30 de novembro de 2025

Boreyne

۞ ADM Sleipnir

O Boreyne é uma criatura heráldica composta, registrada principalmente na heráldica europeia do final da Idade Média. Diferente das criaturas mitológicas tradicionais encontradas em bestiários ou no folclore, o Boreyne não possui origem lendária: trata-se de uma criação puramente heráldica — um monstro artificial concebido especificamente para figurar em brasões e emblemas.

Origem

A documentação mais antiga e confiável sobre o Boreyne remonta a cerca de 1466, quando foi utilizado como emblema alusivo (canting badge) pela família Borough (ou Burgh). Os canting badges eram emblemas heráldicos que representavam visual ou foneticamente o nome do portador — neste caso, “Boreyne” faz alusão direta ao nome Borough ou Burgh. O uso dessa criatura está particularmente associado à família de Sir Thomas Burgh de Gainsborough, figura de destaque no final do século XV que serviu aos reis Eduardo IV, Ricardo III e Henrique VII.

Iconografia

O Boreyne é descrito como um monstro híbrido, vagamente semelhante a um touro, mas que reúne características de diversos animais. Possui cabeça de touro, crina de cavalo, patas dianteiras e cauda de leão, patas traseiras de águia, chifres curvados, língua em forma de lança (semelhante à de uma serpente) e uma barbatana dorsal que se projeta a partir da garupa.

Ao contrário de outras figuras heráldicas mais padronizadas, o Boreyne não apresenta uma postura tradicional fixa dentro da heráldica. Registros iconográficos o mostram em diferentes atitudes, incluindo a passant (caminhando), entre outras variações.


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29 de novembro de 2025

Eliza Battle

 ۞ ADM Sleipnir


O Eliza Battle foi um barco a vapor com rodas de pás que operou no rio Tombigbee, navegando entre Columbus, Mississippi, e Mobile, Alabama, nos Estados Unidos durante a década de 1850. Considerado um dos barcos fluviais mais luxuosos de seu tempo, o navio tornou-se tristemente célebre pelo desastre marítimo que resultou em sua destruição e transformou-o em uma das mais duradouras lendas folclóricas do Alabama.​

História

O Eliza Battle foi lançado em New Albany, Indiana, em 1852. Tratava-se de um vapor com rodas laterais de casco de madeira, com capacidade de 316 toneladas. A embarcação era operada a partir de Mobile, Alabama, pela empresa Cox, Brainard & Company, que dominou o transporte fluvial no Alabama até 1861.​ O navio rapidamente estabeleceu reputação como uma das embarcações mais luxuosas a navegar as águas do Alabama. Em 7 de abril de 1854, o ex-presidente dos Estados Unidos Millard Fillmore foi homenageado durante uma recepção a bordo do navio em Mobile, atestando o prestígio da embarcação.​

O Eliza Battle operava uma rota regular entre Columbus, Mississippi, e Mobile, Alabama, transportando passageiros e cargas, predominantemente algodão. O barco navegava até Columbus apenas durante os períodos de cheia regular do rio Tombigbee no inverno, quando as águas permitiam a navegação mais ao norte.​

Anúncio no jornal Sumter County Whig (18/04/1855) dos serviços do Eliza Battle. 

O desastre de 1858

No final de fevereiro de 1858, o Eliza Battle partiu de Columbus sob o comando do Capitão S. Graham Stone, com Daniel Epps como piloto. Durante sua viagem rio abaixo, o navio fez paradas em Pickensville, Gainesville, Demopolis e numerosos pequenos atracadouros ao longo do rio.​ Quando deixou Demopolis em 28 de fevereiro de 1858, a embarcação estava totalmente carregada com passageiros e mais de 1.200 fardos de algodão. 

Durante aquela noite excepcionalmente fria, um forte vento norte começou a soprar, com a temperatura caindo 40°F (aproximadamente 22°C) nas duas horas após o anoitecer.​ Por volta das 2h da manhã de 1º de março de 1858, cerca de 32 milhas (51 km) rio abaixo de Demopolis, próximo ao local onde hoje fica Pennington, Alabama, descobriu-se que fardos de algodão no convés principal estavam em chamas. O fogo se espalhou rapidamente impulsionado pelos fortes ventos, e logo toda a embarcação estava envolta em chamas.​

A tripulação tentou conduzir o barco até a margem para dar aos passageiros uma chance de escapar, mas a corda do leme havia sido queimada pelo fogo, deixando a embarcação à deriva descontroladamente com a correnteza. Os passageiros enfrentaram uma escolha impossível: morrer queimados ou saltar nas águas geladas do rio em estado de enchente.​

Vítimas e resgate

A estimativa de mortos varia entre 26 e 33 pessoas, de um total de aproximadamente 60 passageiros e uma tripulação de 45 membros. Diversos sobreviventes tentaram flutuar agarrados a fardos de algodão ou se refugiaram em copas de árvores cercadas pelas águas da enchente.​ Das aproximadamente 25 pessoas que conseguiram nadar até árvores e subir em seus galhos, apenas cerca de cinco sobreviveram à noite devido ao frio intenso. 

Um dos sobreviventes notáveis foi Frank Mauldin, que residia em Macon, Condado de Noxubee, Mississippi. Mauldin atribuiu sua sobrevivência a uma pequena garrafa de conhaque e um pedaço de tabaco que tinha nos bolsos, que usou como estimulantes durante as horas geladas na árvore.​ Rebecca Coleman Pettigrew, que vivia perto do rio, cuidou de muitos dos sobreviventes feridos da tragédia. O acidente ocorreu aproximadamente um quarto de milha ao norte de Naheola, no rio Tombigbee.​


A lenda do navio fantasma

Após a tragédia, o navio entrou no folclore do sudoeste do Alabama como um navio fantasma, com numerosos relatos de avistamentos da embarcação em chamas.​ De acordo com a tradição local, o Eliza Battle pode ser visto em noites frias e enevoadas, ainda em chamas, navegando as águas do rio Tombigbee. Os avistamentos são relatados desde logo ao norte de Pennington até Nanafalia rio abaixo. Testemunhas descrevem a aparição como uma embarcação queimando com chamas bruxuleantes, acompanhada de música distante e sons de pânico.​

Pescadores locais afirmam que a aparição é um sinal de desgraça iminente. Relatos de avistamentos tornaram-se tão frequentes e integrados à cultura local que famílias ribeirinhas utilizavam as aparições fantasmagóricas como um sistema de alerta precoce para preparar-se contra potenciais ameaças naturais.​

Em 1997, o Corpo de Engenheiros do Exército dos Estados Unidos recebeu relatos de um barco a vapor de estilo antigo em chamas perto da eclusa e barragem no rio Tombigbee. Os engenheiros que estavam no local há bastante tempo não ficaram surpresos com as chamadas, pois recebiam relatórios de um vapor em chamas quase todo mês de fevereiro, especialmente quando o clima estava severo.​

Na Cultura Pop

A história do desastre e o folclore associado foram ficcionalizados em diversos contos publicados, mais notavelmente em The Phantom Steamboat of the Tombigbee (O Vapor Fantasma do Tombigbee) no livro 13 Alabama Ghosts and Jeffrey (13 Fantasmas do Alabama e Jeffrey). Este livro, publicado pela primeira vez em 1969 pela folclorista Kathryn Tucker Windham e Margaret Gillis Figh, tornou-se uma das obras mais queridas do Sul dos Estados Unidos.​

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27 de novembro de 2025

Yaoji

۞ ADM Sleipnir


Yaoji (chinês: 瑶姬; lit. "Princesa do Belo Jade"), também conhecida como Wu Shan Shen Nü (chinês 巫山神女, "Deusa da Montanha Wu"), é uma divindade da mitologia chinesa associada às Montanhas Wushan, nas Três Gargantas do rio Yangtzé. Ao longo dos séculos, sua figura foi reinterpretada, sendo venerada como deusa do clima, protetora dos povos ribeirinhos e patrona das artes literárias. Yaoji é descrita como xamã, curandeira e mestra das ervas medicinais, responsável por trazer inúmeras plantas de cura à Terra. Em tradições posteriores, foi absorvida pelo taoismo e identificada como uma das filhas da Rainha Mãe do Oeste.

Em algumas tradições populares mais recentes, Yaoji foi equivocadamente associada como mãe do deus Erlang Shen (Yang Jian), mas essa versão não aparece nos mitos originais.

Origens e mitologia

As origens de Yaoji apresentam diferentes versões. No  Shan Hai Jing (chinês 山海經, "Clássico das Montanhas e Mares") , ela aparece como a terceira filha do Imperador Yan, e irmã de Jingwei. Morreu jovem, antes de se casar, e seu espírito teria se transformado em uma planta sagrada chamada erva Yao, símbolo de cura e encanto. Em tradições locais, Yaoji habitava o Palácio Celestial, mas desceu à Terra acompanhada de sua comitiva de fadas. Juntas, moldaram as montanhas e desfiladeiros de Wushan. Encantada pelo lugar, decidiu permanecer ali e acabou transformando-se no Pico da Deusa (Shennu Feng), um dos marcos naturais das Três Gargantas. 

A partir da dinastia Tang, o taoista Du Guangting reinterpretou sua lenda, apresentando-a como Yunhua, a 23ª filha da Rainha Mãe do Oeste (Xiwangmu). Nesta versão, Yaoji combate dragões que assolavam a região de Wushan e auxilia Yu, o Grande, a controlar as enchentes, abrindo passagem para o rio Yangtzé com a ajuda de seus seguidores divinos.


Relação com a literatura clássica

A imagem de Yaoji foi consolidada principalmente pela literatura chinesa. O poeta Song Yu (宋玉), do Estado de Chu, no período dos Estados Combatentes, descreveu-a em duas obras célebres: Gaotang fu (高唐赋, “Oda de Gaotang”) e Shennü fu (神女赋, “Oda da Donzela Divina”).Na primeira, a deusa aparece em sonhos ao rei Xiang de Chu, declarando: “旦为朝云,暮为行雨” (“De manhã sou a nuvem ao amanhecer, ao entardecer sou a chuva que cai”). Na segunda, mantém sua dignidade e recusa os avanços do rei, sendo descrita como possuidora de “osso e forma extraordinários” (骨法多奇, gǔfǎ duō qí), expressão que simboliza nobreza e virtude.

Com o tempo, Yaoji passou a simbolizar tanto a beleza feminina idealizada quanto a retidão moral e a resistência em se submeter a governantes corruptos, refletindo a posição de Song Yu como conselheiro que não queria servir a um mau rei. A expressão “nuvens e chuvas de Wushan” (巫山云雨, Wūshān yúnyǔ) adquiriu conotação erótica e tornou-se sinônimo da união entre homem e mulher, enquanto o ditado “除却巫山不是云” (“Fora das nuvens de Wushan, nenhuma outra nuvem é de fato nuvem”) passou a expressar fidelidade amorosa.

Poetas posteriores, como Du Fu e Li Bai, evocaram Yaoji em seus poemas, reforçando sua imagem como símbolo de beleza, amor e transcendência. A paisagem de Wushan e o Pico da Deusa também foram celebrados em pinturas e caligrafias, perpetuando a ligação entre a deusa e a arte literária e visual chinesa.


Atribuições e Culto

Além de ser lembrada como deusa da beleza e do amor, Yaoji também foi venerada como protetora contra enchentes. Nas lendas, ela auxilia Yu, o Grande, fornecendo-lhe conhecimentos secretos sobre hidráulica e enviando divindades auxiliares para ajudá-lo. Também é descrita como deusa do clima e da agricultura, invocada para espalhar nuvens e chuvas benéficas, proteger as lavouras, curar doenças e semear cogumelos da imortalidade. Em algumas tradições, Yaoji é ainda reputada como guardiã das Três Gargantas, sendo associada à navegação segura por meio de corvos divinos que guiavam as embarcações.

No sopé do Pico Fênix Voador, nas Montanhas Wushan, ergue-se o Templo da Fada (神女庙, Shénnǚ Miào), um dos principais centros de culto dedicados à deusa. No taoismo, Yaoji recebeu o título de Miaoyong Zhenren (妙用真人, “Pessoa Perfeita da Prática Miraculosa”). A paisagem em torno do templo é considerada uma das mais belas da região, com montanhas envoltas por nuvens que lhe conferem um aspecto misterioso.

Cultura Popular

Yaoji aparece em diversos jogos mobile, geralmente reinterpretada com poderes mágicos ou de apoio:
  • Dislyte (mobile): personagem esper com habilidades de cura e manipulação espiritual;
  • Heavenly Domain: Rebirth (mobile): guardiã celestial das montanhas, representando deusa imortal;
  • Nevermore M: Idle Immortal RPG (mobile): divindade que auxilia jogadores em batalhas, mantendo atributos de curandeira;
  • Tale of Foods (mobile): versão lúdica, antropomorfizada e associada à culinária mágica;
  • Tower of Saviors (mobile): carta rara ligada à água e proteção dos rios;
  • Went Refactor (mobile e PC): deusa da chuva com habilidades de suporte;
  • X-Wukong: Chaos of Realms (mobile): entidade aliada do protagonista, evocando seu papel clássico na luta contra dragões e espíritos malignos.
Chag Pu (Yao ji) (Dislyte), arte de HimoDraws

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26 de novembro de 2025

Akréti e Kenkutã

۞ ADM Sleipnir

Akréti e Kenkutã são uma dupla de irmãos míticos presentes na mitologia do povo indígena apinajé e também entre os mitos do povo kayapó, onde são conhecidos pelos nomes de Kukryt-Kakô e Kukryt-UireSegundo o mito, eram netos de um casal de anciãos que permaneceu numa aldeia abandonada após os ataques de Hága-ti (ou Agaikriti), um gavião monstruoso que fazia seu ninho num imenso jatobá. A criatura aterrorizava a comunidade ao capturar e devorar os habitantes; entre as suas vítimas estavam os pais de Akréti e Kenkutã, fato que levou o restante da tribo a abandonar o lugar, deixando apenas os avós e os dois meninos para trás.

Primeiras façanhas e a morte de Hága-ti

Certo dia, os avós e os meninos avistaram Hága-ti atravessando os céus, trazendo nas garras o corpo de mais uma vítima. No pescoço dela,  ainda pendia uma buzina, que ressoava ao vento. A visão despertou em Kenkutã profunda tristeza e indignação, levando-o a jurar vingança. Naquela noite, ao ouvir o assobio de um jaó na mata, perguntou ao avô sobre o som. O ancião explicou que se tratava de uma ave que só poderia ser abatida com uma flecha. Determinado a provar sua força, Kenkutã encontrou o animal e, contra as expectativas, matou-o com um golpe de porrete. Mais tarde, ao ouvir o ronco de uma ema, anunciou que também a caçaria. O avô considerou a tarefa impossível devido à velocidade da ave, mas, com o auxílio do irmão Akréti, que a conduziu em sua direção, Kenkutã conseguiu abatê-la da mesma forma. O feito causou admiração entre os avós.

Após esses episódios, o avô organizou uma corrida de tora. Preparou o tronco na roça, trouxe-o aos ombros e depositou-o na antiga praça da aldeia, realizando com a esposa cantos e danças rituais. Em seguida, o casal dirigiu-se ao ribeirão para se banhar, enquanto os meninos se deitaram sobre um grande tronco caído na margem. Na manhã seguinte, recusaram-se a retornar para casa, o que levou o avô a construir um jirau sobre as águas do ribeirão, de onde passou a alimentá-los diariamente.

Os meninos cresceram rapidamente, tornando-se fortes e corpulentos. Quando alcançaram o tamanho do jirau, o avô confeccionou espadas de madeira para cada um. Com essas armas, caçaram e mataram uma anta, levando-a até a entrada da casa dos avós e referindo-se a ela ironicamente como um “rato”. Surpresos com a façanha, os anciãos esquartejaram o animal e, no dia seguinte, cortaram os cabelos dos netos, preparando-os para um novo desafio.

O avô pintou e enfeitou os irmãos antes de conduzi-los ao jatobá onde Hága-ti mantinha seu ninho. No local, construiu uma pequena casa de proteção. Akréti, o mais ágil, passou a provocar o gavião, correndo para dentro da casinha sempre que era atacado, até cansar a criatura. Kenkutã, impaciente, desobedeceu às orientações do irmão e saiu ao encontro do inimigo, mas foi derrubado pela força das asas e obrigado a recuar. Ao meio-dia, enfraquecido e incapaz de voar, Hága-ti pousou no solo. Akréti aproveitou o momento e o matou com a sua espada de madeira. Os irmãos transportaram o corpo até a aldeia, onde o avô retirou suas penas, que se transformaram em pequenos pássaros. Em seguida, esquartejaram o gavião, assaram-no e consumiram sua carne.

O desafio de Kukád e a morte de Kenkutã

Outro desafio, porém, ainda os aguardava. Em uma caverna no alto de um penhasco vivia Kukád, uma ave monstruosa conhecida por decapitar pessoas em pleno voo. Os irmãos decidiram enfrentá-la, e o avô construiu uma nova casinha de proteção próxima ao penhasco. Akréti foi o primeiro a provocá-la, refugiando-se no abrigo quando a ave investiu. Kenkutã insistiu em imitá-lo, mas, ao sair, foi atingido por Kukád, que lhe decepou a cabeça. Inconformado, Akréti tentou vingar o irmão, mas a ave nunca mais deixou a caverna. 

Após colocar a cabeça de Kenkutã em uma forquilha, Akréti decidiu não retornar à casa dos avós e partiu em busca de sua tribo. No percurso, encontrou diferentes grupos que habitavam a região. Primeiro, cruzou com as seriemas, que caçavam pequenos animais incendiando o capim. Em seguida, encontrou os araras pretos, que quebravam cocos de tucum e repartiam a comida. Mais adiante, deparou-se com macacos que colhiam castanhas sapucaias. Estes lhe indicaram o caminho até sua comunidade, informando que teria de atravessar ainda três faixas de mata.

Akréti e Kapa-kwéi

Ao chegar à aguada da aldeia, Akréti escondeu-se atrás de um jatobá, de onde observou uma jovem chamada Kapa-kwéi, que descia para se banhar. Após tentativas de chamar sua atenção, revelou-se a ela como um membro sobrevivente da tribo. Sensibilizada por sua história, Kapa-kwéi concordou em unir-se a ele. Naquela noite, abriu um buraco na parede de sua casa para permitir a entrada do jovem sem ser notado. Quando as amigas vieram buscá-la para a dança da aldeia, encontraram Akréti ao seu lado. No dia seguinte, ele se apresentou formalmente à comunidade e ganhou prestígio ao caçar quatro emas, que ofereceu à sogra.

No entanto, a relação de Akréti com Kapa-kwéi terminou de forma trágica. Durante uma expedição para coletar mel, Akréti cavou um buraco em uma árvore e ordenou que Kapa-kwéi colocasse o braço para retirar os favos. Quando o braço dela ficou preso, ele aproveitou a oportunidade para assassiná-la, esquartejá-la e assar sua carne. Depois, retornou à aldeia com a carne, que foi consumida pelos demais, incluindo o irmão de Kapa-kwéi. 

No entanto, a relação de Akréti com Kapa-kwéi terminou de forma trágica. Durante uma expedição para coletar mel, Akréti pediu que Kapa-kwéi introduzisse o braço no tronco de uma árvore para retirar os favos. Quando ela ficou presa, ele a matou, desmembrou o corpo e assou sua carne, levando-a de volta para a aldeia. Ali, a refeição foi partilhada por todos, inclusive pelo irmão de Kapa-kwéi. Durante o banquete, este reconheceu a carne da irmã e denunciou o crime, embora Akréti negasse. Na manhã seguinte, o irmão seguiu os rastros do cunhado até o local do assassinato, onde encontrou a cabeça da jovem. Recolheu os restos mortais, realizou os ritos fúnebres e a sepultou.

No dia seguinte, Akréti preparava o alimento ritual chamado kupá junto com os demais, e para isso, foi acesa uma grande fogueira. Quando as chamas baixaram, as mulheres o convenceram a colocar sua porção no centro do braseiro. Enquanto estava distraído, os membros da comunidade o empurraram para dentro das brasas, queimando-o vivo. Das suas cinzas nasceu um ninho de cupins da terra, marcando o seu fim.

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25 de novembro de 2025

Pedras de Serpente (Adder Stones)

۞ ADM Sleipnir

Uma pedra de serpente é uma pedra perfurada naturalmente, tradicionalmente associada ao folclore britânico, à mitologia celta e à magia popular. É conhecida por diversos nomes, incluindo adder-bead, adder’s gem, Adderstanes, Glain Neidr, Gloine nan Druidh (“vidro dos druidas”), hag stones, Milpreve, pedra de serpente, ovos de serpente e pedras de bruxa. Estas pedras possuem significados culturais, mágicos e medicinais, sendo valorizadas por suas supostas propriedades protetoras e curativas.

As pedras de serpente são geralmente redondas e apresentam um orifício natural que atravessa o centro. Tradicionalmente, acreditava-se que elas possuíam a capacidade de neutralizar a mordida venenosa de serpentes. Além disso, quando usadas como amuletos, eram atribuídas a elas diversas propriedades, como cura da coqueluche, proteção contra feitiços e encantamentos malignos, prevenção de pesadelos, proteção contra doenças oculares e a capacidade de revelar ilusões mágicas, como encantamentos de fadas e bruxas. O naturalista romano Plínio, em sua obra História Natural, descreveu a pedra de serpente como um objeto de grande estima entre os druidas. Segundo Plínio, estas pedras eram obtidas através de rituais específicos e atribuía-se a elas poderes mágicos, incluindo proteção, sucesso em litígios e acesso a reis.

Existem duas tradições principais sobre a origem das pedras de serpente. A primeira sustenta que a pedra é formada a partir da saliva endurecida de um grande grupo de serpentes, sendo os orifícios criados pelas pontas de suas línguas. A segunda afirma que as pedras se encontram nas cabeças das serpentes e devem ser removidas manualmente. Em ambos os casos, acredita-se que uma verdadeira pedra de serpente flutua quando colocada na água, sendo considerada um sinal de autenticidade.

No folclore galês, as pedras conhecidas como Glain Neidr ou Maen Magi estão intimamente ligadas ao druidismo. Acredita-se que essas pedras sejam criadas por um congresso de cobras, normalmente na primavera, sendo mais auspiciosas na véspera de maio. Elas aparecem em várias narrativas do Mabinogion, um conjunto de histórias do ciclo arturiano, em que pedras mágicas permitem aos heróis ver e interagir com criaturas invisíveis ou escapar de situações perigosas.

No folclore russo, as pedras de serpente eram consideradas moradas de espíritos chamados Kurinyi Bog (“Deus Galinha”), protetores das galinhas. As pedras eram colocadas nos pátios das fazendas para afastar a ação maléfica de Kikimoras, espíritos femininos que podiam causar doenças ou sofrimento às aves indesejadas.

Em Hastings, na Inglaterra, uma lenda local relata que a cidade está sob a Maldição de Crowley, supostamente conjurada por Aleister Crowley. Acreditava-se que a maldição obrigava qualquer pessoa que vivesse em Hastings a sempre retornar, independentemente da distância ou do tempo. Para quebrar o feitiço, seria necessário levar uma pedra de serpente com um orifício da praia de Hastings.


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24 de novembro de 2025

Lapulapu

۞ ADM Sleipnir

Arte de poyjeeee

Lapulapu (c. 1450–1542), também grafado como Lapu-Lapu, foi um datu (governante/chefe) da ilha de Mactan, nas Filipinas. Ele é reconhecido como o primeiro herói nacional filipino, devido à sua resistência contra a colonização espanhola.​ Ao derrotar o navegador Fernão de Magalhães em 1521, Lapulapu atrasou por mais de quarenta anos o avanço da colonização espanhola no arquipélago.

Etimologia do nome

O registro mais antigo de seu nome aparece no diário do veneziano Antonio Pigafetta, cronista da expedição de Magalhães, que menciona os dois datus de Mactan: Zula e Çilapulapu (c. 1524). Ao longo dos séculos, diversas grafias surgiram. Em 1890, José Rizal registrou “Si Lapulapu” em sua edição de Sucesos de las Islas Filipinas. Em línguas filipinas, si é um marcador de nomes próprios, mas há debate se o “Si/Çi” anotado por Pigafetta tinha esse sentido ou se era um título honorífico derivado do sânscrito Sri.

Outras variantes históricas incluem Calipulapo (1604), Cali Pulaco (1614) e Kalipulako (pseudônimo usado pelo revolucionário Mariano Ponce). Em 2019, a Comissão Histórica Nacional das Filipinas estabeleceu Lapulapu como a grafia oficial. Já a crônica Aginid, Bayok sa Atong Tawarik (1952), cuja historicidade é debatida, chama o chefe de Lapulapu Dimantag (“inatingível por lâmina”), sobrenome ainda encontrado em famílias de Mactan.

Lapu Lapu (Mobile Legends: Bang Bang)

Origens

As origens de Lapulapu permanecem controversas. Segundo a tradição oral, os cebuanos de Opong (antigo nome de Mactan) eram governados pelo rajá Mangal, sucedido por seu filho Lapulapu. O Aginid, Bayok sa Atong Tawarik apresenta outra narrativa: o reino de Cebu teria sido fundado por Sri Lumay, um príncipe de origem tâmil-malaia famoso por resistir a invasores de Mindanao. Seu filho Sri Bantug o sucedeu, seguido por Rajah Humabon, sob cujo governo Cebu prosperou comercialmente. Nesse relato, Lapulapu teria vindo de Bornéu e solicitado a Humabon um território para se estabelecer, recebendo as regiões de Mandawili e Opong. Apesar do início amistoso, as relações se deterioraram quando Lapulapu passou a praticar pirataria contra embarcações locais, prejudicando o comércio de Cebu. O nome Mactan possivelmente deriva de mangatang (“assaltantes”).

O historiador William Henry Scott, entretanto, argumenta que Lapulapu provavelmente era nativo de Mactan, e que o conflito com Magalhães foi resultado de um mal-entendido: o explorador português presumiu que Humabon governava toda a região, quando na realidade os datus visayanos eram autônomos.

A Batalha de Mactan

Quando Magalhães chegou às Filipinas, em 1521, Lapulapu era um dos dois datus de Mactan. Enquanto Zula aceitou pagar tributo aos espanhóis, Lapulapu recusou-se e desafiaram o explorador. 

Na madrugada de 27 de abril de 1521, Magalhães avançou com cerca de 60 espanhóis e entre 20 e 30 barcos de guerreiros aliados de Humabon. Os recifes impediram um desembarque próximo, obrigando-os a marchar pela água até a praia. Pigafetta relata que enfrentaram cerca de 1.500 guerreiros armados com kampilan (espadas tradicionais), escudos, arcos e lanças de bambu.

Convencido da superioridade das armas europeias, Magalhães manteve os guerreiros de Humabon nos barcos e avançou com apenas 49 homens. Contudo, canhões e mosquetes foram inúteis devido à distância. Durante o combate, Magalhães foi ferido por uma flecha envenenada e, ao ordenar a retirada, foi abandonado por parte de seus próprios homens. Os guerreiros de Lapulapu o cercaram e o mataram, junto com vários espanhóis.

A tradição filipina frequentemente retrata Lapulapu matando Magalhães em duelo, mas Pigafetta não confirma isso. É possível que Lapulapu — já idoso — tenha comandado a batalha à distância. O Aginid, Bayok sa Atong Tawarik afirma ainda que Humabon incentivou o ataque para eliminar seu adversário político e, posteriormente, teria envenenado 27 espanhóis em um banquete, possivelmente em retaliação.

Religião e crenças de Lapulapu

As crenças religiosas de Lapulapu são outro tema de debate histórico. Contudo, há fortes indícios de que Lapulapu praticava o animismo visayano (anito), religião tradicional dos povos de Cebu. Algumas tradições tardias o descrevem como muçulmano, mas historiadores rejeitam essa interpretação: a região não era islamizada, e Pigafetta relata práticas nitidamente animistas, como tatuagens rituais, consumo de carne de porco e vinho de palma — todos proibidos no Islã. O deus supremo visayano era Abba ou Kan-Laon, equivalente ao Bathala dos tagalo.

Legado

Reconhecimento nacional

Em 2017, o presidente filipino Rodrigo Duterte instituiu o dia 27 de abril como Dia de Lapulapu, feriado nacional especial. Em 2023, a província canadense da Colúmbia Britânica também passou a adotar oficialmente a data.

Ordem de Lapulapu

Em 7 de abril de 2017, Duterte assinou o Decreto Executivo nº 17, criando a Ordem de Lapulapu, que homenageia cidadãos e servidores por serviços extraordinários. Inicialmente composta por três medalhas (Kamagi, Kalasag e Kampilan), foi ampliada com a Medalha Magalong. Os 44 comandos do SAF mortos em Mamasapano (2015) receberam a condecoração postumamente em 2018.

Monumentos e comemorações

O Santuário de Mactan, estabelecido em 1969, abriga uma estátua de bronze de 6 metros de Lapulapu (1981) e o Monumento de Magalhães (1866). A primeira estátua de Lapulapu, de 1933, segurava uma besta apontada para a prefeitura; após três prefeitos morrerem de ataque cardíaco, a arma foi substituída por uma espada em 1938.

O festival Kadaugan sa Mactan (“Vitória em Mactan”), celebrado anualmente em 27 de abril, apresenta reencenações da batalha com praticantes de eskrima (arte marcial filipina). Em 2024, mais de 8 mil pessoas assistiram ao evento.

Em 2021, o Banco Central das Filipinas lançou uma cédula comemorativa de 5.000 pesos dedicada ao herói. A figura de Lapulapu aparece ainda nos selos da Polícia Nacional e do Corpo de Bombeiros. A cidade de Opon foi renomeada Cidade de Lapu-Lapu em 1961.

Vigia dos mares

Além do reconhecimento oficial, Lapulapu vive na imaginação popular através de várias lendas. Uma lenda local afirma que Lapulapu nunca morreu, mas foi transformado em pedra e continua vigiando os mares de Mactan. Pescadores de Mactan jogam moedas em uma rocha com forma humana para "pedir permissão" a Lapulapu para pescar em "suas águas".​

Cultura Popular

Lapulapu foi retratado e homenageado em diferentes obras de cinema, televisão, música, literatura e mídia digital ao longo das décadas, o que consolidou seu lugar como uma das figuras culturais mais icônicas das Filipinas.

No cinema, uma das primeiras representações de Lapulapu foi feita pelo ator Mario Montenegro, em 1955, conhecido por interpretar heróis históricos filipinos. Depois, em 2002, Lito Lapid voltou a dar vida ao personagem em uma nova adaptação, e, em 2010, Aljur Abrenica interpretou Lapulapu no videoclipe oficial de Lupang Hinirang produzido pela GMA Network. Em 2019, Zeus Collins fez uma homenagem bem-humorada no filme The Mall, The Merrier, onde Lapulapu aparece como uma das estátuas do fictício Tamol Mall. Mais recentemente, Armando Alera assumiu o papel na série Boundless (2022), e Michael Copon interpretou o herói no filme 1521 (2023), focado justamente na batalha histórica.

Na televisão, Lapulapu também ganhou espaço. Em 1995, Calvin Millado interpretou o líder de Mactan no programa infantil Bayani, ajudando a aproximar o público jovem da história do país.

A música também contribuiu para manter viva sua memória. Em Otso Otso (2004), Bayani Agbayani menciona Lapulapu em uma rima infantil que o contrapõe a Fernão de Magalhães, relembrando a Batalha de Mactan. Por outro lado, a música Panalo, de Ez Mil, gerou polêmica ao afirmar que Lapulapu foi decapitado durante o confronto — um erro histórico criticado tanto pelo governo da cidade de Lapu-Lapu quanto pela Comissão Histórica Nacional das Filipinas.

Na literatura, o romancista kuwaitiano Saod Alsanousi inclui Lapulapu em seu premiado romance O Caule de Bambu. Na história, o protagonista José/Issa vê o herói filipino como um símbolo de resistência islâmica, oferecendo uma leitura que extrapola fronteiras culturais e históricas. 

Nos jogos digitais, Lapulapu também ganhou versões próprias. No popular Mobile Legends: Bang Bang, ele aparece como um herói jogável que utiliza duas armas e alterna entre estilos de luta. A lore do jogo o apresenta como chefe de Makadan (identificado como Parlas, uma sublocalidade da ilha fictícia Vonetis), uma referência direta à histórica Mactan. Ele também aparece em Honor of Kings como Guardião da Pátria e datu de Nectam, um reino inspirado nas Filipinas. Nessa adaptação, o personagem possui habilidades que remetem à sua lenda, incluindo uma arma que pode ser arremessada e recuperada, além de poderes sobrenaturais adquiridos ao custo de se transformar gradualmente em pedra — referência a um mito filipino sobre sua figura.

Lapu Lapu (Honor of Kings)

Uma abordagem cinematográfica mais recente surge em Magellan (2025), dirigido por Lav Diaz. O filme apresenta uma visão polêmica ao retratar Lapulapu como uma figura mitológica criada por Rajah Humabon, contrariando a visão historiográfica tradicional, que o reconhece como um líder histórico real e independente.

Considerações finais

Apesar de sua fama como primeiro herói nacional das Filipinas, pouco se sabe com certeza sobre Lapulapu. Suas datas exatas de nascimento e morte, sua linhagem e até sua aparência permanecem desconhecidas. Pigafetta é a única fonte primária confiável, e nenhum europeu contemporâneo descreveu sua voz, feições ou confirmou sua presença direta em combate. Mesmo assim, Lapulapu tornou-se um símbolo duradouro de identidade e resistência — uma figura que ultrapassa os limites da historiografia para encarnar o ideal filipino de liberdade e autodeterminação.


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23 de novembro de 2025

Ajaju

۞ ADM Sleipnir

Ajaju é uma criatura lendária do folclore do povo Garo, que habita a região de Achik Asong e Dura Hill, nas Colinas Garo, estado de Meghalaia, na Índia Oriental. Essa criatura carnívora é temida nas antigas histórias garo e, por muito tempo, foi considerada o terror das florestas da região. Hoje em dia, dizem que é quase impossível encontrar um exemplar dessa espécie misteriosa.

Um Ajaju é descrito como uma criatura de aparência híbrida e assustadora. Seu corpo lembra o de um camaleão, embora alguns relatos afirmem que possa ter uma cabeça humana em vez de reptiliana. Suas pernas longas e sem joelhos são uma de suas características mais marcantes — rígidas e lisas como varas de bambu sem nós, o que lhe confere uma aparência bizarra e inumana. A criatura possui ainda doze línguas longas, afiadas e bifurcadas, extremamente flexíveis. São essas línguas que o Ajaju usa para atacar suas presas, lambendo-lhes a carne e o sangue até não restar nada além dos ossos, que o monstro cospe com repulsa.

Apesar de sua aparência desajeitada, o Ajaju é um excelente escalador. Nas árvores, ele se move com agilidade, balançando-se de galho em galho com facilidade. No solo, porém, seu movimento é muito mais lento e difícil. Por causa disso, ele é incapaz de perseguir alguém que fuja ladeira abaixo, mas qualquer um que tente escapar subindo um morro é rapidamente alcançado por suas línguas em forma de foice, sendo capturado e devorado.

Arte de @chimeride

Para atrair suas presas, o Ajaju emite um grito agudo e penetrante, que soa como “wa-o, wa-o, wa-o”. Quando alguém responde, acreditando tratar-se de uma voz humana, a criatura repete o chamado, aproximando-se cada vez mais a cada eco. Por isso, entre os Garo, há um aviso tradicional: quem se aventurar em território de Ajaju deve chamar em voz alta e aguda. Se ouvir resposta, deve permanecer em silêncio e fugir o mais rápido possível, pois o monstro estará por perto.

As partes do corpo de um Ajaju possuem grande valor medicinal e ritualístico, sendo até usadas em práticas de ressurreição. Segundo antigas narrativas garo, quando o patriarca Urengsi Urengmal perdeu sua esposa, Gajing Gare, afogada após um trágico mal-entendido, ele decidiu trazê-la de volta à vida. Com a ajuda de um sábio, Urengsi recolheu os ossos da esposa, mas como alguns estavam faltando, usou ossos de um cervo-ladrador e fragmentos de um ajaju para completar o corpo antes de levá-lo ao xamã Mehgam Dalgipa, que a recriou por meio de antigos rituais.

Arte de @dllecky


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22 de novembro de 2025

Crocodingo

۞ ADM Sleipnir


O Crocodingo é um suposto criptídeo originário do folclore de Scott County, no estado do Tennessee, Estados Unidos. Segundo relatos, a criatura habitaria principalmente os arredores da cidade de Oneida, situada na região montanhosa do Plateau de Cumberland, próxima à fronteira com o Kentucky. A criatura é descrita como um animal quadrúpede de porte médio, com o corpo de um dingo (uma espécie de canídeo selvagem) e a cabeça de um crocodilo. Muitos relatos mencionam um odor forte e nauseante e sons agudos e metálicos emitidos por ela.

Origem

A origem da lenda remonta ao século XIX, embora suas bases exatas sejam incertas. O relato mais antigo conhecido é o do morador Hank Lemon, datado de 31 de julho de 1839, na área hoje conhecida como Huntsville, próxima a Oneida. Lemon afirmou ter visto uma luz verde brilhante cruzando o céu antes de cair sobre a floresta, seguida pela aparição de um animal “horrivelmente alienígena” — um cão com cabeça de crocodilo. O episódio foi posteriormente interpretado por moradores como a possível queda de uma criatura de origem extraterrestre, associada a relatos subsequentes de luzes verdes no céu da região.

O nome “Crocodingo” teria sido cunhado décadas depois, no fim do século XIX, por Curiel Allan Brown, um morador do vale do rio New River, também em Scott County. Acredita-se que Brown tenha criado o termo como uma combinação bem-humorada de crocodile e dingo, inspirada nas histórias de seu pai, um imigrante australiano. Antes disso, a criatura era conhecida localmente como “Haint Dog” (“Cão Assombrado”).


Avistamentos

Relatos de avistamentos do Crocodingo foram registrados de forma esparsa entre o século XIX e o início do século XXI. Entre 1856 e 1860, pescadores do rio New River afirmavam ver a criatura alimentando-se de peixes, chegando a deixar oferendas nas margens para apaziguá-la.

Durante a Guerra Civil Americana, soldados confederados que atravessavam a região — predominantemente simpatizante da União — relataram encontros com o ser. O relato mais conhecido, feito em 1863 pelo soldado Roger Owens, descreve o Crocodingo vigiando o corpo de um homem desfigurado. Rastros de sangue foram encontrados no local, mas o corpo nunca foi recuperado. Com o avanço da colonização e das obras de infraestrutura na região, novos relatos surgiram entre trabalhadores ferroviários e operários. Algumas histórias populares mencionam trilhos de trem encontrados partidos ao meio, supostamente com marcas de mordidas.

O auge dos relatos ocorreu em 1925, após a instalação do sistema de esgoto de Oneida. Moradores relataram sons estranhos vindos dos bueiros, especialmente após chuvas fortes. Em 1943, o funcionário Jack Bannister declarou ter visto um animal semelhante a um cão empurrar a tampa de um bueiro e deslizar para dentro.

O último avistamento amplamente divulgado ocorreu em 16 de junho de 2012, quando dois trabalhadores de um cinema em Oneida afirmaram ter visto uma criatura emergindo de um bueiro antes de desaparecer. Mesmo sem novas evidências, relatos de sons não identificados e movimentações subterrâneas ainda são mencionados por moradores da cidade.

Interpretações e teorias

As explicações sobre o Crocodingo costumam se dividir entre interpretações sobrenaturais, folclóricas e céticas. Alguns acreditam que a criatura seria um metamorfo, ou skin-walker, um ser preso entre formas humanas e animais, incapaz de assumir uma aparência estável.  Outros associam o Crocodingo à lendária Bruxa Bell (Bell Witch), figura central do folclore do Tennessee, que também teria se manifestado sob forma híbrida. Essa ligação se estende ao local conhecido como “Túmulo da Bruxa” (Witch’s Grave), um marco assombrado da região, onde há relatos de aparições de uma mulher alta e de cabelos negros, vista como possível manifestação do mesmo fenômeno.

Por outro lado, pesquisadores locais, como Gregory Lay, sustentam que os avistamentos do Crocodingo resultam de confusões com cães ou coiotes, amplificadas pela imaginação popular. Para Lay e outros céticos, a criatura é fruto da histeria coletiva e da tradição oral típica das pequenas comunidades do leste do Tennessee, onde mitos regionais se misturam a relatos de experiências pessoais.

Arte de shadyufo

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20 de novembro de 2025

Usilosimapundu

۞ ADM Sleipnir

Usilosimapundu (também conhecido por variações como Ugungqu-kubantwana ou Ugunqu-kubantwana) é uma criatura mitológica da tradição oral xhosa, povo de origem bantu que habita principalmente a região sul da atual África do Sul. A criatura representa uma força primitiva da natureza e é retratada em contos como um ser colossal que incorpora elementos da paisagem e causa desastres naturais. Seu nome pode ser traduzido como “a besta rugosa” ou “a besta nodulada”.

Aparência

Usilosimapundu é descrito como um ser de proporções imensas, comparável a um continente ambulante. Em seu corpo existem colinas, montanhas, rios, florestas, planaltos e penhascos. Seu tamanho é tal que em uma extremidade é inverno, enquanto na outra é verão. Sua cabeça se assemelha a uma enorme rocha, com olhos e uma vasta boca vermelha. Como outras criaturas gigantes na mitologia africana, ele é um devorador, mas também simboliza catástrofes naturais como terremotos e deslizamentos. A seu serviço estão duas árvores colossais chamadas Imidoni, que podem desprender folhas que tomam forma humana para executar ordens em seu nome.

Ugungqu-kubantwana

Usilosimapundu possui uma contraparte feminina chamada Ugungqu-kubantwana, descrita como a mãe dos animais. Seu nome imita o som que ela faz ao se mover — gungqu, gungqu — semelhante ao barulho de uma carroça pesada passando por um caminho irregular.

A lenda de Umkxakaza

Segundo a versão mais conhecida da lenda, a princesa-feiticeira Umkxakaza-wakogingqwayo (cujo nome significa “Rangedeira de armas do lugar onde rolam os mortos”) foi prometida em casamento com muitos rebanhos como dote. Os melhores animais, no entanto, pertenciam a Usilosimapundu. Embora o monstro tenha advertido que os levassem por sua conta e risco, os soldados do rei os tomaram à força.

Com o passar dos anos, a ameaça foi esquecida — até o dia em que a terra tremeu, e Usilosimapundu surgiu à porta de Umkxakaza. Duas folhas das Imidoni tomaram forma humana e forçaram a princesa a preparar comida para ele. O monstro devorou tudo em seu caminho e, por fim, levou Umkxakaza consigo, transportando-a em suas costas.

O rei enviou exércitos para resgatar sua filha, mas nenhuma arma foi eficaz contra o gigante, pois os projéteis apenas atingiam pedras, árvores e lagos. Apenas a rainha seguiu o monstro por um tempo, sendo alimentada com milho e cana-de-açúcar, mas por fim desistiu. Em lágrimas, beijou a filha e despediu-se.

Usilosimapundu levou Umkxakaza até uma caverna mobiliada e declarou: 

“Seu pai me prejudicou ao tomar meu gado”, disse ele, “então agora eu o prejudiquei. Ele nunca mais verá você.”

Depois disso, Usilosimapundu desapareceu. Mais tarde, no entanto, Umkxakaza foi capturada pelos Amadhlungundhlebe — seres meio-humanos que pretendiam devorá-la. A princesa escapou ao invocar uma tempestade e retornou à cidade de seu pai, onde foi recebida com alegria e celebração.

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19 de novembro de 2025

Ururau da Lapa

۞ ADM Sleipnir

O Ururau da Lapa é uma criatura lendária do folclore fluminense, especialmente associada ao município de Campos dos Goytacazes, no Norte do Rio de Janeiro. É descrito como um jacaré colossal, de couraça extremamente resistente e olhos luminosos visíveis à noite sob a lâmina d’água. A etimologia do termo “Ururau” é incerta, embora frequentemente relacionada a expressões indígenas que designariam um “grande jacaré-de-papo-amarelo”.

O Ururau é associado a ataques contra embarcações, ao desaparecimento de animais e à capacidade de sumir nos trechos profundos do rio Paraíba do Sul, da Lagoa de Cima e de outras áreas pantanosas. Sua lenda se desenvolveu em uma área historicamente habitada pelos Goitacá, povo indígena conhecido por sua habilidade na caça, no manejo de grandes arcos e na navegação por ambientes alagadiços. A geografia campista — marcada por brejos, lagoas e cursos d’água — favoreceu o surgimento de relatos sobre jacarés de grande porte, cenário no qual o mito do Ururau se consolidou entre os séculos XVIII e XIX, acompanhando a expansão rural e açucareira da região.

Lendas

Uma das lendas mais difundidas sobre o Ururau o interpreta como o resultado de uma metamorfose espiritual. Segundo essa versão, um jovem humilde mantinha encontros secretos com a filha de um latifundiário local. Descoberto e morto a tiros, seu corpo foi lançado ao Paraíba do Sul diante da Igreja da Lapa. As águas turbulentas teriam envolvido o cadáver e, por intervenção sobrenatural, transformado-o em um jacaré gigantesco, dotado de força e couraça impenetrável. A criatura, movida pela dor e pela busca da amada — que, em algumas variantes, foi enclausurada em um convento e teria morrido pouco depois — perambula pelas águas como um espírito vingador.

Outra lenda liga o Ururau ao transporte do sino destinado à Igreja da Lapa. Durante a travessia do rio, o jacaré teria atacado a embarcação, afundando-a junto com o sino. Em certas versões, o peso do objeto aprisiona o Ururau nas profundezas do Paraíba do Sul; em outras, o sino converte-se em sua morada, ressoando de tempos em tempos sob a água como sinal de sua presença.

O Arurau

Existem registros de uma criatura semelhante na Lagoa Feia, conhecida como Arurau, documentada em 2024 pela cineasta Carolina de Cássia após entrevistas com moradores da comunidade de Muxuango. O Arurau é descrito como um jacaré antigo e de grande porte que engoliria sombras e reflexos sobre a água. Embora possua características próximas às do Ururau, é tratado na tradição popular como uma entidade distinta, representando outro aspecto da relação entre a região e seus ambientes alagadiços.

Cultura Popular

A lenda do Ururau foi registrada por Luís da Câmara Cascudo na década de 1950 e, desde então, passou a figurar com regularidade em narrativas literárias, estudos folclóricos e reportagens regionais. Em 1976, recebeu uma adaptação em prosa e cordel por Osório Peixoto, e, em 1979, deu nome ao Grêmio Recreativo Escola de Samba Ururau da Lapa, marco de sua incorporação à cultura popular campista.

GRES Ururau da Lapa


O mito ganhou nova projeção em 2005 com a peça Auto do Ururau, dirigida por José Sisneiros, laureada com o Prêmio Shell. Em 2014 e 2016, sua figura foi reintroduzida no cenário literário infantojuvenil por meio de obras de Sylvia Paes e Carmen Eugênia Sampaio Gome("Ururau Pançudo", 2014) e Roberta Givigi ( "Ururau da Lapa (Assim me disseram)", 2016). Também em 2016, recebeu representação iconográfica em grafite no dique do rio Paraíba do Sul.

Em 2025, a criatura voltou a ganhar destaque ao ser transformada em tema de um jogo de cartas (Ururau: o Jogo) e de uma história em quadrinhos, desenvolvidos por Vinícius Soares Freixo e João Paulo Miranda.



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Ruby