10 de janeiro de 2025

A Jornada ao Oeste: Capítulo XLI

۞ ADM Sleipnir

Arte de Moyi Zhang

CAPÍTULO XLI:

O MACACO DA MENTE É DERROTADO PELO FOGO. A MÃE MADEIRA É CAPTURADA PELO MONSTRO.

"Não se preocupe com o bem ou o mal, a honra ou a vergonha, a verdade ou a mentira, pois o sucesso, os fracassos, as lutas e o descanso vêm e vão continuamente. É preciso viver de acordo com as próprias necessidades e aceitar, sem resistências, o destino que nos cabe. Apenas quem se mantém sereno alcança a paz absoluta e eterna, enquanto aqueles que se deixam levar pelas inquietações da vida tornam-se presas fáceis dos demônios. Assim como a brisa traz alívio com o tempo, as Cinco Fases triunfarão sobre qualquer armadilha."

O Monge Sha adentrou na floresta, enquanto o Grande Sábio e Bajie avançavam com passos firmes rumo à caverna. Com um salto, cruzaram o Riacho do Pinheiro Seco, aterrissando sobre um monte de rochas incomuns, atrás das quais se abria a entrada da caverna. O cenário diante deles era verdadeiramente encantador. O caminho até a entrada estava imerso em um silêncio tão profundo que parecia impossível encontrar, em todo o universo, um lugar mais propício à meditação. Ao longe, ouvia-se o canto das garças negras, levados até eles através do vento. Debaixo de uma ponte, o riacho fluía tranquilamente, brilhando como uma jóia sob os raios do sol. A brancura das nuvens era refletida em suas águas, formando uma silhueta que se assemelhava a uma dama vaidosa. Os macacos e as aves selvagens moviam-se em meio a um verdadeiro labirinto de flores exóticas, gritando sem cessar. As rochas estavam cobertas por trepadeiras e delicadas orquídeas. Das fendas cobertas de musgo, subiam colunas de fumaça e de névoa. Os bambus e pinheiros, sempre verdes, pareciam saudar as fênixes que sobrevoavam a paisagem. Ao longe, as altas montanhas evocavam enormes biombos de pedra. Não havia dúvidas: aquele era o lar de um verdadeiro imortal. O riacho que ali passava tinha sua origem na cordilheira de Kunlun e parecia destinado a servir de deleite a uma criatura extraordinária.

O Peregrino e Bajie avistaram no lintel da caverna uma grande placa de pedra, onde estava inscrito: "Caverna da Nuvem de Fogo. Riacho do Pinheiro Seco." Logo abaixo dessa magnífica inscrição, um grupo de pequenos demônios saltitando ao redor empunhando espadas e lanças.

O Grande Sábio ergueu a voz ao vê-los e declarou:

— Ei, vocês aí! Avisem imediatamente ao seu senhor que, se ele não libertar o monge Tang sem demora, eu acabarei com todos vocês e destruirei essa caverna até os alicerces!

Os demônios correram imediatamente para o interior da caverna, fecharam com força os dois portões de pedra e foram apressados comunicar ao seu senhor, em grande agitação:

— Estamos arruinados, grande rei! Uma desgraça caiu sobre nós!

Após capturar Sanzang e levá-lo para a caverna, o monstro o obrigou a se despir, amarrou suas mãos e pés como se fosse um porco, e o deixou jogado no pátio dos fundos. Alguns demônios ficaram encarregados de lavá-lo com cuidado, preparando-o para ser posteriormente cozinhado e devorado. Estavam no meio dessa tarefa quando ouviram os gritos apavorados de seus companheiros. Imediatamente largaram o que faziam e correram para perguntar:

— O que aconteceu? De que desgraça estão falando?

— Lá fora — explicou um deles, ofegante — há um monge com o rosto todo coberto de pelos e uma voz que parece um trovão. Ele está acompanhado por outro, que tem orelhas enormes e um focinho bem protuberante. Os dois exigem que entreguemos o mestre deles, um tal monge Tang. Disseram que, se não fizermos isso agora, vão acabar conosco e destruir esta caverna até os alicerces!

— Pelo que dizem, esses devem ser o Peregrino Sun e Zhu Bajie  — comentou o monstro, esboçando um sorriso desdenhoso. — Parece que não são nada tolos e sabem onde procurar. Do lugar onde capturei o mestre deles até aqui, há uma distância de cerca de cento e cinquenta quilômetros. Não consigo entender como conseguiram chegar aqui tão rápido.

Virando-se para os seus servos, ordenou:

— Tragam as carroças!

Sem demora, alguns demônios abriram uma porta e, com grande esforço, trouxeram cinco pequenas carroças. Ao ver a cena, o Peregrino comentou com Bajie:

— Que sorte a nossa! Parece que ficaram com medo e decidiram se mudar para outro lugar. Porém — acrescentou imediatamente — quem está prestes a viajar não coloca as carroças de forma tão estranha.

Os demônios haviam colocado, de fato, uma carroça em cada um dos pontos correspondentes às Cinco Fases — madeira, metal, fogo, água e terra —, protegidas por guardas bem armados. Os demais correram para dentro da caverna.

— Está tudo pronto? — perguntou o monstro.

— Sim, está — responderam eles.

— Nesse caso — concluiu o monstro —, tragam-me a lança.

Os demônios responsáveis pela armeria trouxeram imediatamente uma enorme lança com a ponta em chamas, que entregaram respeitosamente ao seu senhor. O monstro sequer se deu ao trabalho de vestir uma armadura. Vestindo apenas uma túnica de seda ricamente bordada, saiu ao encontro de seus dois adversários.

O Peregrino e Bajie ficaram surpresos ao vê-lo avançar descalço. Seu rosto era tão branco que parecia coberto de pó de arroz, enquanto seus lábios, carnudos e intensamente vermelhos, davam a impressão de terem sido pintados com um pincel. Seu cabelo possuía a escuridão da noite, um tom tão profundo que nenhum tintureiro seria capaz de reproduzir. As sobrancelhas arqueadas lembravam a lua crescente, embora, por serem tão rústicas, parecessem terem sido esculpidas com facas. Os bordados de sua túnica exibiam uma fênix e um dragão entrelaçados. Sua constituição era tão robusta quanto a do próprio Nezha, evidenciada ainda mais pelo tamanho de sua lança flamígera. Sua voz tinha a força de um trovão na primavera, uma impressão reforçada pelo brilho extraordinário de seus olhos, que evocavam o fulgor cegante de um relâmpago. Não havia dúvida de que seu nome, o Menino Vermelho, estava destinado a permanecer na memória para sempre.

— Posso saber quem ousa perturbar a paz de minha morada? —perguntou  o monstro com voz potente, assim que apareceu do lado de fora da caverna.

— Meu querido sobrinho! — exclamou o Peregrino, aproximando-se com um sorriso nos lábios. — Pare de se comportar dessa maneira, por favor. Hoje de manhã, quando se pendurou em um pinheiro fingindo ser um jovem assustado e frágil, conseguiu enganar meu mestre, mas não a mim. Mesmo assim, carreguei você de boa fé, mas acabou usando isso para capturar meu mestre enquanto montado um vento furioso. Acha que não tenho motivos para exigir que o liberte imediatamente? Não adianta fingir que tudo foi apenas um mal-entendido. Deixe de agir como um garoto imprudente e seja razoável. Não vai querer prejudicar nossa relação de parentesco, certo? Se o seu pai souber do que aconteceu, é bem provável que me culpe, alegando que abusei de alguém da sua idade, quando, na verdade, foi o contrário.

— Maldito macaco! — replicou o monstro, furioso. — Quer me explicar que parentesco tenho com você? De onde vem essa história toda e, acima de tudo, por que me chama de sobrinho?

— Parece que você não sabe de nada — respondeu o Peregrino. — Há muito tempo, antes mesmo de você nascer, seu pai e eu fizemos um pacto de irmandade. Não sabia disso?

— Esse macaco só sabe falar bobagens! — bradou o monstro. — Como podemos ser parentes se viemos de lugares completamente diferentes? Além disso, explique melhor essa história de pacto de irmandade!

— Com muito prazer — respondeu o Peregrino. — Sou Sun Wukong, o Grande Sábio, Sósia do Céu. Há aproximadamente quinhentos anos, causei um enorme tumulto nos Céus. Antes disso, fiz frequentes viagens pelos Quatro Grandes Continentes, e não houve um só lugar na Terra onde eu não tenha pisado. Para mim, naquela época, era de extrema importância estabelecer laços com pessoas de valor e cercadas de heroísmo. Foi nessa época que seu pai, o Rei Touro Demônio, se autodenominou o "Grande Sábio, Reflexo do Céu". Junto com outros cinco heróis, formamos uma irmandade, onde ele ocupava a liderança. O segundo posto ficou com o Rei Dragão Demônio, que assumiu o título de "Grande Sábio, Senhor do Oceano". O terceiro foi ocupado pelo Rei Peng Demônio, que se autodenominou "Grande Sábio do Céu Caótico". O quarto foi ocupado Rei Espírito Leão, que tomou o título de "Grande Sábio, Senhor da Montanha". O quinto pertenceu ao Rei Espírito Macaca, que adotou o título de "Grande Sábio da Brisa Serena". O sexto foi reservado ao Rei Espírito Macaco Dourado, que se chamou "Grande Sábio, Flagelo dos Deuses". Por fim, coube a mim, o Grande Sábio, Sósia do Céu, o sétimo e último lugar, pois, por ser o menor de todos, eu não superava ninguém em tamanho. Essa foi uma das épocas mais felizes da minha vida, e você sequer havia nascido.

O monstro, incrédulo, recusou-se a acreditar na história e lançou contra o Peregrino uma terrível estocada de fogo com sua lança. Felizmente, Wukong era um lutador habilidoso e conseguiu desviar o golpe a tempo, movendo-se para o lado e erguendo o bastão de ferro no momento exato.

— Maldita besta! — bradou Wukong, furioso. — Você é tão tolo que não sabe distinguir um amigo de um inimigo. Agora vai pagar caro ao sentir o peso do meu bastão!

— Macaco insolente! — gritou o monstro, bloqueando o golpe de seu adversário. — Não sabe o que está dizendo! Quem deveria temer é você, diante da minha lança!

Os dois pareciam ter esquecido de vez qualquer vínculo familiar que pudesse existir entre eles. Usando magia, ergueram-se aos limites do firmamento, onde travaram uma luta verdadeiramente espetacular. A fama do Peregrino era imensa, mas a do monstro não ficava atrás. Os golpes do bastão de ferro eram respondidos com igual eficácia pela lança de lâmina flamejante. O estrondo da batalha era tão intenso que uma névoa densa se espalhou pelas Três Regiões, mergulhando os quatro pontos cardeais em uma completa escuridão. Os golpes ecoavam pelo céu, como o som de um sino ressoando dentro de uma abóbada. Estremecidos, o sol, a lua e as estrelas cessaram de emitir luz. Tamanho era o ódio e o desprezo que consumia os dois oponentes que, em nenhum momento, trocaram sequer uma palavra. A luta era marcada por uma ferocidade selvagem, completamente alheia a normas ou restrições. O bastão desferia golpes cada vez mais precisos, enquanto a lança os bloqueava com incrível agilidade. Não poderia ser de outra forma, já que um dos combatentes era o próprio Grande Sábio, e o outro, o jovem Sudhana (1). Ambos estavam determinados a vencer, pois o prêmio era nada menos que o monge Tang em pessoa.

Mais de vinte vezes o monstro e o Grande Sábio cruzaram suas armas, mas o desfecho da batalha permanecia tão incerto quanto no início. Observando o combate, Zhu Bajiepercebeu claramente o que estava acontecendo: embora o monstro não estivesse nem perto de ser derrotado, ele apenas se defendia dos golpes, movendo-se de um lado para o outro, sem atacar seu oponente. Por outro lado o Peregrino, com sua habilidade e destreza inegáveis, fazia todo o esforço para derrotá-lo. Todos os seus ataques eram direcionados à cabeça de seu adversário, o que levou Bajie a pensar:

— Que astúcia a do Peregrino! Ele está tentando atrair o monstro o mais perto possível para, em seguida, descarregar sobre ele todo o peso de seu bastão. Isso aumentará ainda mais sua fama, e seu mérito será tão grande quanto o dos heróis mais renomados da história. Por que eu também não aproveito essa oportunidade?

Sem pensar duas vezes, Bajie ergueu o seu ancinho o mais alto que pôde e o deixou cair com força sobre a cabeça do monstro. Percebendo que estava em desvantagem, o monstro deu meia-volta e fugiu às pressas, levando consigo a lança de fogo.

— Atrás dele! Não o deixe escapar! — ordenou o Peregrino a Bajie.

Ambos correram atrás do monstro, mas, ao chegarem à entrada da caverna, viram-no de pé sobre uma das carroças, posicionada exatamente no centro. Com uma das mãos, segurava a lança de fogo, enquanto a outra desferia socos em seu próprio nariz.

— Que vergonha! — exclamou Bajie, soltando uma gargalhada. — Você viu o que ele está fazendo? Está tentando destruir o próprio nariz para nos acusar de crueldade no primeiro tribunal que encontrar. Esse maldito sabe muito bem que os juízes só se convencem quando há sangue. Por isso está tão empenhado em sangrar como um porco.

Depois de mais alguns socos, o monstro recitou um encantamento, e imediatamente uma torrente de fogo saiu de sua boca, enquanto uma espessa coluna de fumaça emanava de suas narinas. O mais assustador, no entanto, foi que das outras quatro carroças também começaram a jorrar torrentes de fogo rumo aos céus, queimando com tanta intensidade que toda a Caverna da Nuvem de Fogo foi encoberta por chamas e fumaça.

Apavorado, Bajie gritou para o Peregrino:

— Isso está ficando realmente ruim! Se essa enorme torrente de fogo se voltar contra nós, não teremos como escapar. Vou acabar, com certeza, assado na mesa dele, bem tostado e cuidadosamente temperado. Precisamos fugir agora, se quisermos salvar nossas peles!

Baije mal havia terminado de falar quando alcançou o outro lado do riacho, sem se preocupar nem um pouco com a sorte do Peregrino. Felizmente, o Peregrino conhecia um feitiço para repelir o fogo e se lançou decidido naquele mar de chamas, tentando capturar o monstro. O monstro, por sua vez, não se intimidou ao vê-lo. Pelo contrário, soltou mais duas baforadas de fogo e o incêndio alcançou proporções realmente extraordinárias. O calor era tão intenso que a terra ficou vermelha como ferro fundido e o céu parecia prestes a desabar. Era como uma roda gigantesca girando incessantemente ou um vasto rio de cinzas fluindo de leste a oeste. Esse fogo não tinha relação com o de Sui-Ren, nem com o utilizado por Lao-Tzu para purificar seu elixir. Sua origem não era celeste, embora também não pudesse ser considerada mundana. Era o fogo de Samadhi, o qual o monstro dominou através do próprio cultivo, alcançando a perfeição absoluta. As carretas estavam intimamente relacionadas com cada uma das Cinco Fases que originam tudo o que existe. A madeira do fígado  alimenta o fogo do coração, que, por sua vez, acalma a terra do baço, que por sua vez gera o metal, que se transforma em água. A água gera a madeira e, assim, a magia se completa (2) (3). O fogo é  o princípio de todas as transformações. Por isso, tudo cresce e evolui, enquanto o sol, majestoso, percorre os céus. O monstro conhecia esses processos graças ao domínio do Samadhi, razão pela qual era considerado o ser mais poderoso de todo o Oeste.

A fumaça e as chamas tornaram-se tão densas que o Peregrino mal conseguia enxergar o caminho até a caverna, muito menos localizar o monstro. Rapidamente, ele se virou e, com um salto ágil, abandonou aquele mar de fogo. Assim que percebeu isso, o monstro parou de alimentar as chamas e, triunfante, retirou-se para o interior da caverna, seguido de seus demônios. As portas de pedra se fecharam atrás deles, e todos se reuniram à mesa para comemorar, com grande entusiasmo, a vitória de seu senhor.

Desanimado, o Peregrino cruzou novamente o Riacho do Pinheiro Seco. Ao ver que Bajie estava conversando calmamente com o Monge Sha, perdeu o controle e exclamou, mal-humorado:

— Que tipo de homem é você? Não tem nem um pingo de decência? Estava tão apavorado que decidiu me abandonar à sorte, preferindo fugir como um covarde? Ainda bem que sei me virar sozinho, caso contrário, estaria mais queimado que um pedaço de carvão!

— Irmão mais velho — disse Bajie rindo. — O monstro estava certo quando disse que você não sabia o que estava dizendo. Não é à toa que os antigos diziam que "aqueles que conhecem as regras do mundo podem ser chamados de herói.” O monstro não queria conversar sobre laços de parentesco com você, mas mesmo assim você insistiu em se apresentar como seu parente. E, quando ele lutou com você e soltou aquele fogo implacável, em vez de recuar, você insistiu em enfrentá-lo. O que você esperava que eu fizesse? Queria que eu ficasse ali parado vendo minhas pernas queimarem?

— E o que pensa sobre aquele monstro? — perguntou o Peregrino.

— Seus poderes são muito inferiores aos seus — respondeu Bajie.

— E quanto à forma como ele maneja a lança? — insistiu o Peregrino. — Qual é a sua opinião sobre suas habilidades como guerreiro?

— Não são grande coisa — respondeu Bajie. — Quando vi a dificuldade que ele estava enfrentando contra você, decidi que era hora de intervir e me lancei na batalha. O que menos esperava era que ele fosse recuar tão rapidamente e dar início a todo aquele incêndio.

— Você não devia ter se metido — repreendeu-o o Peregrino. — Se a luta tivesse durado um pouco mais, eu teria desferido o golpe final. A pressa não serve para nada.

Os dois continuaram completamente absortos em discutir a habilidade do monstro e a ferocidade de suas chamas. Enquanto isso, o Monge Sha, encostado no tronco de um pinheiro, ria tanto que mal conseguia se manter em pé. Irritado, o Peregrino perguntou:

— Qual a razão dessa risada? Se você for capaz de capturar esse monstro de fogo sozinho, ficaremos muito gratos. Não pense que vamos impedir você de cruzar suas armas com ele. Como diz o provérbio, "para fazer uma bola, só é necessário algumas penas". Posso garantir que, se conseguir libertar nosso mestre, o mérito será inteiramente seu.

— Eu sou incapaz de capturar qualquer monstro — confessou o Monge Sha. — Se estou rindo, é porque vocês parecem crianças discutindo.

— O que quer dizer com isso? — perguntou o Peregrino.

— Segundo vocês mesmos disseram — explicou o Monge Sha —, esse monstro tem um conhecimento rudimentar das táticas militares. Se até agora conseguiu mantê-los à distância, foi porque é um verdadeiro mestre do fogo. Lembrem-se que as Cinco Fases se intercalam e se anulam mutuamente. Por que não utilizam esse princípio para combater as chamas desse monstro?

— Você tem razão! — exclamou o Peregrino, com o rosto iluminado. — Estávamos tão obcecados com nossa superioridade tática que ignoramos esse princípio. Não há, de fato, nada melhor para combater o fogo do que a água. Precisamos encontrar, o quanto antes, uma fonte que tenha água em abundância. Dessa forma, poderemos libertar nosso mestre num piscar de olhos.

— Exatamente — confirmou o Monge Sha.

— O que estamos esperando, então? — exclamou novamente o Peregrino. — Fiquem aqui e evitem ao máximo um confronto direto com essa criatura. Eu, por minha parte, vou até o Mar Oriental pedir a ajuda de um regimento de soldados-dragões. Com a colaboração deles, apagaremos esse fogo e libertaremos nosso mestre.

— Vá o quanto antes e não perca mais tempo, por favor — insistiu Bajie. — Não se preocupe conosco. Sabemos nos cuidar.

O Grande Sábio subiu em uma nuvem e logo chegou ao Mar Oriental. A paisagem era, de fato, deslumbrante, mas ele estava muito ocupado para se deter a admirar. Usando magia para dividir as águas, abriu caminho com uma facilidade surpreendente. Em pouco tempo, encontrou um yaksa em patrulha, que correu rapidamente de volta ao Palácio de Cristal da Água para informar ao Rei Dragão, Ao-Kuang, sobre a chegada inesperada do Grande Sábio. Ao-Kuang chamou todos os seus filhos e netos e saiu até a porta, escoltado por um batalhão de camarões-soldados liderados por um camarão-tenente, para dar as boas-vindas ao visitante ilustre. Após os cumprimentos de praxe, o Rei serviu chá, mas o Peregrino recusou, dizendo:

Não tenho tempo para isso. O assunto que me traz aqui é de vital importância, e espero que possam me oferecer sua inestimável ajuda. Como talvez saibam, meu mestre partiu em uma viagem com destino ao Paraíso Ocidental, com o intuito de obter as escrituras de Buda. Ao passar perto da Caverna da Nuvem de Fogo, que fica à margem do Riacho do Pinheiro Seco, nos deparamos com um monstro conhecido como o Menino Vermelho, embora ele prefira ser chamado de Rei Menino Sábio. Devo reconhecer que ele é extremamente astuto e, usando mil artimanhas, conseguiu capturar meu mestre. Isso me obrigou a ir até sua porta e a enfrentá-lo, mas ele é um verdadeiro mestre no domínio do fogo. Após refletir por um tempo, percebi que as chamas são impotentes diante da água e decidi vir pedir sua ajuda. Para libertar o monge Tang das garras desse monstro, é necessário que provoque uma tempestade sobre o local onde ele habita, neutralizando, assim, o poder destrutivo das chamas que ele usa para aterrorizar toda a região.

— Está equivocado, Grande Sábio — disse o Rei Dragão. — Se o que deseja é chuva, não deveria ter vindo até mim.

— Como assim? — protestou o Peregrino. — Vossa Majestade é um Rei Dragão dos Quatro Mares e é, portanto, responsável por distribuir a chuva e o orvalho. Não há ninguém mais capacitado do que você para realizar o plano que tenho em mente.

— É verdade que a chuva está entre minhas responsabilidades — admitiu o Rei Dragão. — No entanto, não posso simplesmente distribuí-la como bem entender. Para isso, é necessário receber uma ordem do Imperador de Jade, na qual se especifique com clareza o local, a hora, a quantidade e a duração da chuva. Esse documento é redigido por três funcionários imperiais e entregue pessoalmente pela Estrela Polar. Uma vez em minhas mãos, tenho a obrigação de comunicá-lo ao Deus do Trovão, à Mãe do Relâmpago, ao Tio do Vento (4) e ao Jovem das Nuvens , pois, como diz o provérbio, “sem a cooperação das nuvens, o dragão não consegue se mover”.

— Eu não preciso de vento, nem nuvens, nem relâmpagos, nem trovões! — exclamou o Peregrino, impaciente. — Eu preciso apenas da água da chuva.

— Mesmo assim, temo que não poderei atender ao seu pedido — anunciou o Rei Dragão —, pois para isso precisarei da ajuda e aprovação de meus três irmãos. Contudo, se eles concordarem em ajudar, pode ter a certeza de que todo o mérito será exclusivamente seu.

— Onde posso encontrar os seus irmãos? — perguntou novamente o Peregrino.

— Nos seus respectivos palácios — respondeu o Rei Dragão. — Ao -Shin, no Mar do Sul, Ao -Shun, no Mar do Norte e Ao -Jun, no Mar Ocidental.

— Se tenho que ir a tantos lugares — concluiu o Peregrino, rindo —, prefiro ir diretamente ao Imperador de Jade e pedir-lhe uma ordem para uma tempestade.

— Não é necessário que faça isso, Grande Sábio — tentou tranquilizá-lo o Rei Dragão. — Quando desejamos nos reunimos, eu e meus irmãos batemos um tambor de ferro e tocamos uma campainha de ouro que todos possuímos. Imediatamente, vamos ao encontro de quem nos chamar.

— Nesse caso — replicou o Peregrino, mais animado —, gostaria que batesse o tambor e tocasse a campainha sem demora.

Assim ele o fez, e pouco tempo depois de fazê-lo, os três Reis Dragões apareceram.


 Visivelmente alarmados, eles perguntaram ao irmão mais velho:

— Podemos saber por que nos fez vir com tanta pressa?

— O Grande Sábio nos procurou em busca de ajuda — explicou Ao-Kuang. — Ele precisa de uma forte chuva para derrotar um monstro.

O Peregrino então explicou os motivos que o haviam levado a fazer tal pedido. Relatou tudo com tanta pompa que todos aceitaram prontamente oferecer a ajuda necessária. Sem perder tempo, convocaram um tubarão de aparência feroz e designaram-lhe o comando de todo o exército. A vanguarda foi confiada a um sábalo de boca enorme e reconhecida bravura. As carpas, famosas por suas qualidades como generais de campo, saltavam energicamente de onda em onda, enquanto as bremas, as rainhas do mar, exalavam névoas e brisas de suas bocas. No leste, as cavalas, grandes generais do oceano, passavam entre si os sinais secretos; no oeste, os atuns, severos comandantes das águas, gritavam suas ordens à tropa; no sul, as sereias de olhos avermelhados marcavam o ritmo do avanço do exército com seus movimentos sensuais, como incansáveis dançarinas; no norte, viam-se gestos pomposos de generais aguerridos que ostentavam armaduras escuras; e, finalmente, no centro, os esturjões, valentes sargentos do meio aquático, tomavam posse de seus comandos. Valentes eram os soldados que vinham em massa dos cinco pontos cardeais. A tartaruga marinha, extremamente inteligente e astuta, mostrava as qualidades que a haviam tornado a suprema chanceler do oceano. Como conselheiros, tinha sob sua responsabilidade uma enorme legião de cágados, tão maquiavélicos e sutis quanto ela. Os ministros iguanas não cessavam de demonstrar sua fidelidade e sua grande inteligência. Longe da visão deles estavam as batalhadoras tartarugas de areia, bem dotadas para a luta, que exerciam o cargo de comandantes. A maior parte do exército era formada por caranguejos guerreiros, que caminhavam de lado empunhando longas espadas e lanças; camarões amazonas ,que avançavam saltando graciosamente sem deixar cair seus pesados arcos, e soldados marinhos de mil e uma espécies.

Sobre esse momento impressionante, surgiu um poema que diz:

"Os Reis Dragões dos Quatro Mares ficaram felizes em atender
ao pedido do Grande Sábio, Sósia do Céu;
Enquanto Sanzang enfrenta uma provação no caminho,
a água é trazida para apagar o fogo destruidor."

Sempre à frente do exército de dragões, o Peregrino não demorou a chegar ao Riacho do Pinheiro Seco. Lá, parou a marcha e, virando-se para os quatro reis dragões, disse:

— Lamento tê-los trazido a um lugar tão afastado de sua residência habitual. Este é o refúgio do monstro sobre o qual lhes falei. Seria prudente que ficassem aqui em cima, no ar, e não se deixassem ver por enquanto. Minha intenção é desafiá-lo novamente. Se eu conseguir derrotá-lo ou, mesmo, se for eu o derrotado, não será necessária a intervenção de vocês. Cuidem para não deixar cair uma única gota de chuva antes que ele comece a vomitar fogo, pois esse monstro é muito desconfiado e logo buscará a segurança de sua caverna.

Os Reis Dragões aceitaram as sugestões e se submeteram de boa vontade à autoridade de sua liderança. O Peregrino então desceu da nuvem, adentrou o bosque de pinheiros e gritou:

Bajie! Monge Sha! Estou de volta!

— Você voltou mais rápido do que esperávamos — comentou Bajie, surpreso. — Conseguiu convencer os Reis Dragões?

— Todos estão aqui — anunciou o Peregrino. — O melhor agora é que vocês cuidem da bagagem. Tentem mantê-la em um lugar seco, pois uma chuva torrencial está prestes a cair. Quanto a mim, vou desafiar esse monstro mais uma vez.

— Não se preocupe — disse o Monge Sha. — Nós cuidamos de tudo.

Mais uma vez, o Peregrino cruzou o riacho com um esplêndido salto, colocou-se de braços cruzados diante da porta e gritou com todas as suas forças:

— Abram imediatamente!

Os pequenos demônios correram para informar seu senhor, dizendo:

— O Peregrino Sun está aqui novamente, majestade!

— Que macaco mais persistente! — exclamou o monstro, levantando a cabeça e soltando uma sonora gargalhada. — Parece que conseguiu escapar do fogo, embora eu não entenda, de fato, como. De qualquer forma, ele não conseguirá repetir o feito, pois não vou parar de vomitar chamas até que sua pele esteja totalmente chamuscada e sua carne se torne uma massa enegrecida.

Ele pegou a lança e acrescentou:

— Tragam as carroças — e lançou-se para fora da caverna, onde perguntou com ousadia ao Peregrino: 

— Posso saber por que voltou?

— Para exigir que liberte meu mestre — respondeu o Peregrino.

— Que cabeça dura você tem! — exclamou o monstro. — Qual o problema em seu mestre me servir de aperitivo? É melhor esquecer dele o quanto antes.

O Peregrino não conseguiu conter a fúria que o dominava. Pegou o seu bastão de ferro com ouro nas extremidades e o deixou cair com toda a força sobre a cabeça do monstro, mas o mesmo bloqueou o golpe com sua lança de fogo. A batalha que se seguiu não se assemelhava em nada à que haviam travado horas antes. O monstro estava furioso, enquanto o Rei dos Macacos se sentia mais seguro do que antes. Um arriscava sua vida para salvar a do monge Tang, e o outro para incorporá-la à sua, devorando-o como se fosse um grão de arroz. Os pensamentos que agora percorriam suas mentes eram muito diferentes. Nenhum deles pensava mais em laços familiares, o que os tornava ainda mais ferozes no combate. Ambos estavam conscientes de que, se a sorte lhes virasse as costas, poderiam muito bem acabar despojados de sua pele ou dentro de uma panela. Isso explicava a ferocidade com que mediam, repetidamente, seus golpes. Apesar de tudo, nem o bastão de ferro nem a lança de fogo conseguiam garantir uma vantagem decisiva. Os dois guerreiros possuíam poderes tão semelhantes que, após mais de vinte confrontos, o desfecho da luta ainda estava por ser decidido.

Compreendendo que não havia como obter uma vitória rápida, o monstro lançou um terrível golpe contra o corpo de seu adversário, recuando rapidamente alguns passos. Mas o que fez em seguida não foi se preparar para deter a terrível reação do macaco, e sim golpear o próprio nariz com os punhos. Imediatamente, chamas extraordinárias surgiram de seus olhos, unindo-se aquelas que, de repente, começavam a surgir de cada uma das carroças. 

Compreendendo que o momento havia chegado, o Grande Sábio levantou os olhos para o céu e gritou:

— Agora, Reis Dragões!

Os quatro reis dragões convocaram suas tropas e ordenaram que entrassem em ação, despejando sobre o monstro de fogo uma chuva como jamais se viu antes. Era um fenômeno que se assemelhava ao de estrelas caindo do céu, e a sua força assemelhava-se a das ondas do mar durante uma tempestade. No início, as gotas de chuva tinham o tamanho de punhos cerrados mas em pouco tempo cresciam até alcançar o tamanho de grandes panelas para cozinhar arroz. A terra inteira foi coberta pelas águas, e até as montanhas mais altas adquiriram a cor da cabeça de Buda (5). 

A água desceu para as fendas profundas, densa como um biombo de jade. Os riachos viram seus leitos se expandirem imensamente, as intersecções das estradas foram inundadas e todos os rios se transformaram, de repente, em mares. Tal foi a contribuição dos dragões sagrados para a salvação do monge Tang. Para alcançar esse objetivo, não hesitaram em derramar sobre a terra o imenso caudal do Rio Celeste. No entanto, a chuva não conseguiu apagar as chamas do monstro. Sem a permissão do Imperador de Jade, a água que os Reis Dragões usaram poderia apagar qualquer fogo de natureza terrena, mas não o fogo de Samadhi, que possuía uma natureza espiritual e havia sido aperfeiçoado pelo monstro através do cultivo. Na verdade, foi como jogar óleo sobre o fogo, fazendo as chamas se intensificarem ainda mais.

— Acho melhor refazer o sinal mágico e me aproximar das chamas, para tentar capturar o monstro que as provoca — concluiu o Peregrino.

Ao vê-lo se aproximar, o monstro exalou uma baforada de fumaça em seu rosto. O Peregrino tentou desviar imediatamente, mas a fumaça o atingiu em cheio. Seus olhos ficaram tão irritados que começaram a lacrimejar, como se uma nuvem tivesse despejado toda sua água sobre ele. 

Embora fosse imune ao fogo, o Grande Sábio não tinha qualquer defesa contra a fumaça. Na época em que ele causou uma grande tumulto no Palácio Celeste, ele ficou preso por mais de um ano dentro do Braseiro dos Oito Triagramas de Lao-Tzu, sendo refinado como ouro. Ele não sofreu queimaduras porque se encolheu no compartimento do trigrama Sun (vento), mas isso não o impediu dos efeitos da fumaça. Quando uma leve brisa soprou, seus olhos se inflamaram a ponto de parecerem feitos de fogo, com pupilas que brilhavam como diamantes. Esse era o seu ponto fraco, e o monstro percebeu rapidamente essa fraqueza. Com outra baforada, ele encheu o ar de fumaça. Não restou ao Peregrino outra escolha a não ser subir em uma nuvem e fugir rapidamente. O monstro, então, cessou o ataque de fogo e se retirou para o interior de sua caverna.

O Grande Sábio estava completamente coberto de chamas e fumaça e correu até o riacho que corria pela montanha para se refrescar. O que menos esperava era que o diferença entre a temperatura da água e a do fogo fosse tão grande que, em questão de instantes, o fez  perder a consciência. A reação foi tão forte que sua respiração ficou congelada no peito, sua garganta perdeu sua sensação habitual e sua língua esfriou completamente. Como consequência do choque térmico, seu espírito deixou seu corpo e sua vida o abandonou. Ao presenciar o ocorrido, os Reis Dragões dos Quatro Mares tremeram, e, desistindo imediatamente do ataque de chuva, gritaram alarmados:

— Saiam da floresta, Marechal dos Juncos Celestes e Marechal Que Levanta a Cortina! A desgraça se abateu sobre vosso irmão!

Ao ouvirem seus nomes sendo chamados, Bajie e o Monge Sha rapidamente soltaram o cavalo, pegaram seus equipamentos e correram para fora do esconderijo. Ignorando o barro e as pedras espalhadas ao longo do riacho, iniciaram uma busca frenética quer percorreu toda a sua margem. Enquanto estavam concentrados vasculhando os juncos e as espadanas, avistaram, descendo corrente abaixo, o corpo de um homem. 


O Monge Sha arrastou-o até a margem e, sem se importar em molhar as roupas, mergulhou na água. Como imaginavam, tratava-se do corpo sem vida do Grande Sábio Sun. Seus braços estavam dobrados e tão frios que não podiam ser esticados. Parecia que gelo havia tomado conta de seu corpo. Com os olhos cheios de lágrimas, o Monge Sha exclamou, desconsolado:

— Que pena vê-lo assim! Você estava destinado a nunca envelhecer e a contemplar o próprio fim dos tempos! Como foi encontrar a morte na flor de sua eterna juventude?

— Vamos, pare de chorar — aconselhou Bajie, soltando uma gargalhada. — Nosso irmão tem um humor tão ácido que está se fingindo de morto só para ver como iremos reagir. Toque o corpo dele, e verá como ainda está quente.

— Seu corpo está mais frio que o gelo — exclamou novamente, desesperado, o Monge Sha. — O calor da vida o abandonou para sempre. Jamais conseguiremos trazê-lo de volta!

— Não diga isso, por favor — repreendeu-o Bajie, ficando sério de repente. — Se ele conseguiu dominar a arte das setenta e duas transformações, era porque, de fato, possuía setenta e duas vidas! Não pode ter perdido todas de uma vez! Estique as pernas dele e eu me encarregarei do resto.

O Monge Sha obedeceu sem protestar. Bajie então levantou-lhe a cabeça e a parte superior do corpo. Em seguida, dobrou-lhe as pernas, deixando-o em uma posição que lembrava a de uma pessoa sentada. Friccionou suas mãos até que aquecessem um pouco e, depois de cobrir cuidadosamente as sete aberturas do corpo, iniciou uma série de massagens vigorosas. A temperatura da água havia causado um efeito tão forte em seu hálito que este ficou concentrado no campo de mercúrio, na parte inferior do abdômen, bloqueando a capacidade do Peregrino de emitir qualquer som. 

Foi sorte que Bajie estivesse ali para realizar aquelas massagens, pois pouco a pouco, o ar começou a invadir cada uma das Três Regiões (6) e, finalmente, alcançou o Salão da Luz, localizado entre os olhos. Assim, as aberturas de seu corpo começaram a funcionar, como se jamais tivessem sido obstruídas.

— Mestre! Onde está, mestre? — balbuciou o Peregrino assim que abriu os olhos.

— Vejam só! — disse, por sua vez, o Monge Sha. — Está sempre pensando no mestre. Vive para ele e, mesmo quando a morte te chama, seu nome continua preso aos seus lábios. Acorde de uma vez. Não está nos vendo? Estamos ao seu lado.

— Irmãos! — exclamou novamente o Peregrino. — Desta vez as coisas não saíram como eu esperava.

— Foi só uma tontura — disse Bajie para tranquilizá-lo. — Mas, se não fosse por mim, agora você estaria acabado. Não vai me agradecer?

Ignorando-o, o Peregrino olhou para cima e perguntou:

— Ainda estão aí, Reis Dragões?

Sim responderam os Reis Dragão dos Quatro Mares. — Esperamos suas ordens.

— Lamento ter feito vocês virem de tão longe para nada — desculpou-se o Peregrino. — Se quiserem, podem retornar aos vossos palácios. Outro dia, lhes agradecerei por tudo o que fizeram por mim hoje.

Os Reis Dragões então iniciaram a marcha de volta aos seus respectivos mares, seguidos por seus exércitos. O Monge Sha então segurou o Peregrino e o ajudou a caminhar em direção ao bosque, onde se sentou para descansar. Não demorou a recuperar seu ritmo habitual de respiração. No entanto, isso não lhe foi de grande ajuda, pois logo se entregou à tristeza e exclamou, chorando amargamente:

— Mestre, ainda me lembro do ano em que partiu da corte dos Tang. Nunca poderei esquecer, pois foi nele em que me libertou da montanha que os Céus haviam colocado sobre mim. Desde aquele momento, transpusemos inúmeras montanhas, atravessamos incontáveis rios e medimos nossas forças com inúmeros monstros. Tudo compartilhamos, como verdadeiros irmãos. Suas alegrias foram minhas, e teus desânimos, meus. Juntos pedimos esmolas, descansamos ao ar livre ou sob algum abrigo. Nossos corações batem no mesmo ritmo e são guiados pelos mesmos ideais de perfeição. Mas ainda não fui capaz de te libertar, e quase perdi minha vida hoje!

— Não atormente a si mesmo  — aconselhou o Monge Sha. — Vamos traçar um bom plano e procurar ajuda onde for necessário.

— E quem pode nos ajudar, se até os dragões falharam?  indagou o Peregrino.

— Lembro-me — disse o Monge Sha — de que, quando a Bodhisattva nos confiou a proteção do monge Tang, ela nos prometeu que teríamos sempre a proteção dos Céus. Ela chegou a afirmar que, caso os Céus falhassem, poderíamos contar com a Terra. Ou seja, proteção não nos falta. Só precisamos decidir quem devemos procurar primeiro.

— Na época em que causei uma grande confusão no Palácio Celeste — comentou o Peregrino, com um tom nostálgico —, nenhum dos guerreiros celestes foi capaz de me derrotar. Isso mostra que, devido à imensa força mágica desse monstro, precisaremos de alguém ainda mais poderoso do que eu. O problema é que nenhum deus, no céu ou na terra, é superior a mim nas artes mágicas. Só a Bodhisattva Guanyin poderia nos ajudar de forma decisiva, mas, infelizmente, perdi muita força e no momento não consigo me deslocar pelos ares como sempre faço. O que podemos fazer?

— Se quiser, posso ir em seu lugar — disse Bajie.

— Tudo bem — concordou o Peregrino. — Mas lembre-se de que não deve olhar diretamente para a Bodhisattva. Deve manter a cabeça inclinada o tempo todo e se ajoelhar quando for necessário. Quando ela lhe perguntar o motivo de sua visita inesperada, procure responder com simplicidade. Diga tudo o que ela precisar saber sobre este lugar e implore humildemente para que liberte nosso mestre. Se ela concordar, o monstro não terá mais o que fazer.

Bajie se elevou rapidamente pelos ares, e seguiu para o sul. Enquanto isso, o monstro e seus súditos celebravam sua nova vitória no interior da caverna.

— Desta vez — o monstro anunciou com orgulho aos seus súditos —, o Peregrino Sun sofreu uma derrota completa. É provável que ele não tenha morrido, mas, com certeza, seu estado é lamentável. No entanto, existe a possibilidade de que ele tente buscar ajuda, o que significa que eu teria que pegar em armas novamente. Abram as portas e vejamos o que estão planejando.

Os demônios assim o fizeram e o monstro imediatamente se elevou pelos ares. Foi assim que descobriu que Bajie havia se afastado do grupo e seguia rapidamente em direção ao sul.

— Isso quer dizer — pensou o monstro — que ele está indo pedir ajuda à Bodhisattva Guanyin.

O monstro então desceu rapidamente e ordenou aos seus súditos:

— Tragam-me a bolsa de couro. Já faz muitos anos que não a uso, e é possível que a corda para fechá-la esteja um pouco desgastada. Troquem-na e coloquem a bolsa ao lado da segunda porta. Enquanto fazem isso, irei capturar Bajie. Espero não precisar gastar muita energia com ele. Tentarei atraí-lo até aqui e, sem que perceba, farei com que ele entre na bolsa sozinho. Ouvi dizer que sua carne é muito saborosa. Assim que o capturar, entregarei a vocês para que o cozinhem no vapor e o sirvam como aperitivo.

Entre os tesouros que o monstro possuía, de fato, havia uma bolsa de couro que mudava de tamanho conforme sua vontade. Depois de trocar a corda da boca, que estava desgastada, colocaram-na, conforme a ordem de seu senhor, ao lado da segunda porta.

O monstro morava naquela região desde tempos imemoriais e a conhecia melhor do que a palma de sua mão. Sabia, portanto, qual era o caminho mais curto para chegar aos Mares do Sul e qual era o mais longo. Não teve dificuldades, então, em deixar Bajie para trás. À sua frente se erguia um pico altíssimo, e para lá dirigiu seu voo. Sentou-se no topo com um gesto solene e, após sacudir ligeiramente o corpo, transformou-se em uma cópia exata de Guanyin. 

Pouco depois, Bajie apareceu à distância, correndo desajeitadamente por cima das nuvens. Ele ficou surpreso ao ver a Bodhisattva naquele local, mas não pensou em nenhum momento que pudesse ser uma armadilha. Como é comum entre os homens tolos, para ele não havia diferença entre os budas e as imagens que os representavam. Ele desceu imediatamente da nuvem em que viajava e, prostrando-se com o rosto no chão, disse respeitosamente:

— Aceite a saudação de vosso humilde discípulo Zhu Wuneng.

— Posso saber por que não está protegendo o monge Tang? — repreendeu o monstro. — Quem te deu permissão para vir me ver?

— Perdão pela minha ousadia — respondeu Bajie. — O que acontece é que, junto ao Riacho do Pinheiro Seco, na Caverna da Nuvem de Fogo, nos deparamos com um monstro terrível, chamado Menino Vermelho. Ele possui um conhecimento extraordinário das artes mágicas e conseguiu capturar nosso mestre. Apesar de tudo, conseguimos descobrir seu esconderijo e desafiá-lo para uma luta até a morte. No entanto, ele é um mestre consumado no uso do fogo, e nossos esforços foram inúteis. Já o enfrentamos duas vezes, sem conseguir qualquer resultado positivo. Na segunda vez, contamos com a ajuda dos Reis Dragões, que tentaram apagar o fogo com uma chuva torrencial que devastou florestas e arrancou montanhas inteiras, mas não obtiveram sucesso. O pior de tudo foi que Wukong acabou ficando muito debilitado e mal consegue se mover. Por isso, ele me pediu para vir até aqui e implorar por sua ajuda. Por favor, liberte nosso mestre desta terrível provação!

— Não sei se devo acreditar em suas palavras — comentou o monstro. — O Senhor da Caverna da Nuvem de Fogo não é dado a comer carne humana. Certamente, vocês o ofenderam de alguma forma para que ele se comportasse assim com vocês.

— Juro que não fiz nada — defendeu-se Bajie. — No entanto, não posso dizer o mesmo sobre Wukong. Na verdade, aquele monstro se fez passar, inicialmente, por uma criança pendurada em um pinheiro, com o intuito de testar nosso mestre. Sanzang, como bem sabe, é naturalmente compassivo e ordenou que a desatássemos e a carregássemos conosco. Wukong aceitou, a contragosto, mas se livrou dela na primeira oportunidade que teve. Isso fez com que o monstro se enfurecesse e capturasse nosso mestre. Devo admitir que um ato tão desprezível como esse foi motivado exclusivamente por um compreensível desejo de vingança.

— Concordo plenamente — comentou o monstro. — Levante-se e venha comigo até a caverna desse monstro. Tenho certeza que após falar com ele, ele se mostrará razoável e libertará o seu mestre. Assim vocês poderão continuar tranquilamente sua jornada.

— Se isso acontecer — respondeu Bajie —, estou disposto a me ajoelhar diante dele e bater a testa no chão mais de dez mil vezes seguidas.

— Nesse caso, não há mais nada a discutir — disse o monstro. — Venha comigo.


Ao invés de seguir em direção aos Mares do Sul,  Bajie acompanhou o monstro direto até a entrada da Caverna da Nuvem de Fogo.  Ao alcançarem a entrada da caverna, Bajie hesitou em seguir adiante, mas o monstro o incentivou a entrar, dizendo:

— Por que tanto medo? Eu já não disse que eu conheço esse monstro? Vamos, entre comigo.

Bajie, então, deixou de lado todos os receios e seguiu a falsa Bodhisattva. Nesse exato momento, uma legião de pequenos demônios se lançou sobre ele, gritando ferozmente. Antes que pudesse reagir, se viu dentro de uma bolsa de couro, que as criaturas fecharam com uma corda, pendurando-a em seguida em uma viga.

O monstro então retomou sua forma habitual e, posicionando-se no centro daquela reunião de bestas, perguntou a Bajie, com tom zombeteiro:

— Que tipo de poderes você tem para ousar acompanhar o monge Tang em busca das escrituras sagradas? E quem lhe deu permissão para pedir à Bodhisattva que viesse me punir? Abra bem os olhos e veja quem sou. Não me reconhece? Eu sou o Rei Menino Sábio! Você ficará pendurado nessa viga por quatro ou cinco dias, e depois será cozido no vapor para servir de aperitivo para meus súditos.

— Maldito monstro! — gritou Bajie, desesperado. — Como ousou usurpar a identidade da Bodhisattva? Não pense que uma irreverência como essa passará sem castigo. Se comerem minha carne, o próprio Céu se encarregará de me vingar, fazendo com que todos vocês fiquem com a cabeça inchada!

Bajie continuou a lançar insultos por muito tempo, mas ninguém lhe deu a mínima atenção. Apenas o Grande Sábio pareceu perceber a gravidade da sua situação. Ele estava sentado tranquilamente na floresta, na companhia do Monge Sha, quando, de repente, uma forte rajada de vento fétido se levantou. O Peregrino o farejou, como um cão de caça, e exclamou, desanimado:

— As coisas parecem piorar cada vez mais! Em vez de nos trazer boa sorte, este vento parece nos trazer má fortuna. Ou estou completamente enganado, ou Zhu Bajie errou o caminho em direção aos Mares do Sul.

— Se isso realmente aconteceu, ele pode simplesmente retornar e pedir informações a alguém, não? — replicou o Monge Sha.

— Não neste caso — respondeu o Peregrino. — Tenho a sensação de que ele se deparou com um monstro.

— Se isso aconteceu, por que ele não não retornou imediatamente? — questionou o Monge Sha, mais uma vez.

— Não sei — respondeu o Peregrino. — Mas algo definitivamente deu errado. Fique aqui cuidando da nossa bagagem, enquanto eu atravesso o riacho e tento descobrir o que está acontecendo.

— Você ainda não está completamente recuperado — protestou o Monge Sha. — É melhor que eu vá. Caso contrário, poderá sofrer um dano irreparável.

— Fique tranquilo — disse o Peregrino. — Estou perfeitamente bem. Além disso, é minha obrigação.

Forçando os dentes para suportar melhor a dor, o Peregrino pegou o bastão de ferro e atravessou o riacho correndo. Quando chegou à frente da Caverna da Nuvem de Fogo, levantou a voz e disse aos demônios que a guardavam:

— Corram e informem ao seu senhor que o Peregrino Sun acaba de chegar!

Os demônios fizeram como lhe foi dito, mas o monstro se recusou a enfrentá-lo, preferindo que os seus melhores guardas o fizessem. Inflamados pela confiança que seu senhor demonstrava neles, os guardas desembainharam as espadas e correram em direção à porta, gritando como loucos:

— Peguem-no!

O Peregrino, de fato, estava fraco demais para lutar e não ousou enfrentá-los. Jogando-se para o lado da estrada, recitou um encantamento e exclamou:

— Transforme-se!

Imediatamente, ele se transformou em um pedaço de tecido com bordas douradas. Os demônios logo o encontraram e, levando-o para o interior da caverna, disseram ao seu senhor:

— O Peregrino Sun desistiu da luta. Ao ouvir nosso grito, ficou tão assustado que fugiu correndo, deixando para trás este pedaço de tecido.


— Isso não serve para nada — comentou o monstro, lançando um olhar sobre o objeto. — Está todo mofado e cheio de buracos. De qualquer forma, lavem-no, se quiserem. Pode servir para remendar nossas cobertas.

Sem suspeitar que se tratava do Peregrino, um dos demônios pegou o tecido e o levou para a parte de trás da caverna.

— Isso é muito bom — pensou o Peregrino, esperançoso. — É assim que se deve tratar um tecido bordado com ouro.

O Peregrino não era do tipo que se contentava em enganar uma vez só. Pelo contrário, ele se deleitava em complicar as situações, sempre buscando a perfeição absoluta. Assim, não hesitou em arrancar um fio de cabelo e transformá-lo em uma cópia exata do pedaço de tecido, enquanto seu verdadeiro ser se transformava em uma pequena mosca, que se posou em uma das vigas da porta. 


De lá, ele ouviu a voz de Bajie lamentando sua sorte e ameaçando com terríveis castigos quem estivesse disposto a ouvir. Intrigado, o Peregrino voou pela sala, observando todos os cantos. Foi então que descobriu que a voz vinha de uma bolsa de couro pendurada em uma viga. Ele pousou sobre ela e ouviu, sem dificuldades, Bajie xingando o monstro.

— Maldita besta! — dizia Bajie, irritado.  Como ousa fingir ser a Bodhisattva Guanyin e me enganar para vir até aqui? Depois me pendura aqui e diz que vai me oferecer como aperitivo aos seus demônios. Em breve, meu irmão mais velho recuperará suas forças incríveis, iguais às do Céu, e exterminará todos os monstros que vivem aqui. Eu mesmo cravarei o tridente em seu corpo mais de mil vezes seguidas, para que aprenda a respeitar o que deve.

O Peregrino se sentiu profundamente tocado e pensou:

— Parece que este idiota tem alma de guerreiro. Ele mal consegue respirar ali dentro e, ainda assim, não se rendeu. Tenho que acabar com esse monstro o quanto antes! Se eu falhar novamente, jamais irei me perdoar!

Ele tentava desesperadamente bolar um bom plano, quando ouviu o monstro dizer:

— Onde estão meus seis comandantes invencíveis? Venham aqui imediatamente.

Esses comandantes eram, na verdade, seis demônios com os quais o monstro mantinha uma relação especial de amizade e aos quais havia dado os seguintes nomes: Névoa na  Nuvem, Nuvem na Névoa, Veloz como Fogo, Ágil como o Vento, Aquecedor e Cozinhador. Os seis comandantes não demoraram a aparecer, rastejando e e se ajoelhando perante o monstro.

— Vocês sabem como chegar ao palácio do Venerável Grande Rei? — perguntou o monstro.

— Sim, senhor — responderam os seis ao mesmo tempo.

— Então, partam imediatamente para informá-lo que capturei o monge Tang e que desejo compartilhar com ele sua carne, pois ela é tão especial que quem a provar poderá prolongar sua vida mais de dez mil vezes.

Os seis comandantes obedeceram instantaneamente, lançando-se como um enxame em direção à porta. O Peregrino alçou voo e os seguiu até o exterior da caverna.

Não sabemos quem é esse a quem os seis foram convidar, e se ele atendeu ao convite. Quem quiser descobrir, terá que ouvir as explicações que são oferecidas no próximo capítulo.


CAPITULO XLII EM BREVE ...

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Notas do Capítulo XLI

  1. Sudhana também é conhecido como o Jovem da Riqueza Celestial, pois, segundo o Avatamsaka, ao nascer, apareceram com ele todo tipo de joias e tesouros. Sempre é retratado servindo a Bodhisattva Guanyin. O mais notável neste capítulo é a indicação de que, antes de abraçar o budismo, ele era um monstro;
  2. De acordo com os teóricos da alquimia interior, a cada um dos cinco grandes órgãos internos — coração, fígado, baço, pulmões e rins — corresponde um elemento das Cinco Fases — fogo, madeira, terra, metal e água. Como para a formação de cada um desses elementos básicos é necessária a cooperação do que o precede, estabelece-se entre eles uma relação materno-filial, o que os torna profundamente interdependentes;
  3. Além do que foi dito no ponto anterior, cada um dos elementos básicos tem a capacidade de anular o que o precede, tornando-se, assim, autênticos competidores. Isso demonstra, ao mesmo tempo, as dificuldades dos processos alquímicos internos;
  4. Embora em outras ocasiões o deus do vento seja tratado como "Duque", aqui é chamado de "Tio" para enfatizar, por meio de uma relação familiar, a íntima dependência existente entre as nuvens, o vento, o trovão e o raio na hora de produzir uma tempestade;
  5. Afirma-se que Buda tem os cabelos da mesma cor que o mar, embora essas linhas remetam a um poema escrito por Lin-Pu (967-1028), poeta da dinastia Song;
  6. A alquimia taoísta dividia o corpo humano em três zonas ou regiões — superior, média e inferior —, nas quais estabelecia uma verdadeira rede de pontos de caráter metamórfico-místico, como o "campo de mercúrio" e outros, que já foram mencionados nas notas 3-6 do capítulo XIX.


  • Tradução em pt-br por Rodrigo Viany (Sleipnir). Favor não utilizar sem permissão.
  • Tradução baseada na tradução do chinês para o espanhol feitas por Enrique P. Gatón e Imelda Huang-Wang, e do chinês para o inglês feita por Collinson Fair.
fontes consultadas para a pesquisa:

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