Titívilo

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Arte de Kythera of Anevern

Titívilo (do latim Titivillus) é um demônio oriundo do folclore medieval inglês, dito ser responsável por introduzir erros no trabalho dos escribas. Ele é chamado de "demônio padroeiro dos escribas", pois Titívilo fornece uma desculpa fácil para os erros que inevitavelmente se infiltram nos manuscritos à medida que são copiados. Titívilo também é descrito coletando conversas ociosas que ocorrem durante o serviço religioso, além de palavras mal pronunciadas, murmuradas ou omitidas do serviço, para levar ao Inferno para serem contadas contra os infratores.

A função de recolher erros litúrgicos num saco foi mencionada pela primeira vez pelo teólogo Jacques de Vitry (1180-1240) em seu Sermones vulgares (décimo sermão, sobre Números 18:5), que fala de um demônio que ouve o coro cantando salmos e recolhe sincopados ou sílabas omitidas em um saco:

Ouvi dizer que um certo homem santo, enquanto estava no coro, viu um demônio realmente carregado com um saco cheio. Quando, porém, ordenou ao demônio que contasse o que ele carregava, o maligno disse: “Estas são as sílabas e palavras sincopadas e versos dos salmos que esses mesmos clérigos em suas orações matinais roubaram de Deus; você pode ter certeza de que estou mantendo-os diligentemente para sua acusação." 

"Duivel Titivillus", autor anônimo, c. 1600 - c. 1800

Este demônio recebeu mais tarde o nome de "Titivillus" por Johannes Galensis em seu Tractatus de Penitentia, escrito por volta de 1285: 

"Titivillus coleta fragmentos de palavras e os coloca em sua bolsa mil vezes todos os dias."

Sobre a função do demônio, André Vernet destaca que os termos latinos, particularmente "recolher" (colligere) e "fragmentos" (fragmenta) para as omissões do clero, derivam de João 6:12, na narrativa da Multiplicação dos pães, em que os discípulos são instruídos a "Recolher os pedaços que sobraram (Colligite fragmenta)." Quanto ao nome do demônio, Vernet aponta para a obra De civitate Dei contra paganos ("A Cidade de Deus", livro IV, capítulo 8) de São Agostinho, em uma passagem na qual Agostinho, ao dar exemplos das numerosas divindades romanas atribuídas a cada etapa do processo agrícola, menciona uma deusa, chamada Tutilina, cuja função era cuidar do grão após ser colhido e armazenado. No entanto, devemos imaginar uma série de erros de copistas (talvez na cópia de De civitate Dei contra paganos disponível para Johannes Galensis) para chegar a "Titivillus" e suas muitas variantes: Tutivillus, Tytivillum, Tintillus, Tantillus, Tintinillus, Titivitilarius, Titivilitarius.

O escritor e ilustrador americano Marc Drogin (1936–2017) observou em seu manual instrutivo, Medieval Calligraphy: Its History and Technique ("Caligrafia Medieval: Sua História e Técnica"),  de 1980, que "nos últimos cinquenta anos, todas as edições do The Oxford English Dictionary listaram uma referência de página incorreta para, de todas as coisas, uma nota de rodapé sobre a primeira menção de Titivillus."

Titivillus ganhou um papel mais amplo como uma figura subversiva de comédia física, com comentários satíricos sobre as vaidades humanas, em peças inglesas do final da Idade Média, como o Iudicium, que encerra o Ciclo de Towneley. Ele desempenha um papel antagonista na peça inglesa medieval Mankind.

Em um tratado devocional inglês anônimo do século XV, Myroure of Oure Ladye, Titívilo se apresenta da seguinte forma (I.xx.54): 

"Eu sou um pobre demônio, e meu nome é Tytyvyllus ... Eu devo a cada dia ... trazer ao meu mestre mil sacos cheios de falhas e negligências em sílabas e palavras."

Ilustração do século XIV de Titívilo ao lado da escrivaninha de um escriba. Autor desconhecido