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6 de outubro de 2023

A Jornada ao Oeste: Capítulo XIII

۞ ADM Sleipnir

Arte de Moyi Zhang

CAPÍTULO XIII:

A ESTRELA DOURADA TRAZ A LIBERTAÇÃO NA COVA DO TIGRE. LIU BOQIN RESGATA O MONGE NA CORDILHEIRA DA DUPLA BIFURCAÇÃO.



O poderoso Imperador dos Tang emitiu um decreto
Delegando Xuanzang em busca da fonte de Chan.
Ele inclinou sua mente para encontrar a Morada do Dragão
E com firme determinação escalar o Pico do Abutre.
Quantas nações ele teria que atravessar para alcançar tão elevado objetivo?
Ninguém duvidava que ele teria que atravessar mais de dez mil montanhas.
Ele agora deixa o corte para ir para o Ocidente;
Ele manterá a lei e a fé para alcançar o Grande Vazio.

No décimo segundo dia do nono mês do décimo terceiro ano do período Zhenguan, Sanzang e seus acompanhantes foram escoltados pelo Imperador Tang e por muitos de seus oficiais até deixarem os portões da cidade de Chang-An. Durante dois dias, seus cavalos galoparam sem cessar e não demorou muito para chegarem ao Monastério do Portão da Lei. O abade daquele templo ordenou que os quinhentos monges que ali residiam saíssem para recebê-los. 

Após adentrarem o templo, foi servido chá aos convidados, seguido de uma refeição vegetariana. Logo após terminarem a refeição, a noite começou a cair As sombras foram pontuando gradualmente o céu de estrelas, enquanto a lua fazia sua aparição, brilhante como as aspirações de um homem puro. Ao longe, um bando de patos selvagens regressava cansado ao seu ninho. Todas as casas foram ficando às escuras, exceto os monastérios, onde os monges começavam a recitar suas orações sentados sobre esteiras de bambu. As preces continuaram até bem tarde da noite. A essa altura, vários monges haviam começado a discutir sobre as doutrinas budistas e a conveniência de irem até o Paraíso Ocidental em busca de mais escrituras. Alguns alegaram que a viagem era extremamente longa, com rios largos para vadear e montanhas imponentes para atravessar; outros diziam que o caminho era infestado de tigres, leopardos e outros animais; um terceiro grupo sustentava que haviam cadeias de montanhas tão altas que nenhum homem jamais as havia escalado; finalmente, os mais imaginativos insistiam que o mais perigoso eram os monstros que ninguém havia conseguido dominar até então. Enquanto falavam, Sanzang manteve a boca bem fechada, apenas balançando a cabeça e apontando para o coração. Intrigados, muitos dos monges cruzaram as mãos na altura do peito e perguntaram respeitosamente:

- Por que você aponta incessantemente para o seu coração e balança tanto a cabeça?

- Quando a mente está em movimento - , respondeu Sanzang, - o reino da destruição e da morte aparece, mas enquanto ela permanece inativa, a vida se torna mais forte. No Monastério da Transformação, diante da estátua de Buda, fiz um juramento solene e não tenho escolha senão fazer tudo o que estiver ao meu alcance para cumpri-lo. Não vou parar, portanto, até alcançar o Paraíso Ocidental, encontrar Buda e obter as escrituras. Desta forma, a Roda da Lei (1) girará em nossa direção e o reinado de nosso senhor estará assegurado para sempre.

Estas palavras suscitaram admiração em todos os presentes, que exclamaram respeitosamente: - Que professor leal e corajoso! - e, cheios de elogios, acompanharam-no até o leito.

Logo os guardiões da cidade começaram a sacudir as varas de bambu, informando a todos os habitantes que a lua acabara de se pôr. O canto dos galos parecia querer forçar o sol a sair do seu esconderijo noturno. Muitos dos monges saíram de suas camas e começaram a preparar o café da manhã. Sanzang vestiu sua túnica e foi ao templo orar, dizendo:

- Eu, senhor, sou seu discípulo Chen Xuanzang e estou a caminho do Paraíso Ocidental em busca das escrituras. Contudo, meus olhos são muito débeis e é difícil para eles reconhecerem a figura autêntica do Buda vivo. Portanto, gostaria de lhe fazer uma promessa: queimarei incenso em todos os monastérios que encontrar pelo caminho, o adorarei onde quer que me encontre com você e varrerei e limparei todos os pagodes que tiver a honra de vislumbrar. Em troca, peço apenas que tenha misericórdia de mim e me mostre seu corpo de diamante de cinco metros de altura, pois sabes muito bem que meu único desejo é obter as escrituras e trazê-las para as Terras Orientais.

Assim que terminou a oração, Sanzang voltou ao mosteiro e comeu alguma coisa. A essa altura os seus dois acompanhantes já haviam selado os cavalos e preparado tudo o que era necessário para a viagem. Sanzang despediu-se dos monges à porta do monastério, mas eles começaram a chorar e acompanharam-no durante mais de sete quilómetros. Sanzang os observou partir com lágrimas nos olhos. Porém, seu objetivo era o Oeste, e ele rumou para lá de forma decisiva. 

Era o final do outono e as árvores estavam completamente nuas. Apenas as altas colunas dos bordos deixavam cair uma ou outra folha vermelha. Muitos poucos caminhantes se aventuraram pelos caminhos, cobertos de chuva e lama. Tudo parecia conspirar para encher o coração de peso e tristeza. Não demorou muito para que os canaviais ficassem cobertos de neve. Perplexos, os patos eram incapazes de encontrar a localização exata de seus ninhos. As nuvens estendiam-se, ameaçadoras, por toda a paisagem coberta de geada e gelo, enquanto as andorinhas e os gansos selvagens se preparavam para migrar para outras terras. Seus gritos soavam urgentes e desesperados. Depois de viajar por vários dias, o mestre e seus acompanhantes chegaram à cidade de Gongzhou. As autoridades locais os receberam calorosamente e insistiram para que ficassem e passassem a noite. Na manhã seguinte, continuaram sua jornada, não sem antes estocarem comida e bebida. Caminhando durante o dia e descansando à noite, em dois ou três dias chegaram ao distrito de Hezhou, que era o último bastião do Grande Império Tang. Quando o comandante-chefe de toda a fronteira e os monges do distrito souberam que o Mestre da Lei, um irmão do próprio imperador, se dirigia ao Paraíso Ocidental em busca das escrituras, saíram para recebê-los com toda a pompa que se esperava deles. 

As autoridades religiosas os convidaram a pernoitar no Monastério de Fuyuan, onde foram recebidos por todos os monges que ali residiam. Depois do jantar, os dois acompanhantes, de Sanzang, conscientes da sua vontade de continuar a viagem o mais rápido possível, alimentaram os cavalos para não perderem um minuto na manhã seguinte. Assim que o galo cantou, os monges saltaram da cama e prepararam o café da manhã, para que tão ilustre visitante pudesse prosseguir o seu caminho quando quisesse. Na verdade, não era tão cedo, já que no final do outono e durante todo o inverno os galos costumam cantar um pouco mais tarde do que nas outras estações. Mesmo assim, ao deixarem as fronteiras do império, tudo estava coberto de geada, e a lua brilhava como se fosse plena noite.

A vinte ou trinta quilômetros, depararam-se com uma cordilheira tão alta que logo perceberam que seria extremamente difícil atravessá-la. Em vão tentaram encontrar uma passagem, temendo a todo momento se perderem. Quando estavam mais nervosos, os três escorregaram ao mesmo tempo e caíram, juntamente com o cavalo, em uma fenda muito profunda. 

Sanzang estava aterrorizado, assim como seus acompanhantes, que não paravam de tremer de medo. O mais alarmante de tudo foi que começaram a ouvir vozes gritando:

- Agarre-os! Não deixe ninguém escapar!

Imediatamente, um vento violento surgiu, acompanhado por um grupo de cinquenta ou sessenta ogros, que depois de agarrarem Sanzang e seus companheiros, os levaram para fora da fenda. 

Ainda tremendo, o Mestre da Lei olhou ao redor e viu um rei monstro sentado em um trono. Sua figura era verdadeiramente aterrorizante e seu rosto possuía uma ferocidade incomum. Seus olhos brilhavam como relâmpagos e sua voz fazia as montanhas tremerem. Tinha dentes protuberantes, irregulares como serras, que emergiam do canto dos lábios, como se fossem presas. Todo o seu corpo estava coberto por figuras estranhas, que em sua espinha dorsal assumiam a forma de espirais ascendentes, como se fossem feitas de fumaça. Seus pelos eram ásperos como aço, e as garras, sólidas e imponentes, pareciam espadas recém-afiadas. Até mesmo o bravo Huang Gong (2) do Mar do Leste teria tremido ao ver o Rei da Montanha do Sul com suas sobrancelhas brancas.


Sanzang estava tão apavorado que sentiu seu espírito abandoná-lo e seus ossos e tendões ficaram dormentes de repente. O Rei Monstro ordenou que fossem amarrados com cordas grossas, e os ogros obedeceram sem questionar. Enquanto se preparavam para devorá-los, ouviu-se um murmúrio de vozes do lado de fora e alguém relatou:

- O Urso Senhor da Montanha e o Boi Eremita acabaram de chegar.

Sanzang ergueu a cabeça e viu que o primeiro era um sujeito de pele escura, de aspecto corajoso e corpo forte. Sua força era tão grande que ele era capaz de separar as águas dos mares. Percorria as florestas incessantemente, apenas para mostrar o quão irredutível era seu poder. Embora sonhar com ursos sempre tenha sido interpretado como um bom presságio (3), este levava à submissão e ao medo. Ele era, na verdade, tão forte que podia, como quisesse, escalar ou quebrar qualquer árvore que quisesse. Ele também possuía uma inteligência tão profunda que era capaz de prever a aproximação do inverno. Não era estranho que ele fosse conhecido como o Senhor da Montanha.

O outro era dotado de um impressionante par de chifres e uma corcunda não menos marcante. Vestia uma túnica esverdeada e seu andar era cansado, denotando um modo de ser bastante calmo. Ele era filho de um touro e de uma vaca e ajudava muito os homens, principalmente na hora de arar. Não era em vão que ele era conhecido em todos os lugares pelo nome de Boi Eremita.

Os dois entraram movimentando-se com certa arrogância, e o Rei Monstro se apressou em recebê-los.

- Devo parabenizá-lo, General Yin - , exclamou o Urso Senhor da Montanha. - Se nota que o tempo não passou para você e que está em boa forma como sempre.

- Certamente é algo incrível - confirmou o Boi Eremita. - O General Yin parece cada vez mais jovem.

- Faz muito tempo que não os vejo, senhores - disse o Rei Monstro, tentando mudar de assunto. - Posso saber onde vocês estiveram?

- Descansando um pouco - respondeu o Urso Senhor da Montanha.

- Apenas acompanhando os tempos - respondeu o Boi Eremita quase ao mesmo tempo, e então todos se sentaram.

Um dos acompanhantes de Sanzang foi amarrado com tanta força que começou a gemer de dor. Surpreso, o Urso Senhor da Montanha perguntou:

- Como esses três chegaram aqui? 

- Não sei -, respondeu o Rei Monstro. - Eles apareceram sozinhos na minha porta, sem ninguém os chamar.

- Você pode servi-los no jantar? - perguntou o Boi Eremita, caindo na gargalhada.

- Claro! - exclamou o Rei Monstro, satisfeito. 

- Acho melhor não comermos todos eles - sugeriu o Urso Senhor da Montanha. - Vamos comer dois e deixar o outro para depois.

O Rei Monstro aceitou a ideia sem questionar. Ele chamou seus servos e ordenou-lhes que desmembrassem e removessem as tripas dos acompanhantes de Sanzang. As cabeças, corações e fígados foram para os convidados, o anfitrião ficou com os membros e os demais ogros se encarregaram de devorar as sobras de carne. Eles pareciam tigres de verdade. Mastigavam tão rapidamente que, em poucos segundos, nem mesmo a medula permaneceu nos ossos. Sanzang ficou tão apavorado que pensou que estava tendo um pesadelo. Era a primeira provação pela qual foi submetido depois de deixar Chang-An.

Aos poucos, uma tímida linha de luz começou a aparecer no leste. Os dois monstros ficaram sentados até o amanhecer. Eles então se levantaram e despediram-se do anfitrião, dizendo:

- Estamos em dívida com a sua generosa hospitalidade. Tenha certeza de que, assim que tivermos a menor oportunidade, lhe pagaremos na mesma moeda - e então foram embora.

O sol já estava alto no céu. Sanzang estava imerso em tal estupor que não conseguia distinguir o norte do sul e o leste do oeste. Nesse estado, ele pensou ter visto de repente, um ancião com uma bengala aproximando-se dele com passos cansados. Ele fez um aceno com as mãos, e todas as cordas que amarravam Sanzang se romperam. Ele então soprou em Sanzang e o mesmo recuperou o fôlego. 

Ainda caído no chão, Sanzang disse:

 - Agradeço-lhe por salvar a vida deste pobre monge.

- Levante-se - respondeu o ancião, após aceitar sua gratidão. - Você perdeu alguma coisa?

- Meus dois acompanhantes foram devorados por monstros – respondeu Sanzang. - Quanto ao cavalo e a bagagem, não faço ideia de onde estão.

- Não é o seu cavalo ali com duas trouxas? - perguntou novamente o ancião, enquanto apontava com a bengala.

Sanzang se virou e viu que tanto o cavalo quanto sua bagagem estavam intactos. Surpreso, olhou para o velho à sua frente e perguntou:

- Onde estamos? Como é possível para você andar sozinho por esses lugares?

- Esta - respondeu o velho - é a Cordilheira da Dupla Bifurcação, um lugar cheio de tigres e lobos. Como você conseguiu chegar aqui?

- Deixei o distrito de Hezhou ao primeiro canto do galo - respondeu Sanzang. - Receio que meus companheiros e eu deveríamos ter esperado até o amanhecer, porque nos perdemos e começamos a cambalear no meio da neblina. Foi assim que acabamos nas mãos do terrível Rei Monstro. Logo apareceram o Urso Senhor da Montanha e o Boi Eremita, duas feras de aparência feroz que se dirigiram ao Rei Monstro chamando-o de General Yin. Os três devoraram meus dois acompanhantes num jantar que durou até o amanhecer. Não sei por que eles me pouparam.

- O Boi Eremita - explicou o velho - é, na verdade, o espírito de um touro selvagem; o Senhor da Montanha, o de um urso, e o General Yin, o de um tigre. Quanto aos outros, são demônios de árvores e montanhas e espíritos de origens muito variadas. Eles não poderiam fazer nada contra você, porque você tem uma natureza piedosa e pura. Siga-me, se desejar, e eu lhe mostrarei o caminho que você deve seguir.

Sanzang não conseguia encontrar palavras para agradecê-lo. Ajustou as correias do cavalo e, segurando-o pelas rédeas, caminhou cuidadosamente atrás do ancião. Dessa forma, conseguiu sair da cova em que havia caído e voltar ao caminho principal. Ele ficou tão agradecido quando se viu em terreno seguro que teve vontade de se curvar ao chão. No entanto, ao se virar depois de amarrar o cavalo em alguns arbustos, percebeu que o ancião havia desaparecido.

Nesse exato momento, uma brisa suave se levantou, e ele viu o ancião subir alto em uma garça branca de cabeça rosada. Gradualmente, o vento acalmou, e então caiu um pequeno pedaço de papel, no qual estava escrito, com uma caligrafia cuidadosa, o seguinte:

"Eu sou o Planeta Vênus e vim em seu auxílio por ordem expressa do Céu. Não desista e siga adiante. Lembre-se que, enquanto durar sua nobre missão, você sempre contará com nossa ajuda."

Assim que Sanzang terminou de lê-lo, ele se curvou diante do céu e disse:

- Obrigado, Estrela Dourada, por me libertar - e, agarrando as rédeas do cavalo, continuou sua solitária e melancólica jornada.

Os lugares por onde passava agora eram frios e continuamente castigados pela chuva e pelo vento. Às vezes ouvia-se o leve murmúrio das águas de um riacho e sentia-se o tímido aroma das flores silvestres. As pedras empilhavam-se umas sobre as outras, como paredes inacessíveis, à medida que ele subia. Ao longe ouviam-se os gritos dos macacos e os berros dos cervos entre o chilrear esporádico dos pássaros. A calma era absoluta; estava claro que não haviam homens num raio de quilômetros. Isso fez com que o monge voltasse a ser vítima da ansiedade e o próprio cavalo se sentisse tão inquieto que suas pernas começaram a falhar. Com o coração partido, mas disposto a sacrificar a vida pela missão a que se comprometera, Sanzang continuou a sua dolorosa subida pela cordilheira, que se tornava mais acidentada a cada passo que dava. Caminhou durante meio dia e durante todo esse tempo não encontrou um único homem ou lugar habitado. As dores da fome tornavam-se cada vez mais intensas e suas forças lhe faltavam. Para piorar a situação, ele descobriu que dois terríveis tigres bloqueavam seu caminho, enquanto atrás dele várias cobras enormes serpenteavam e à sua direita e à esquerda uma infinidade de feras ameaçadoras das mais variadas origens se moviam. 

Sanzang não tinha escolha a não ser confiar na decisão protetora dos Céus. Havia pouco que ele pudesse fazer para escapar, pois o cavalo estava completamente debilitado e parecia incapaz de dar mais um passo. Sua fraqueza era tão grande que ele dobrou as patas dianteiras e permaneceu deitado no chão. Não conseguia movê-lo nem puxando pelas rédeas e nem batendo com uma vara. Quase sem espaço para ficar em pé, o Mestre da Lei estava nas profundezas do desespero, resignando-se ao seu destino e pronto para se render à morte. No entanto, embora a situação fosse realmente perigosa, a salvação já estava a caminho. Quando estavam prestes a saltar sobre ele, algo fez com que os animais fugissem, os tigres se dispersassem e as cobras se escondessem. Sanzang olhou para cima, perplexo, e viu um homem se aproximando com um tridente de aço nas mãos e um arco amarrado na cintura. Ele era realmente uma figura valente. Sua cabeça estava coberta por uma pele de leopardo salpicada de ametistas e ele usava uma túnica feita de pele de cordeiro, na qual estavam impressos vários bordados de seda preta. Sua cintura era presa por um cinto, cuja fivela mostrava a figura de um rei bárbaro com cabeça de leão. Suas botas eram surpreendentemente altas e habilmente feitas. Ele tinha olhos tão esbugalhados que pareciam os de um enforcado, enquanto sua barba desgrenhada o fazia parecer um deus guerreiro. Isso era atestado pelo arco e pelas flechas envenenadas que ele usava pendurados na cintura e pelo tridente de aço puro que ele segurava nas mãos. Sua voz lembrava o rugido de um trovão e era capaz de encher de medo todas as criaturas que viviam na floresta.

Quando Sanzang o viu se aproximando dele, prostrou-se com o rosto em terra e gritou: 

- Tenha piedade de mim! Eu te imploro! 

O homem foi até onde o monge estava, cravou o tridente no chão e, após ajudá-lo a se levantar com uma gentileza inesperada, disse:

- Não tenha medo. Sou incapaz de prejudicar alguém. Apenas ganho a vida caçando nesses lugares. Meu nome é Liu Boqin, embora todos me conheçam pelo nome de Guardião da Montanha. Saí para procurar algum animal para comer, e a última coisa que eu esperava era encontrá-lo. Espero não tê-lo assustado.

- Eu - explicou então Sanzang - sou um pobre monge que se dirige ao Paraíso Ocidental em busca dos escritos de Buda por desejo expresso de sua majestade o Imperador dos Tang. Antes de você chegar, eu estava cercado por um número incontável de tigres, lobos e cobras e não conseguia seguir em frente. Felizmente, assim que viram você se aproximando, fugiram aterrorizados e assim pude salvar minha vida. Estou, portanto, em dívida com você.

- Não foi nada - desculpou-se Boqin, timidamente. - As feras selvagens me temem porque, como já lhe disse antes, ganho a vida matando tigres, lobos e leopardos e caçando todas as cobras e répteis que posso. Se você vem do império Tang, não tem nada a temer. Este território é, de fato, parte dele e eu sou um dos seus súbditos. Aparentemente, nós dois reverenciamos o mesmo Filho do Céu e somos cidadãos da mesma nação. Se quiser, você pode descansar na minha cabana e continuar a viagem amanhã.


Sanzang ficou louco de alegria ao ouvir essas palavras. Ele agarrou o cavalo pelas rédeas e seguiu lentamente o caçador. Subiram uma encosta muito íngreme e depois de alguns passos, o uivo do vento voltou a ser ouvido. Isso fez com que Boqin parasse de repente e dissesse:

- Sente-se aqui e não se mexa. Algo me diz que um leopardo está por perto. Vou ver se consigo pegá-lo para poder lhe oferecer algo para comer.

Ao ouvir isso, Sanzang sentiu o coração martelar no peito. Mais uma vez suas forças falharam, e ele permaneceu como se estivesse enraizado no chão. O Guardião da Montanha, por sua vez, pegou o tridente e avançou cuidadosamente. Alguns passos depois deu de cara com um enorme tigre de pele estriada, que fugiu assim que o viu. Boqin correu atrás dele, gritando com sua potente voz de trovão:

- Maldita besta! Pode-se saber para onde você está tentando escapar? 

Percebendo que a fuga era inútil, o tigre virou-se, abriu as garras e enfrentou o temível tridente do seu adversário. Sanzang estava tão apavorado que não conseguia se mover do local. Desde que havia deixado o ventre de sua mãe, ele jamais havia presenciado tanta violência O Guardião da Montanha perseguiu o tigre até o sopé da montanha, onde homem e animal travaram um combate formidável. Os cabelos do Guardião se moviam como redemoinhos de vento, enquanto o animal levantava nuvens de poeira, o que falava claramente de sua incrível força. Mostrando os dentes afiados, desferiu um terrível golpe no adversário, que se esquivou com um movimento rápido de cintura. Então ele ergueu o tridente e o sol refletiu em seu aço. O tigre levantou uma nuvem de poeira com a cauda e o golpe do caçador acertou o peito da fera. Os dois eram extremamente ágeis e se esquivavam com a maestria dos verdadeiros guerreiros, caso contrário um dos dois teria ido imediatamente se juntar ao Rei Yama. 

Os rugidos do tigre podiam ser ouvidos por toda a montanha, causando um tremor incontrolável nas bestas e pássaros. Por sua vez, os gritos do Guardião da Montanha impressionaram tanto o firmamento que este imediatamente revelou suas estrelas. A ferocidade de um fazia seus olhos parecerem saltar das órbitas, mas tal bravata encontrava pouco eco no coração do outro. O Guardião da Montanha era um lutador excelente, não ficando atrás em nada na técnica impecável do rei dos animais selvagens. Homem e animal lutaram por suas vidas, sabendo que quem se descuidasse seria o primeiro a perdê-la. 

O confronto durou aproximadamente uma hora. Nesse momento, as garras do tigre começaram a ficar cada vez mais lentas, e seu corpo começou a perder elasticidade. Isso acabou prejudicando-o, pois pouco depois o Guardião da Montanha finalmente conseguiu cravar o tridente em seu peito. Foi um espetáculo verdadeiramente digno de pena! O aço destroçou o coração da besta e imediatamente o chão se encheu de sangue. O Guardião da Montanha então o pegou pela orelha e o arrastou ladeira acima. Que constituição invejável aquele homem tinha! Ele mal estava ofegante quando chegou perto de Sanzang, e nem seu rosto mudava de cor.

- Tivemos sorte - disse ele alegremente ao monge. - Este tigre nos fornecerá sustento por pelo menos um dia.

- Você é verdadeiramente um deus da montanha - afirmou Sanzang, comemorando seu triunfo com entusiasmo.

- Eu? - exclamou Boqin, surpreso. - O que eu fiz para merecer um título como esse? Tudo foi produto de boa sorte. Vamos. Tenho que despelá-lo o mais rápido possível, para que você possa comer sem demora, pois imagino que você esteja com fome, não é mesmo?

Segurando o tridente com uma mão e arrastando o tigre com a outra, ele se preparou para a liderar o caminho, seguido por Sanzang e seu cavalo. Depois de atravessarem a encosta íngreme, chegaram em uma aldeia perdida nas montanhas, cujas ruas estavam repletas de vinhas selvagens e avistavam-se raízes de árvores centenárias. O ar ali era muito fresco, embora toda sensação desaparecesse diante da beleza da paisagem em que estava inserida. Os caminhos que conduziam até ela estavam cobertos de flores silvestres com um aroma tão intenso que ficava impregnado no corpoOs canaviais não eram abundantes, mas o verde dos seus bambus era muito superior ao de qualquer outro lugar. Aquela aldeia parecia ter sido arrancada de uma pintura, com os seus alpendres relvados, os seus quintais vedados, as suas pontes de pedra e os seus muros caiados. Que rara elegância daquele lugar humilde! A presença do outono fazia-se notar no frescor arejado do vento, nas folhas amareladas que enfeitavam os caminhos, nas nuvens esbranquiçadas que turvavam os picos das montanhas... Ao longe da floresta os cantos dos pássaros selvagens podiam ser ouvidos, enquanto mais perto, no interior da aldeia, apenas se ouvia o latido barulhento dos cães.

Ao chegar à porta de sua casa, Boqin deixou o tigre morto cair no chão e, levantando a voz, perguntou:

- Tem alguém em casa?

Imediatamente, três ou quatro criados de aparência mesquinha e desagradável saíram ao seu encontro e levaram o animal para dentro de casa. Boqin ordenou que o desmembrassem e fizessem um ensopado para seu ilustre convidado. Ele então se voltou para Sanzang e o convidou para ficar em sua casa. O Mestre da Lei não sabia como retribuir tanta atenção. Sem saber exatamente o que dizer, agradeceu novamente por ter salvado sua vida, ao que Boqin respondeu rapidamente:

- Não precisa me agradecer por nada. Afinal, pertencemos à mesma nação, não é?

Após se sentar para tomar uma xícara de chá, uma anciã e uma mulher, que tinha todos os traços de ser sua nora, vieram dar as boas-vindas a Sanzang.

- Esta - disse Boqin, apontando para a anciã - é minha mãe, e aquela é minha esposa.

- Permita-me dar o lugar de honra à sua respeitável progenitora - pediu Sanzang. - Não é certo que eu, uma pessoa mais jovem, tenha mais consideração do que ela.

- De maneira nenhuma! - protestou a anciã. - Você é nosso convidado e, além disso, vem de muito longe. Permaneça sentado, por favor, e não seja tão educado.

- Este monge, mãe - explicou Boqin - está se dirigindo ao Paraíso Ocidental em busca dos escritos de Buda por desejo expresso do Imperador dos Tang. Encontrei-o na cordilheira e, como ambos pertencemos à mesma nação, convidei-o para vir descansar em nossa casa. Amanhã, se quiser, poderá continuar seu caminho.

- Que bom! - exclamou a anciã, visivelmente satisfeita. - Você não poderia ter tido ideia melhor. Este monge veio até nós do céu. Amanhã é o aniversário da morte do seu pai e pensei que não faria mal nenhum se ele presidisse algum tipo de serviço religioso para ele. Acho que ele não se importará de partir depois de amanhã.

Apesar de ser um caçador, o Guardião da Montanha tinha um elevado senso de piedade filial e aceitou imediatamente a sugestão da mãe. Num piscar de olhos, ele preparou o incenso e o papel-moeda e explicou todo o plano para Sanzang. Enquanto discutiam os detalhes, começou a escurecer. Os criados trouxeram então cadeiras e uma mesa, e começaram a servir diversos pratos feitos com carne de tigre, alguns deles cozidos no vapor. Boqin convidou Sanzang para se sentar à mesa, informando-o prontamente que o arroz chegaria em breve.

- Santo céu! - exclamou Sanzang, juntando as mãos. - Fui monge durante toda a minha vida e jamais provei carne.

- Isso é um problema- respondeu Boqin com tristeza -, porque nesta casa nunca seguimos uma dieta vegetariana. Imagino que não seria muito difícil encontrarmos alguns bambus e alguns outros vegetais por aí, mas necessariamente teriam que ser cozidos com gordura de tigre ou de veado. Sem falar que todas as nossas panelas são impregnadas com gordura animal. O que podemos fazer? Desculpe, fui tão descuidado.

- Não se preocupe - Sanzang tentou consolá-lo. - Desfrutem da comida sozinhos. Consigo resistir à fome três ou quatro dias seguidos. Para ser sincero, para mim é melhor isso do que quebrar a dieta vegetariana.

- Mas não podemos permitir que você morra de fome - protestou Boqin.

- Você foi gentil o suficiente comigo para me salvar dos tigres e lobos - Sanzang o tranquilizou. - Morrer de fome é muito melhor do que acabar servindo de alimento para um tigre.

A mãe de Boqin ouviu toda a conversa e, dirigindo-se ao filho, disse:

- Deixe de falar besteira, por favor. Agora mesmo vou preparar um prato vegetariano para ele.

- Posso saber onde você vai conseguir isso? - exclamou Boqin, surpreso.

- Isso não lhe importa - respondeu a anciã. - É assunto somente da minha conta.

Ela então pediu à nora que trouxesse uma panela e a aquecesse até que toda a gordura derretesse. Depois lavou-a com cuidado, esfregando-a repetidas vezes, e encheu-a com água, que imediatamente colocou no fogo. Acrescentou então algumas folhas de olmo e assim preparou uma sopa, à qual acrescentou também um pouco de arroz, algumas espigas de milho e dois ou três punhados de legumes secos.

- Tome isto, mestre, e não se preocupe - , disse ela a Sanzang, na hora de servi-lo. - Garanto que esta é a comida mais pura e isenta de impurezas que minha nora e eu já preparamos em toda a nossa vida.

Sanzang ficou tão emocionado que se levantou para agradecer. Boqin por sua vez, mudou-se para outra mesa e imediatamente seus criados lhe serviram uma quantidade incrível de pratos de carne de tigre, cervo, cobra, coelho e de veado curado. Ele pegou os pauzinhos, mas quando estava prestes a colocar o primeiro pedaço na boca, viu Sanzang juntar as mãos e começar a recitar algo que não conseguia entender completamente. Corado de vergonha, ele colocou os pauzinhos de volta na mesa e levantou-se respeitosamente. Ao vê-lo, Sanzang terminou sua oração e disse:

- Coma, antes que esfrie.

- Parece que você gosta de recitar pequenas passagens das escrituras - comentou Boqin.

- Quem disse que era um fragmento das escrituras? - Sanzang o corrigiu. - Foi apenas uma simples oração antes de comer.

- Como vocês monges são cuidadosos! - exclamou Boqin.- Até para colocar comida na boca precisam orar.

Assim que terminaram o jantar, os criados retiraram a mesa. Estava começando a anoitecer quando Boqin conduziu Sanzang para fora do salão principal para dar um passeio nos fundos da residência. Eles se dirigiram para um galpão coberto de palha, onde entraram e encontraram alguns arcos muito pesados ​​com suas aljavas correspondentes penduradas na parede. Duas esplêndidas peles de tigre pendiam das vigas, fedorentas e cheias de sangue, que pareciam sombrear um grande número de lanças, facas e tridentes cravados no chão em um dos cantos. No meio podiam ser vistos dois assentos, nos quais Boqin convidou Sanzang a sentar-se, mas ele foi incapaz de suportar o cheiro de sangue, e eles saíram novamente para o frescor da noite. Logo atrás do galpão havia um imenso jardim cheio de canteiros de crisântemos dourados e impressionantes bordos vermelhos. Imediatamente houve um leve movimento entre a folhagem e apareceram alguns cervos, que não se assustaram nem um pouco com sua presença inesperada. Surpreso, Sanzang disse ao companheiro:

- Nunca imaginei que fosse possível domesticar tantos animais.

- Na cidade de Chang-An - respondeu Boqin - as pessoas se preparam para enfrentar  tempos sombrios acumulando riquezas e tesouros, arroz e cereais. Aqui, nós caçadores fazemos o mesmo ao manter algumas dessas feras selvagens. Isso é tudo.

Enquanto conversavam, a noite caiu e eles decidiram voltar para dentro de casa para descansar. Na manhã seguinte, todos acordaram muito cedo. Depois de preparar um banquete vegetariano para um hóspede tão importante, pediram-lhe que iniciasse os ritos religiosos. 

Após lavar as mãos, o monge dirigiu-se ao salão dos antepassados, onde queimou incenso na companhia do Guardião da Montanha. Inclinou-se então diante do altar da família e, depois de bater em seu peixe de madeira, recitou as fórmulas de purificação da boca, seguidas pelas da mente e do corpo. 


Ele imediatamente passou a recitar o Sutra para a Salvação dos Mortos, após o qual Boqin pediu-lhe que recitasse uma oração específica para seu falecido pai, o que ele concordou em fazer de bom grado. Então, ele entoou o Sutra do Diamante e o Sutra de Guanyin em alto e bom som. Após um breve descanso para recuperar as forças, ele leu várias passagens do Sutra de Lótus e do Sutra de Amitaya, terminando com o Sutra do Pavão e o relato de como o Buda curou um monge mendicante. A essa altura, a noite já havia caído novamente, momento ideal para queimar, junto com o incenso, as efígies de vários cavalos de papel, os desenhos de diferentes divindades e a oração composta para um momento tão solene. Assim a cerimônia budista terminou e todos gradualmente se retiraram para seus quartos.

As orações de Sanzang foram tão eficazes que naquela noite o pai de Boqin, um espírito condenado que vagava sem rumo pelo Reino Inferior desde o momento de sua morte, apareceu em sonho para todos os membros de sua família e disse:

- Há muito tempo sou submetido a terríveis tormentos na Região das Trevas, sem conseguir alcançar a salvação. Felizmente, as súplicas desse monge contribuíram efetivamente para a remissão de todos os meus pecados, e o Rei Yama decidiu reencarnar-me numa família nobre e rica da respeitável nação chinesa. Vocês deveriam, portanto, agradecer-lhe por tudo o que fez por mim, mostrando-se generosos com ele. Agora devo deixá-los!- e então retirou-se dos sonhos. De fato, existe, em todas as coisas, um propósito solene: salvar os mortos da perdição e da dor.

Quando a família acordou, já havia começado a amanhecer. Muito entusiasmada, a esposa de Boqin agarrou-o pelo ombro e sacudiu-o, dizendo:

- Ontem à noite sonhei que seu pai retornava para nos contar que durante muito tempo foi submetido a terríveis tormentos na Região das Trevas, sem conseguir alcançar a salvação. Felizmente, as orações do monge contribuíram para a remissão de todos os seus pecados. ao ponto do rei Yama decidir reencarná-lo em uma nobre e rica família da respeitável nação chinesa. Ele também me pediu para lhe agradecer profusamente por tudo o que havia feito por ele e, embora eu tenha implorado para ele que ficasse, ele acabou indo embora de meu sonho. Angustiada, acordei imediatamente e só vi você ao meu lado.

- Que estranho! - exclamou Boqin, surpreso. - Eu também tive o mesmo sonho. Vamos contar para a minha mãe. Mas, quando estavam a caminho de seu quarto, ouviram a anciã gritar:

- Boqin, venha já até aqui. Tenho algo importante para lhe contar.

Alarmados, ele e a esposa entraram no quarto da anciã, e a encontraram sentada na cama.

- Meu filho - , disse ela, exultante, ao vê-los. - Ontem sonhei que seu pai voltou para casa e me ordenou que agradecesse ao monge tudo o que havia feito por ele, pois, graças à sua ação mediadora, ele finalmente obteve a remissão dos seus pecados. Ele também me informou que estava prestes a reencarnar em uma família rica da nobre nação chinesa.

Ao ouvir isso, tanto Boqin quanto a esposa começaram a rir perante a surpresa da anciã.

- Minha esposa e eu também tivemos o mesmo sonho - explicou Boqin, após finalmente controlar o riso. - Estávamos vindo aqui para lhe contar, mas o que menos esperávamos é que a senhora também havia tido o mesmo sonho.

Eles então chamaram todos os que moravam na casa e foram aos aposentos do monge para agradecê-lo. Assim que Sanzang abriu a porta para eles, eles se prostraram com o rosto no chão e disseram:

- Jamais te recompensaremos o suficiente por ter libertado nosso pai dos tormentos do inferno.

- O que eu fiz para merecer tanta atenção? - Sanzang protestou, surpreso.

Boqin então contou-lhe sobre o sonho que os três tiveram e Sanzang ficou satisfeito. Imediatamente prepararam-lhe uma refeição vegetariana e deram-lhe um saco cheio de moedas de prata, o qual ele rejeitou firmemente diante da insistência desesperada de toda a família.

- Para mim o dinheiro não tem valor algum - tentou fazê-los entender. - Agora, se desejar me acompanhar durante parte da viagem, ficarei eternamente grato.

Boqin, sua esposa e sua mãe não tiveram escolha senão guardar o dinheiro e preparar às pressas alguns bolos de farinha não peneirada, que Sanzang aceitou com visível satisfação. Boqin então calçou suas botas e preparou-se para acompanhá-lo o maior tempo possível. Seguindo o conselho de sua mãe, ele ordenou que vários servos pegassem em armas e servissem como escolta. Assim equipados, saíram pela estrada principal, contemplando, com espanto, a beleza indescritível das montanhas e picos.

Eles continuaram assim por aproximadamente meio dia. Quando o sol parecia estar em seu zénite, depararam-se com uma montanha tão alta e escarpada que o seu cume se perdia no azul infinito do céu. Não demorou muito para alcançarem seu pé. O Guardião parou por um momento, olhou para a inclinação da sua encosta e começou a subi-la, como se estivesse caminhando em um terreno totalmente plano. No meio do caminho, porém, ele parou de repente, virou-se e disse ao monge:

- Receio que só posso acompanhá-lo até aqui. A partir de agora, você terá que continuar o caminho sozinho.

  Ao ouvir isso, Sanzang desceu de seu cavalo e implorou-lhe com manifesta ansiedade:

- Peço-lhe que me acompanhe um pouco mais, por favor.

- Não posso fazê-lo - desculpou-se Boqin. - Você não percebe que esta é a Montanha das Duas Fronteiras? A parte oriental está sob o domínio dos Tang, mas a parte ocidental já pertence aos tártaros. Temo que os tigres e lobos que vivem lá não me considerem seu soberano e, portanto, minha proteção possa ser de pouca utilidade para você. Sem falar que não tenho permissão para cruzar a fronteira. Infelizmente, você deve continuar sozinho.

Um medo mortal se abateu sobre Sanzang. Sem saber o que fazer, ele agarrou as mangas do caçador, enquanto lágrimas escorriam de seus olhos em profusão. Foi neste momento terno de despedida que se ouviu uma voz vinda do sopé da montanha dizendo:

- Meu mestre chegou! Meu mestre chegou!

Sanzang ficou sem palavras, e até o próprio Boqin começou a tremer. Não sabemos quem estava gritando daquele jeito. Quem quiser descobrir terá que ouvir as explicações fornecidas no próximo capítulo.


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Notas do Capítulo XIII

  1. A Roda da Lei, ou dharmachakra ("a verdade de Buda"), dissipa o mal rolando incessantemente de homem para homem e de era para era.
  2. Huang Gong, personagem da dinastia Han, veio de Dunghai, província de Kiangsu, e tinha fama de ser um grande caçador de tigres.
  3. Tradicionalmente, os sonhos com ursos são interpretados na China como o anúncio do nascimento de um menino.

  • Tradução em pt-br por Rodrigo Viany (Sleipnir). Favor não utilizar sem permissão.
  • Tradução baseada na tradução do chinês para o espanhol feitas por Enrique P. Gatón e Imelda Huang-Wang, e do chinês para o inglês feita por Collinson Fair.
fontes consultadas para a pesquisa:
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