28 de outubro de 2024

A Epopéia de Gilgamesh - Tábua VI

 ۞ ADM Sleipnir

Arte de MarmaduX para o moba SMITE


TÁBUA VI

Terminado o combate, Gilgamesh começa a se enfeitar. A deusa Ishtar, admirada com a beleza do herói, se oferece a ele. Gilgamesh a rejeita, repreendendo-a pelo que fez a seus numerosos amantes. Enfurecida, a deusa sobe aos céus, queixa-se a seu pai Anu e pede a criação de um "touro celeste" para aniquilar Gilgamesh. Anu concorda, mas com a condição de que sua filha, deusa da fertilidade, faça prosperar as colheitas e os rebanhos durante sete anos. Centenas de homens valentes tentam resistir ao monstro, que os dispersa apenas com seu sopro. Finalmente, o touro é abatido por Enkidu. Ishtar lamenta-se nas muralhas de Uruk. Enkidu arranca partes do touro e as lança contra a cabeça de Ishtar.

 

(Texto assírio)

(Depois do combate)

Gilgamesh limpou suas armas, fez com que brilhassem,
soltou a cabeleira sobre os ombros,
tirou suas vestes manchadas na luta,
colocou outras limpas e ajustou a túnica.
Depois cobriu a cabeça com a tiara.
A grande deusa Ishtar fixou os olhos na grande beleza de
Gilgamesh:
“Ei, Gilgamesh, seja meu amante,
concede-me o dom do teu amor!
Serás meu esposo e eu serei tua esposa;
mandarei preparar para ti uma carruagem adornada de lápis-lazúli e ouro:
suas rodas são de ouro e os aros de eletrum;
todos os dias atrelarás a ela grandes cavalos.
Entrarás em nossa casa sob a fragrância dos cedros.
Quando entrares em nossa casa,
aqueles que estão sentados nos tronos beijarão teus pés,
os reis, os príncipes e os senhores se inclinarão diante de ti;
os montanheses e as gentes da planície te oferecerão seus tributos;
tuas cabras serão férteis e tuas ovelhas darão gêmeos;
teu jumento carregará mais que tua mula;
teus cavalos de corrida serão famosos
e teus bois, sob o jugo, não terão rivais”.

Gilgamesh abriu a boca e disse
estas palavras à divina Ishtar:
“E o que eu teria que te dar se me casasse contigo?
Deveria dar-te óleo para ungir teu corpo e roupas,
pão e víveres?
…alimento para tua divindade,
…bebida apropriada para tua realeza?
O que ganharia eu casando contigo?
Tu não passas de uma ruína que não dá abrigo,
uma porta que não resiste à tempestade,
um palácio que os heróis saquearam,
uma armadilha mal disfarçada,
uma mancha que suja quem a toca,
um odre cheio de água que molha quem o carrega,
um pedaço de cal que se desprende do muro,
um amuleto incapaz de proteger em país inimigo,
uma sandália que faz tropeçar quem a calça.
A qual amante foste fiel?
Qual dos teus pastores sempre te agradou?
Aproxime-se! Vou ler-te a interminável lista de teus amantes.
Dumuzi, o amante da tua juventude,
foi, ano após ano, alvo de tuas torturas.
Amaste o Pássaro-pastor de penas coloridas
e lhe quebraste uma asa,
e agora ele grita: ‘Minha asa!’, na floresta.
Amaste o Leão admirável e forte,
mas fizeste cavar para ele sete vezes sete armadilhas.
Amaste o Garanhão que se exalta na batalha,
mas o submeteste a rédeas, esporas e chicote,
destinaste-o a galopar catorze horas diárias
e deste-lhe água lodosa para beber.
E para sua mãe, a divina Silili, foste motivo de lamento.
Amaste o pastor
que sem cessar queimava incenso para ti
e a cada dia te sacrificava cabritos,
mas o golpeaste e o transformaste em chacal,
e agora seus próprios jovens o perseguem
e seus cães rasgam sua pele.
Amaste Ishullanu, o jardineiro de teu pai,
que te trazia cestos de tâmaras
e a cada dia adornava tua mesa.
Tu o olhaste e, aproximando-te, disseste-lhe:
‘Ó meu Ishullanu, deixa que sinta tua força,
estende tua mão e acaricia-me!’
Ishullanu te respondeu:
‘O que desejas de mim?
Acaso minha mãe não cozinhou, não comi eu,
para que tenha que recorrer aos alimentos
de opróbrio e maldição que me ofereces?
E, contra o frio, acaso não me bastam as canas como abrigo?’
Ao ouvir estas palavras, Ishtar,
tu golpeaste Ishullanu, o transformaste em uma aranha
e o colocaste no meio das ruínas,
onde não pode nem subir nem descer.
Teu amor faria comigo o que fizeste com eles!”

Ao ouvir Ishtar estas palavras
enfureceu-se e subiu ao céu.
A deusa Ishtar foi ver o deus Anu, seu pai,
e a deusa Antu, sua mãe, e disse:
“Meu pai, Gilgamesh me encheu de insultos.
Gilgamesh lançou em meu rosto minhas depravações,
minhas depravações e meus feitiços.”
O deus Anu tomou a palavra e disse
à divina princesa Ishtar:
“Certamente pediste o amor dele,
e ele enumerou tuas depravações,
tuas depravações e teus feitiços.”
A deusa Ishtar tomou a palavra e falou
dessa maneira ao deus Anu, seu pai:
“Ó, meu pai, cria um Touro Celestial
para que Gilgamesh saiba o que é o medo!
Se não criares para mim o Touro Celestial,
quebrarei as portas do mundo subterrâneo
e o número dos mortos ultrapassará o dos vivos.”
O deus Anu tomou a palavra e disse
assim à divina princesa Ishtar:
“Se eu atender ao que me pedes,
haverá sete anos de vagens vazias.
Acumulaste grãos para o povo,
amontoaste forragem para os animais?”
A deusa Ishtar tomou a palavra e respondeu
assim ao deus Anu, seu pai:
"Armazenei grãos para o povo
e haverá provisão de forragem para os animais,
caso a terra fique estéril durante sete anos."

(Alguns versos truncados. No entanto, deduz-se que Anu concede criar o Touro Celestial, o qual mata centenas de homens com dois ou três bufos.)

Enkidu agarrou o Touro Celestial pelos chifres.
O Touro Celestial espumou sobre o rosto do herói,
golpeou-o com sua grande cauda.
Então Enkidu abriu a boca
e disse a Gilgamesh:
"Amigo meu, vencemos..."

(Faltam cerca de 15 versos)

Entre a cerviz e os chifres, cravou sua espada.
Com o Touro Celestial morto, arrancaram seu coração
e o ofereceram ao deus Shamash.
Em seguida, sentaram-se, como dois irmãos.
Então a deusa Ishtar subiu à muralha de Uruk,
subiu até as ameias e lançou sua maldição:
"Maldito seja Gilgamesh, por ter me insultado
matando o Touro Celestial!"
Quando Enkidu ouviu estas palavras de Ishtar,
arrancou as partes do Touro Celestial e as atirou ao rosto dela,
dizendo:
"Se eu te pegar, farei contigo
o que fiz com o touro. E pendurarei suas entranhas
em teu pescoço, como uma guirlanda."
A deusa Ishtar chamou as hieródulas do templo,
e sobre as partes do touro todas lamentaram.
Mas Gilgamesh convocou todos os artesãos
para que admirassem o tamanho dos dois chifres,
que formavam uma massa de trinta minas de lápis-lazúli
e cuja cavidade tinha uma largura de dois dedos.
Seis medidas de óleo, o que cabia em cada um deles,
ofereceu Gilgamesh a seu deus, Lugalbanda;
ele ofereceu os dois chifres, como vasos de unguento,
que pendurou no templo da divindade.
Depois, os dois amigos purificaram suas mãos no Eufrates
e puseram-se novamente a caminho,
atravessando a grande rua de Uruk.
Ao passar, todos os observavam.
Então Gilgamesh disse aos servos de seu palácio:
"Quem é o soberano entre os heróis?
Quem é o mais glorioso entre os homens?"
"Gilgamesh é o soberano entre os heróis!
Gilgamesh é o mais glorioso dos homens!"

(Lacuna)

Gilgamesh deu uma festa em seu palácio.
Quando os heróis dormiam em seus leitos, à noite,
Enkidu teve um sonho.
Ao levantar-se, contou ao amigo o que havia sonhado:
"Por que os grandes deuses do céu estão em conselho?"



FIM DA TÁBUA VI

TÁBUA VII EM BREVE

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