou Tepegöz) é uma criatura lendária da mitologia turca, descrita como um ogro com apenas um olho na testa, semelhante a um ciclope. Ele é uma figura central no  Kitab-ı Dede Korkut ("Livro de Dede Korkut"), uma coleção de épicos heroicos dos Oguzes, um dos principais ramos dos povos turcos. A figura de Tepegoz é central em uma das histórias mais dramáticas da obra, sendo símbolo de força monstruosa e ameaça incontrolável, vencida apenas por astúcia e bravura.

Etimologia

Em línguas túrquicas, tepe significa "alto" ou "colina", enquanto göz significa "olho". O termo Tepegoz pode ser interpretado literalmente como "olho no alto" ou "olho da colina". Curiosamente, a abertura circular no topo de uma yurt (habitação tradicional dos povos nômades da Ásia Central) também recebe o nome de tepegoz.


Narrativa no Kitab-ı Dede Korkut

No primeiro capítulo do Kitab-ı Dede Korkut, as terras dos oguzes — localizadas em regiões que hoje correspondem ao Azerbaijão e partes da Turquia — são invadidas por inimigos. Durante a fuga da população, o filho de Aruz Koca, um dos líderes oguzes, é deixado para trás. Contra todas as expectativas, ele sobrevive de maneira extraordinária: criado por leões na floresta, torna-se uma figura selvagem e temida, conhecida por atacar cavalos e beber seu sangue. Eventualmente capturado e levado de volta ao pai, sua humanidade é reconhecida. Com a intervenção do sábio Dede Korkut, o jovem recebe o nome de Basat, que pode ser traduzido como “aquele que pisa com força” ou “devorador de cavalos”.

Paralelamente, origina-se um dos maiores infortúnios da história dos oguzes. Um pastor chamado Konur Koca Sarı, conhecido como “Pastor Amarelo”, comete um terrível ato ao violentar uma peri (fada) em Uzun Pınar, um local sagrado para os oguzes. Tomada por dor e fúria, a peri profetiza:
“Tenho um encargo. Aceite-o no ano que vem, mas saiba disso: você trouxe desastre para os oguzes.”
Após dizer essas palavras, ela desaparece. Um ano depois, retorna e deposita aos pés do pastor uma massa disforme de carne. Algum tempo depois, um pastor chamado Sarı Çoban avista a criatura informe no chão e, tomado pelo medo, foge. Mais tarde, os líderes oguzes descobrem a estranha massa e, ao chutá-la, ela se rompe, revelando um bebê com um único olho no centro da testa: Tepegoz. Apesar da aparência monstruosa, ele é acolhido por Bayındır Khan (o líder de todas as tribos oguzes), a pedido de Aruz Koca.

Contudo, desde cedo, Tepegoz demonstra ser uma ameaça. Ao sugar o leite das amas, também sugava seu sangue, matando várias mulheres. À medida que crescia, tornava-se cada vez mais violento, ferindo outras crianças durante as brincadeiras. Diante disso, Aruz decide expulsá-lo da vila. Exilado, Tepegoz refugia-se em uma montanha sagrada, onde reencontra sua mãe fada. Ela lhe entrega um cinto e um anel mágico que o tornan invulnerável a qualquer arma comum — nem espadas, nem flechas poderiam feri-lo. 

Arte de Bartu Bölükbaşı


A partir deste momento, Tepegoz se transforma em um verdadeiro pesadelo, passando a saquear estradas e a devorar qualquer ser vivo que encontra. Nem mesmo os maiores guerreiros oguzes conseguem detê-lo; metade deles acaba perecendo em tentativas frustradas de derrotá-lo. Diante da catástrofe, os oguzes recorrem novamente a Dede Korkut, que decide enfrentar o monstro em sua caverna. Lá, implora por piedade, e Tepegoz acaba impondo uma exigência cruel: deseja receber sessenta pessoas por dia como tributo. Dede Korkut consegue reduzir o número para dois homens e quinhentas ovelhas diárias, além de dois anciãos para cozinhar suas refeições. O acordo é mantido por um tempo, mas, quando os recursos se esgotam, Tepegoz volta a atacar com fúria ainda maior.


A esperança dos oguzes renasce com o retorno de Basat, que havia passado a juventude afastado da comunidade. Ao descobrir os horrores provocados por Tepegoz — incluindo a morte de seus irmãos e de muitos guerreiros —, jura vingança. Ignorando os alertas dos anciãos, parte sozinho para o covil do monstro. Na caverna, tenta matar Tepegoz com flechas, mas elas não surtam efeito. Fingindo ser uma das vítimas enviadas como tributo, Basat permite ser capturado e é trancado dentro de uma bota, onde seria assado mais tarde. À noite, consegue escapar com a ajuda de um punhal. Os cozinheiros idosos então acabam lhe revelando que o único ponto vulnerável do corpo de Tepegoz é o seu olho. Aproveitando-se do sono do monstro, Basat aquece um espeto de ferro em brasa e o crava no olho de Tepegoz, cegando-o por completo. 

Arte de Hazar Çatak

Mesmo cego, o monstro tenta matar Basat com armadilhas e ataques, mas falha repetidamente. A cada investida frustrada, pergunta:

“Você ainda não morreu?”

Ao que Basat responde:

“Foi Deus quem me salvou!”

Por fim, Basat encontra uma espada mágica escondida na caverna e com ela decapita Tepegoz, encerrando seu reinado de terror. Com sua morte, os oguzes finalmente se veem livres da ameaça que os assombrava há tanto tempo.

Interpretações e paralelos culturais

O conto de Tepegoz é interpretado por estudiosos como uma representação mítica dos conflitos históricos entre os Pechenegues e os Kipchaks, povos nômades das estepes euroasiáticas. A semelhança, por sua vez, da figura de Tepegoz com o ciclope Polifemo da Odisséia de Homero, levou à especulação de que o mito turco possa ter sido influenciado por narrativas helênicas ou partilhado uma origem comum com elas.


fontes:

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