۞ ADM Sleipnir
Dobrynya Nikitich (em russo: Добрыня Никитич) é um dos mais renomados bogatyrs (cavaleiros épicos) da tradição folclórica russa, destacando-se nas bylinas — canções épicas que narram as aventuras dos heróis do período medieval da Rússia de Kiev. Embora seja uma figura lendária, Dobrynya tem raízes históricas, sendo inspirado em um verdadeiro comandante militar que serviu sob o comando de Svyatoslav, o Grande, e atuou como tutor de seu filho, Vladimir, o "Sol Brilhante" .
A história de Dobrynya Nikitich começa ao lado de seu amigo e companheiro de viagem, o bogatyr Dunai Ivanovich, com quem partiu da corte do Príncipe Vladimir, em Kiev, em direção à Lituânia. A missão dos dois era trazer a princesa Evpraksiya para que ela se tornasse esposa de Vladimir. Na Lituânia, Dobrynya demonstrou sua habilidade diplomática ao convencer o rei a permitir o casamento, apesar da baixa estima que o monarca nutria por Vladimir. Após Dunai Ivanovich partir em perseguição a um misterioso saqueador que ameaçava o acampamento durante a noite, Dobrynya retornou sozinho com a princesa para Kiev.
O confronto com Gorynych
Além de suas habilidades diplomáticas, Dobrynya é famoso por seu confronto com dragões. Certa vez, ele matou os filhotes de uma dragonesa chamada Gorynych, o que levou sua mãe, Amelfia Timofeyevna, a adverti-lo para nunca mais retornar às Montanhas Sorochinsk, onde a criatura vivia, nem se aproximar do ri'o Puchai. No entanto, Dobrynya ignorou os conselhos da anciã, considerando-os meras divagações, e acabou retornando às terras dos dragões. Cansado e coberto de poeira após uma longa jornada, Dobrynya decidiu se refrescar no rio Puchai. Ele deixou suas roupas e armas na margem, junto ao seu cavalo, e mergulhou nas águas. Mal entrou na correnteza, chamas e faíscas irromperam no ar, acompanhadas por uma espessa fumaça negra. Da névoa surgiu a dragonesa de doze cabeças, Gorynych, a mesma cuja ninhada ele havia exterminado anteriormente.
Ao avistar Dobrynya, a dragonesa perguntou o que deveria fazer com ele. Percebendo o perigo, ele mergulhou novamente e nadou até a margem oposta a que suas roupas e armas estavam. Seu cavalo, assustado com a presença da criatura, já havia fugido. Quando tudo parecia perdido, Dobrynya avistou um chapéu de sacerdote caído na grama. Como um bogatyr, ele sabia que poderia transformar o objeto em uma arma poderosa. No entanto, ao tentar erguê-lo, percebeu que era extremamente pesado. No momento em que a dragonesa voou em sua direção, Dobrynya brandiu o chapéu com todas as suas forças e decepou as cabeças de Goryshche. Ferida e caída no chão, a dragonesa implorou por misericórdia, prometendo nunca mais atacar as terras da Santa Rússia nem sequestrar seu povo. Dobrynya, por sua vez, jurou nunca mais retornar às Montanhas Sorochinsk e, em um ato de clemência, libertou a criatura.
Sem cavalo e sem armas, Dobrynya teve que retornar a pé para Kiev. Ao chegar, descobriu que, durante sua longa ausência, uma tragédia havia ocorrido na corte do Príncipe Vladimir: a dragonesa Gorynych, que ele havia poupado anteriormente, rompeu sua promessa. Sobrevoando a cidade, a criatura capturou a princesa Zabava, sobrinha favorita de Vladimir, segurando-a entre suas mandíbulas. Vladimir, desesperado, convocou seus cavaleiros e desafiou-os a resgatar a jovem. Alyosha Popovich, filho do bispo Leôncio, sugeriu que Dobrynya era o mais indicado para a missão, já que conhecia bem a dragonesa e afirmou que a criatura o considerava como um irmão. Ao ouvir isso, Vladimir ordenou que Dobrynya trouxesse de volta a princesa ou enfrentasse a decapitação.

Preocupado, Dobrynya retornou para casa e contou à mãe sobre o ocorrido, reclamando que teria que caminhar até as Montanhas Sorochinsk, pois não possuía mais um cavalo. Sua mãe, então, revelou que o velho garanhão castanho de seu pai ainda estava nos estábulos, atolado em esterco. Ela aconselhou o filho a limpar e alimentar o cavalo, além de descansar bem durante a noite. Na manhã seguinte, Dobrynya seguiu os conselhos da mãe. Antes de partir, ela lhe entregou um chicote de seda, dizendo que, caso o cavalo enfraquecesse, ele deveria usá-lo. Guardando o chicote no bolso, Dobrynya montou o castanho, que saltou sobre os muros da cidade e disparou velozmente, sendo impossível de acompanhar com os olhos. Rapidamente, chegaram às encostas das Montanhas Sorochinsk, onde o solo fervilhava com os filhotes da dragonesa. Dobrynya atacou-os, esmagando-os com seu cavalo. Contudo, após algum tempo, a montaria começou a desfalecer devido às mordidas dos filhotes. Lembrando-se das palavras de sua mãe, Dobrynya pegou o chicote de seda e bateu suavemente entre as orelhas e patas traseiras do animal. Imediatamente, a força do cavalo foi restaurada, permitindo que seguissem até a caverna da dragonesa.
Como era de se esperar, Gorynych não ficou nada feliz ao ver Dobrynya. Ela reclamou amargamente pela morte de seus filhotes e, ainda mais, pelo fato de que Dobrynya, um cavaleiro da Santa Rússia, havia quebrado sua palavra ao retornar às Montanhas Sorochinsk. Dobrynya, no entanto, revidou, lembrando que foi a própria dragonesa quem primeiro rompeu o pacto ao atacar Kiev e sequestrar a princesa Zabava. Em seguida, exigiu que a jovem fosse devolvida. Quando Gorynych recusou, Dobrynya atacou.
O combate entre os dois durou três dias, até que Dobrynya finalmente saiu vitorioso. No entanto, ao olhar ao redor, percebeu que estava cercado por um imenso lago formado pelo sangue da dragonesa, um lago que a terra não conseguia absorver. Clamando pela Mãe Terra (Mati-Syra-Zemlya), Dobrynya ordenou que ela se abrisse e engolisse o sangue do monstro. Imediatamente, surgiu uma fenda gigantesca, e o lago foi drenado.
Descendo de seu cavalo, Dobrynya entrou no labirinto de cavernas onde a dragonesa vivia. Lá dentro, encontrou e libertou centenas de russos aprisionados, até que, na última câmara, finalmente descobriu a princesa Zabava. Guiando-a para fora, Dobrynya a colocou na frente dele, sobre o cavalo, e partiu de volta para Kiev com a mesma velocidade com que havia partido. Ao retornar, Dobrynya foi aclamado como um grande herói pelo Príncipe Vladimir e por todo o povo da cidade. Em casa, ele também foi recebido por seu leal cavalo, Voroneyushka, “Pequeno Corvo”, que havia retornado ao seu estábulo. A cidade celebrou a bravura e o sucesso de Dobrynya, marcando mais um triunfo nos feitos lendários do grande bogatyr.

A busca por uma esposa
No entanto, apesar de sua popularidade e glória, Dobrynya começou a mergulhar em pensamentos melancólicos, passando horas olhando pela janela. Quando sua mãe, Amelfia Timofeyevna, perguntou o que o afligia, ele confessou que sentia que já deveria ter se casado há muito tempo, mas todas as moças da cidade já estavam comprometidas. Sua mãe, sempre sábia, sugeriu que, se ele desejasse encontrar uma esposa, precisaria viajar para além dos limites de Kiev. A ideia imediatamente o encantou, pois, mesmo que não encontrasse uma noiva, ao menos teria novas aventuras para viver. Ao se dirigir aos estábulos para preparar sua jornada, sua mãe o chamou e aconselhou-o a deixar Voroneyushka para trás, levando, em vez disso, o cavalo que havia pertencido a seu pai — o mesmo que o servira tão bem em sua missão para resgatar a princesa Zabava. Dobrynya seguiu o conselho, armou-se e partiu rumo às vastas estepes russas.
Pouco depois de iniciar sua jornada, Dobrynya encontrou rastros de outro cavaleiro e, movido pela curiosidade, decidiu segui-los. Após cavalgar por um curto tempo, avistou uma polianitsa — uma mulher-guerreira — galopando em um cavalo negro como a noite. Sem hesitar, Dobrynya sacou seu arco e disparou uma flecha. A flecha atingiu o capacete da guerreira, mas caiu no chão sem causar qualquer dano. Ele disparou uma segunda flecha, com o mesmo resultado. Ao lançar uma terceira flecha, a guerreira finalmente parou e olhou ao redor. Ao avistar Dobrynya, ela se aproximou, agarrou-o pelos cabelos e o ergueu do cavalo, colocando-o dentro de um saco profundo que sempre carregava consigo.
Por três dias inteiros, Dobrynya permaneceu em silêncio dentro do saco, remoendo sua humilhante situação enquanto era levado pelas estepes. No quarto dia, o cavalo da guerreira tropeçou e reclamou, dizendo que não conseguia mais carregar tanto peso — afinal, levava tanto uma polianitsa quanto um bogatyr' (cavaleiro lendário). A guerreira, então, desceu de seu cavalo, retirou Dobrynya do saco e exigiu saber quem ele era. Ela declarou que, se ele fosse mais velho que ela, o mataria; se fosse mais jovem, o tomaria como irmão; e se tivessem a mesma idade, deveriam se casar. Dobrynya recusou-se a responder, mas o cavalo da mulher o reconheceu e revelou que seu nome era Dobrynya Nikitich e que ele tinha exatamente a mesma idade da guerreira. Ao ouvir isso, a mulher revelou seu próprio nome: Nastasya Mikulishna.
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| Nastasya Mikulishna |
Concluindo que eram da mesma idade, ela declarou que deveriam se casar. Dobrynya, surpreso mas impressionado com a força e determinação da guerreira, aceitou a proposta. Juntos, eles retornaram a Kiev. Na cidade, a mãe de Dobrynya, Amelfia Timofeyevna, deu uma calorosa recepção a Nastasya, e logo uma grande festa de casamento foi organizada. O Príncipe Vladimir e sua esposa Evpraksiya compareceram às celebrações, que duraram três dias e três noites, marcando a união dos dois guerreiros. Após o casamento, Nastasya abandonou sua vida de guerreira e passou a viver com Dobrynya e sua mãe, assumindo o papel de uma esposa tradicional russa.
A partida de Dobrynya Nikitich para a Lituânia
Cerca de três anos após seu casamento, o Príncipe Vladimir organizou um grandioso banquete em Kiev, convidando todos os bogatyri (cavaleiros heróicos) para comparecer. À medida que a celebração chegava ao fim, Vladimir se dirigiu aos cavaleiros presentes, perguntando quem estaria disposto a liderar um exército contra um inimigo que havia atacado seu sogro, o Rei da Lituânia. Nenhum dos bogatyri respondeu ao chamado. O príncipe repetiu a pergunta, e desta vez Alyosha Popovich se levantou, sugerindo que ninguém seria mais qualificado para a missão do que Dobrynya Nikitich, já que ele havia servido no exército do Rei da Lituânia e conhecia bem a região. Apesar de sua relutância inicial, Dobrynya concordou em liderar a expedição e foi para casa se preparar para a batalha.
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| Dobrynya Nikitich e Alyosha Popovich |
Lá, sua mãe, Amelfia Timofeyevna, percebeu sua inquietação e perguntou o que estava acontecendo. Com grande pesar, Dobrynya contou sobre a missão, tentando tranquilizá-la ao dizer que, se morresse, se juntaria ao pai, Nikita, no céu, e que um dia ela também se encontraria com ele lá. Tomada pela emoção, Amelfia o abençoou, mas logo correu para contar a Nastasya sobre a partida iminente de seu marido. Ao ouvir a notícia, Nastasya correu para Dobrynya, e ele explicou sua missão. Ele então pediu que ela o esperasse por doze anos. Se nesse tempo ele não retornasse, Nastasya deveria dividir sua riqueza entre a igreja e os pobres e, depois disso, buscar um novo marido. No entanto, Dobrynya aconselhou-a a não se casar com Alyosha Popovich, pois os dois haviam trocado cruzes e, aos olhos de Deus, eram considerados irmãos. Com isso, Dobrynya beijou sua esposa, montou em seu cavalo e partiu para a Lituânia.
A Espera de Nastasya
Passaram-se três anos, e Dobrynya não retornou. Foi então que Alyosha Popovich chegou a Kiev trazendo a notícia de sua morte. Sua mãe, Amelfia Timofeyevna, chorou a perda do filho, mas Nastasya recusou-se a acreditar, mantendo sua vigilância e esperança. Mais três anos se passaram, e Alyosha Popovich mais uma vez chegou a Kiev trazendo a notícia da morte de Dobrynya Nikitich. Novamente, Nastasya recusou-se a acreditar nele. Seu coração insistia em dizer que ele ainda estava vivo, e ela continuou esperando, fiel à promessa que havia feito.
Mais seis anos se passaram antes que Alyosha Popovich retornasse à corte do príncipe Vladimir, mais uma vez trazendo a notícia da morte de Dobrynya Nikitich. Dessa vez, embora Nastasya ainda não acreditasse plenamente na morte do marido, ela sabia que já cumprira sua promessa de esperá-lo por doze anos. Assim, com o coração pesado, aceitou se casar com Alyosha Popovich. Toda a cidade de Kiev se preparou para o casamento, que seria um grande evento, repleto de celebrações. Enquanto isso, na fronteira da Lituânia, Dobrynya Nikitich dormia profundamente, mergulhado em um sono longo e misterioso, alheio ao que acontecia em sua terra natal.
O retorno de Dobrynya à Kiev
Ao despertar, Dobrynya viu duas pombas brancas entrarem em sua tenda. As aves sussurraram-lhe notícias sobre os preparativos para um casamento que acontecia naquele mesmo momento em Kiev: o casamento de Alyosha Popovich e Nastasya. Ao ouvir isso, Dobrynya se levantou de imediato, reuniu suas posses, montou seu fiel cavalo, Voroneyushka, e galopou como o vento em direção a Kiev. Sua mente estava tomada por uma mistura de urgência e determinação, pois sabia que não poderia permitir que o casamento acontecesse. Ao chegar em Kiev, Dobrynya reencontrou sua mãe, Amelfia Timofeyevna, que chorou de alegria ao ver o filho vivo e são. No entanto, ele não foi direto ao palácio para revelar seu retorno. Em vez disso, decidiu se disfarçar como um menestrel, vestindo roupas simples e pegando um instrumento musical.
Disfarçado, Dobrynya se dirigiu à festa de casamento. Ele se sentou sobre o fogão, o lugar tradicional reservado para menestréis e mendigos, e começou a cantar. Suas canções eram melodiosas, mas carregadas de emoção, entoando versos sobre amor, saudade e traição. Cada nota parecia ecoar a história de sua própria vida, e todos os presentes, incluindo Nastasya e Alyosha, ficaram hipnotizados pela voz do misterioso menestrel. A voz do menestrel tocou profundamente Nastasya, que, emocionada, pediu ao Príncipe Vladimir permissão para oferecer-lhe uma bebida. O príncipe concordou, e Dobrynya aceitou o cálice de sua esposa. Em seguida, ele pediu permissão para retribuir o gesto. O príncipe permitiu, e Dobrynya entregou a Nastasya uma taça de hidromel. Ela levou o cálice aos lábios, e algo brilhou no fundo da taça. Era o anel de casamento de Dobrynya.
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| "Dobrynya Nikitich no banquete do príncipe Vladimir". Arte de Nikolay Karazin |
Ao reconhecê-lo, Nastasya caiu ao chão, tomada pelo desespero, e implorou pelo perdão do marido. Um silêncio sepulcral se espalhou pelo banquete. Todos os presentes voltaram seus olhares para o menestrel e, finalmente, perceberam que ele não era um simples cantor, mas sim Dobrynya Nikitich, vivo e diante deles. O Príncipe Vladimir o recebeu com alegria, mas Dobrynya só tinha olhos para um homem naquele salão: Alyosha Popovich.
Dobrynya perdoou sua esposa, pois sabia que ela não poderia ter adivinhado a verdade sobre seu retorno. No entanto, quando Alyosha se ajoelhou diante dele, implorando perdão, Dobrynya recusou-se a aceitá-lo. Em um surto de fúria, agarrou Alyosha pelo pescoço, lançou-o ao chão e sacou sua espada. Com os olhos ardendo de ira, ergueu a lâmina para matá-lo. Mas, antes que pudesse desferir o golpe, Ilya Muromets interveio. O lendário bogatyr segurou o braço de Dobrynya e impediu o derramamento de sangue. Respirando fundo, Dobrynda embainhou sua espada, virou-se sem dizer uma palavra e deixou o palácio, levando Nastasya consigo. A partir daquele dia, Dobrynya Nikitich nunca mais dirigiu uma única palavra a Alyosha Popovich. E assim, Dobrynya e Nastasya viveram o resto de seus dias em paz e felicidade.

fontes:
- DIXON-KENNEDY, M. Encyclopedia of Russian and Slavic myth and legend. Oxford: Abc-Clio, 1999.
- WIKIPEDIA CONTRIBUTORS. Dobrynya Nikitich. Disponível em <https://en.wikipedia.org/wiki/Dobrynya_Nikitich>
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como ja sabem eu estou criando um livro falando sobre bestas, animais e criaturas da mitologia e do folclore obrigado pelas dicas dadas porem eu quero mais dicas sobre a criação do meu livro
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