۞ ADM Sleipnir
Arte de Rodrigo Viany (Sleipnir) |
Tainá-can (também Tahina-Can, Tainacan, Thaina Khan ou Takinahaky) é uma figura presente na cultura do povo indígena Karajá (autodenominado Iny, "nós"), originário do centro-oeste do Brasil. Sua história, transmitida através da tradição oral, entrelaça elementos da cosmovisão indígena, ensinamentos ancestrais e a beleza da língua Karajá.
De acordo com uma versão da história, colhida entre os Karajá em torno do rio Araguaia e publicada pelo professor Hebert Baldus (1899-1970), em um tempo onde os Karajá não conheciam o plantio e a roça, vivendo apenas de frutas e da caça, havia um casal que possuía duas filhas: Imaeru (também Imaherô), a mais velha, e Denaquê (também Denakê, Danace), a mais nova. Certa noite estrelada, Imaeru viu uma estrela chamada Tainá-can, tão bonita e brilhante que ela não se conteve e disse ao pai:
— Pai, aquilo é tão bonito! Queria tanto tê-lo para brincar comigo.
O pai riu com o desejo da filha e explicou que Tainá-can estava tão longe que ninguém podia alcançá-lo. Mas ele acrescentou:
— Só se ele te ouvir e decidir vir até você.
Mais tarde, quando todos dormiam, Imaeru sentiu alguém se aproximar e sentar ao seu lado. Num sussurro, perguntou:
— Quem é você, e o que quer de mim?
— Eu sou Tainá-can; ouvi que você queria que eu estivesse perto de você, então vim. Você quer casar comigo?
Imaeru acordou os pais e acendeu uma fogueira, cuja luz revelou a aparência de Tainá-can: um velho de cabelos e barbas brancas como algodão e pele enrugada. Ao vê-lo, Imaeru disse:
- Eu não o quero como marido. Você é muito velho e feio. Eu quero um marido forte e bonito.
Tainá-can ficou muito triste e começou a chorar, mas Denaquê, com um coração bondoso, teve pena dele e consolou-o, dizendo ao seu pai:
— Eu caso com ele. Quero ele como meu marido.
O casamento aconteceu, deixando o velho Tainá-can muito feliz. Depois do casamento, Tainá-can decidiu trabalhar para sustentar Denaquê, plantando culturas que os Karajá não conheciam. Ele foi ao rio Araguaia, onde mergulhou as mãos na água para colher sementes que flutuavam rio abaixo. As águas lhe deram sementes de milho, mandioca e outras plantas que os Karajá passaram a cultivar.
Ao voltar, Tainá-can disse a Denaquê que iria derrubar mato para fazer uma plantação, mas pediu que ela não o seguisse, apenas cuidasse da comida para recebê-lo quando ele voltasse cansado. Denaquê, preocupada com o cansaço do velho marido, decidiu segui-lo em segredo. Para sua surpresa e felicidade, ao chegar na plantação encontrou um jovem bonito e forte trabalhando. Reconhecendo o marido, correu para ele louca de alegria e o abraçou. Depois, tratou de levá-lo para casa e mostrar os pais a verdadeira forma de seu marido.
Cena da animação Tainá-Kan, a Grande Estrela (2006) |
Imaeru, movida pelo desejo, foi até Tainá-can e disse:
-Você é meu marido, pois você veio até mim e não à Denaquê!
Tainá-can porém lhe respondeu:
- Em Denaquê encontrei a bondade. Mesmo sendo apenas um velho; ela me aceitou, enquanto você me desprezou. Agora não te quero! Somente Denaquê.
Tomara pela inveja, Imaeru soltou um grito e desapareceu, transformando-se em um urutau, cujo canto triste e forte ainda ecoa até hoje.
Assim, a tribo Karajá aprendeu com Tainá-can a plantar novas culturas, como milho, mandioca e outros, trazendo prosperidade para seu povo.
A Participação de Tupã em outra versão do mito
Na versão do mito narrada pelo autor Waldemar de Andrade e Silva (1933-2015), o deus Tupã desempenha o papel de intermediário entre os desejos humanos e a ordem divina. Imaeru, a filha do Pajé, deseja desposar a estrela Tainá-can. Seu pai, preocupado com sua angústia, pede a Tupã que realize esse desejo. Tupã concede, mas com a condição de que a estrela desça à Terra na forma humana.
Quando Tainá-can aparece na forma de um velho, Imaeru o rejeita por sua aparência. No entanto, sua irmã, Denaquê, casa-se com o velho e é recompensada quando Tupã o transforma em um homem jovem e belo. Imaeru, invejosa, deseja o marido da irmã, mas o laço entre Denaquê e Tainá-can é forte, levando-os a desaparecerem na mata. Em sua tristeza e inconformidade, Imaeru é transformada por Tupã no pássaro urutau, lamentando a perda do amor que tanto almejava.
Arte de IStarLightArt |
fontes:
- BALDUS, H. Lendas dos indios do Brasil. Editora Brasiliense, 1946.
- SILVA. Lendas e mitos dos índios brasileiros. FTD, 1999.
- MAGOS E ANJOS. Disponível em: <https://intervox.nce.ufrj.br/~claraluz/lendas/tainacan.htm>. Acesso em: 25 abr. 2024.
- Tainacan – Museu Regional Casa Dos Ottoni. Disponível em: <https://museuregionalcasadosottoni.museus.gov.br/tainacan/#:~:text=O%20nome%20Tainacan%2C%20prov%C3%A9m%20da>. Acesso em: 25 abr. 2024.
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