19 de junho de 2023

A Jornada ao Oeste: Capitulo VII

۞ ADM Sleipnir

Arte de Moyi Zhang


CAPÍTULO VII:

A FUGA DO GRANDE SÁBIO DO BRASEIRO DOS OITO TRIGRAMAS. O INTELIGENTE MACACO ENCONTRA SOSSEGO SOB A MONTANHA DOS CINCO ELEMENTOS.

A astúcia sempre deve ser evitada, pois a fortuna e a fama são predeterminadas com antecedência. A verdade e uma obra correta são produtos da virtude e às vezes atingem a idade do próprio cosmos. A arrogância, ao contrário, atrai a ira do Céu. O que importa é que sua reação parece demorar, mas sempre acaba acontecendo. Sua implacabilidade é tão certa quanto a vingança. Se perguntássemos ao Senhor do Oriente porque existem tantas tribulações e dores, ele responderia que porque o orgulho não encontra limites às suas ambições e, desta forma, subverte a ordem do mundo e zomba da Lei.

Falávamos sobre como o Grande Sábio, Sósia do Céu, foi levado pelos guardas celestiais ao quartel de execução de monstros, onde foi amarrado a uma coluna que servia justamente para torturá-los. Lá eles o cortaram com uma cimitarra, o golpearam com um machado, o atravessaram com uma lança e o estocaram com uma espada, mas falharam em causar-lhe um único dano sequer. 

Vendo que o aço nada poderia fazer contra ele, o Espírito do Polo Sul pediu aos deuses da Seção do Fogo que o reduzissem a cinzas, mas, apesar de seus esforços, não obtiveram melhores resultados. As divindades da Seção do Trovão foram então ordenadas a lançar seus raios contra ele, mas nem um único fio de cabelo dele foi chamuscado. 

Desesperados, os guardas e o demônio Mahabali correram para relatar ao Imperador de Jade, dizendo:

— Sua Majestade, não sabemos onde este Grande Sábio adquiriu tal poder para proteger seu corpo. O fato é que o cortamos com uma cimitarra, o golpeamos com um machado, o lançamos ao fogo e o submetemos ao castigo dos raios, mas não conseguimos destruir um único fio de cabelo dele. O que faremos?

— Este é certamente um problema muito difícil de resolver! — exclamou o Imperador de Jade, visivelmente preocupado. — Que medidas podem ser tomadas contra uma criatura dessa espécie?

Lao-tzu então se aproximou dele e disse:

— Era de se esperar que isso acontecesse. Afinal, aquele macaco comeu os pêssegos da imortalidade e bebeu todo o vinho imperial. Ele também roubou o elixir dourado, do qual tomou cinco cabaças, tanto cruas como cozidas. Provavelmente tudo isso foi refinado em seu estômago pelo fogo do Samadhi (1), formando uma única massa. Sendo posteriormente digerido e assimilado por seu organismo, ela adquiriu uma constituição adamantina, que não pode ser facilmente destruída. O mais aconselhável, então, neste caso, é que me permita levá-lo e colocá-lo no Braseiro dos Oito Triagramas, onde o submeterei a todo tipo de fogo. Isso fará com que ele destile o elixir que carrega dentro de si, e seu corpo poderá então ser reduzido a cinzas e fundido como um simples pedaço de metal.

Assim que o Imperador de Jade ouviu isso, ele ordenou aos Seis Deuses das Trevas e aos Seis Deuses da Luz que libertassem o prisioneiro e o entregassem a Lao-tzu, que imediatamente se retirou para satisfazer os desejos imperiais. O respeitável sábio Erlang Shen, por sua vez, foi recompensado com cem botões de ouro, cem garrafas de vinho celestial, dez dúzias de pílulas de elixir e um grande número de tesouros inestimáveis, como as mais finas pérolas e bordados delicados, os quais ele compartilhou generosamente com seus irmãos.


Depois de expressar sua profunda gratidão, o Mestre Imortal voltou para a foz do Rio das Libações, então não falaremos mais dele por enquanto.

Assim que chegou ao Palácio Tushita, Lao-Tzu desamarrou o Grande Sábio, retirou a faca que estava cravada em seu esterno e o obrigou a entrar no Braseiro dos Oito Trigramas. Dirigiu-se então aos servos que cuidavam dele e ao jovem encarregado de manter viva a chama e ordenou-lhes que fizessem uma fogueira gigantesca para iniciar o processo de fusão. 

No interior do braseiro haviam oito compartimentos que correspondiam exatamente aos oito trigramas: Chien (céu), Kun (terra), Kan (água), Li (fogo), Sun (vento), Chen (trovão), Tui (lago) e Ken (montanha). Astuciosamente, o Grande Sábio entrou no compartimento correspondente ao trigrama do vento, e dessa forma, o fogo não pode consumi-lo, embora tenha produzido uma densa fumaça que deixou seus olhos vermelhos. Por isso, às vezes eles são chamados de "Olhos de Fogo" e "Pupilas de Diamante".


O tempo passou e, sem que ninguém percebesse, chegou o quadragésimo nono dia (2), que marcava o fim de todo o processo alquímico. Lao-tzu então foi até o braseiro e o abriu para tirar um pouco de elixir. Naquele momento, o Grande Sábio cobria os olhos com as mãos e derramava lágrimas sem parar. Ouvindo ruídos, ele olhou para cima e viu a luz. Incapaz de se conter, deu um tremendo salto, que derrubou o braseiro no chão, produzindo um barulho ensurdecedor. 


Livre do suplício, o Grande Sábio dirigiu-se para a porta do palácio, enquanto os perplexos criados tentavam em vão detê-lo. Um após o outro, eles foram brutalmente apartados do seu caminho. Ele parecia tão feroz e selvagem quanto um tigre em um ataque, ou um dragão de um chifre com febre. Lao-Tzu também correu para detê-lo, mas a única coisa que conseguiu foi um empurrão que o jogou de cabeça contra o chão, enquanto o Grande Sábio escapava calmamente. 


Ele então removeu o bastão de sua orelha, chacoalhou-o vigorosamente, e num instante ele adquiriu a espessura de uma tigela de arroz. Com ele nas mãos, atravessou mais uma vez o Palácio Celestial, lutando com tal ferocidade que os Nove Planetas correram para se esconder, enquanto os Quatro Devarajas desapareceram de sua vista. 


Aqui está um poema que exalta o Rei dos Macacos, dizendo:
"Este ser cósmico possui todos os dons da natureza com tal grau de perfeição que passa sem nenhuma dificuldade por dez mil trabalhos e labutas. Imenso e imóvel como o Vazio Absoluto, perfeito e imutável ao mesmo tempo, é chamado de Abismo Primordial. Apesar de não ter um corpo de mercúrio, foi refinado por muito tempo em um braseiro, demonstrando assim sua natureza imortal, muito superior ao resto de todas as criaturas vivas. Embora seja capaz de infinitas metamorfoses, prefere transformar-se em quietude. Ele igualmente rejeita os três refúgios (3) e os cinco mandamentos (4)."

Um segundo poema afirma:

"Assim como a luz do alto preenche toda a extensão do espaço inacessível, sua arma também se encaixa em sua mão poderosa. Ela se alonga ou encurta conforme a vontade de seu dono, cresce ou encolhe obedecendo às ordens de sua vontade."

Mais um diz o seguinte:

"O corpo metamorfoseado de um macaco se casa com a mente humana. A inteligência é um macaco; não há verdade mais profunda do que esta. O Grande Sábio, Sósia do Céu, não é uma quimera. Como o posto de "pi-ma-wen" iria ajudá-lo a expressar seus dons únicos? O Cavalo trabalha em companhia do Macaco: a Inteligência e a Vontade devem ser bem controladas; um nunca deve excluir o outro. Para entrar no Nirvana, tudo o que existe deve seguir este caminho: viver sob duas árvores idênticas (5) na companhia de Tathagata (6)."

Desta vez, o Rei dos Macacos não demonstrou respeito algum pela posição que as pessoas que ele encontrava pelo caminho podiam ocupar. Com a força de seus golpes, ele foi abrindo caminho, sem que nenhuma divindade fosse capaz de detê-lo. Assim ele conseguiu chegar ao Salão da Luz Perfeita e estava se aproximando do Salão das Névoas Divinas, quando foi recepcionado por Wang Ling-guan, assistente do Imperador de Jade, que estava de plantão naquele momento. Ao ver o Grande Sábio se aproximando, saltou sobre ele tentando impedir seu caminho com seu impressionante chicote dourado.

— Posso saber aonde você vai, macaco travesso? — gritou Wang, desafiador. — Aqui estou para evitar que você seja tão insolente.

O Grande Sábio não o deixou dizer mais nada. Apenas levantou seu bastão de ferro e desferiu-lhe um tremendo golpe, do qual Wang Ling-guan se esquivou com a ajuda de seu chicote. Assim, eles começaram uma luta selvagem que abalou os alicerces do Salão da Névoa Divina. Era um combate mortal entre um patriota de ampla fama e um rebelde não menos notório. Tanto o pecador quanto o justo se engajaram em um duelo sangrento, ansiosos para testar suas habilidades como guerreiros destemidos. Apesar da velocidade de seu chicote, o paladino do céu estava em desvantagem em comparação com a força do bastão de ferro. 

Mas Wang Ling-guan era um deus do julgamento, e não hesitou em enfrentar o macaco conhecido como o Grande Sábio, Sósia do Céu, com sua voz estrondosa. Além disso, ambas as armas haviam sido forjadas na própria Casa de Deus e possuíam uma força superior a dez mil exércitos. Eles demonstraram isso nesse dia diante dos portões do Salão do Tesouro da Névoa Divina. Os dois haviam estabelecido sua meta e estavam dispostos a sacrificar tudo para alcançá-la. Um estava determinado a invadir o Palácio Celestial, enquanto o outro assumiu a responsabilidade de defender um lugar tão sagrado. Por isso, lutavam implacavelmente, dando passos para frente e para trás, enquanto brandiam suas armas com destreza inigualável.

Os dois adversários se enfrentaram por muito tempo, mas nenhum deles foi capaz de obter uma clara vantagem sobre o outro. Wang Ling-guan, no entanto, conseguiu relatar o que estava acontecendo à Seção do Trovão, que prontamente despachou trinta e seis deuses do trovão para ajudá-lo. Sem perder tempo, eles cercaram o Grande Sábio e e mergulharam em uma batalha feroz. O Grande Sábio não se intimidou nem um pouco; empunhando seu bastão de ferro, ele defendia sua retaguarda e desferia golpes incessantemente em todas as direções. Mas os atacantes eram muitos, e o ataque de suas cimitarras, lanças, espadas, machadinhas, chicotes, maças e flechas tornavam-se cada vez mais intensos e difíceis de sustentar. Diante de tal situação comprometedora, o Grande Sábio sacudiu seu corpo e se transformou em uma criatura com seis braços e três cabeças. Ele fez o mesmo com o bastão de ferro e instantaneamente o triplicou, girando-os tão rápido que os deuses do relâmpago tiveram que desistir de seu ataque. 

Os três bastões serviam, de fato, como escudos impenetráveis. A velocidade de seus giros os tornavam tão sólidos que até a luz era refletida ao bater neles. Não poderia se esperar uma tática menor de um guerreiro a quem o fogo era incapaz de queimar e a água de afogar. Era, de fato, como uma deslumbrante pérola sagrada (7), contra a qual lanças e espadas não tinham poder algum. Porém, estava em suas mãos fazer o bem ou abraçar ao mal. Se ele decidisse pela primeira opção, poderia muito bem se tornar um Buda; se, ao contrário, optasse pela segunda, corria o risco de se tornar um ser com chifres e completamente coberto de pelos. Continuamente se metamorfoseando, ele atacou todos que apareceram diante dele, sem que nenhum dos guerreiros celestiais ou os deuses do trovão pudessem colocar as mãos nele.

O calor da batalha logo chegou aos ouvidos do Imperador de Jade, que não perdeu tempo em ordenar ao Ministro da Inspeção Errante e ao Mestre Imortal das Asas Sagradas que fossem para a Região Oeste e convidassem o velho Buda para vir e dominar o monstro. Assim que receberam a ordem, os dois sábios seguiram direto para a Montanha do Espírito. Depois de cumprimentarem os Quatro Budas Vajra e os Oito Bodhisattvas bem em frente ao Templo do Tesouro do Trovão, eles imploraram que fossem gentis o suficiente para anunciarem sua chegada. Sem perder um minuto, os deuses apareceram na Plataforma do Tesouro de Lótus e relataram tudo ao seu senhor. Tathagata os convidou a comparecerem diante dele, e os dois sábios se curvaram três vezes seguidas diante do Buda.

— Querem me explicar o que levou o Imperador de Jade a enviá-los até aqui?

— Há muito tempo atrás responderam os dois sábios — na Montanha das Flores e Frutos nasceu um macaco, que com o passar dos dias adquiriu uma grande quantidade de poderes mágicos e reuniu para si um bando de macacos, que mergulharam o mundo em um completo caos. O Imperador de Jade então ofereceu a ele um ato de reconciliação e o nomeou como pi-ma-wen de seus estábulos. Mas ele achou que esta era uma posição muito baixa para suas muitas qualidades e deixou o céu em um ato de rebelião inquestionável. Sem perder tempo, o Devaraja Li Jing e o Príncipe Nezha foram enviados para capturá-lo, mas não alcançaram seu objetivo e uma segunda anistia teve que ser proclamada, como resultado da qual ele recebeu o título de Grande Sábio, Sósia do Céu, titulo esse que não lhe outorgava nenhuma responsabilidade. Após um tempo, ele foi encarregado de cuidar do Jardim dos Pêssegos Imortais, mas acabou comendo quase todos eles. Não contente com isso, dirigiu-se ao Lago de Jaspe, onde consumiu boa parte da comida e do vinho da festa, inviabilizando a sua celebração. Meio bêbado, conseguiu entrar no Palácio Tushita e, sem que ninguém o visse, roubou o elixir de Lao-Tzu, deixando o céu pela segunda vez após pouco tempo. Desta vez, o Imperador de Jade se viu na necessidade de enviar mais de cem mil guerreiros celestiais contra ele, mas, apesar de seus grandes números, não conseguiram dominá-lo. Felizmente, Guanyin sugeriu o envio imediato de Erlang Shen e seus seis irmãos para o campo de batalha. Lutando com bravura indescritível, eles conseguiram cercá-lo, mas seus poderes metamórficos eram tão grandes que ele os iludiu repetidas vezes. Somente quando Lao-Tzu deixou cair seu bracelete cortador de diamantes em sua cabeça, Erlang Shen finalmente conseguiu capturá-lo e trazê-lo perante o imperador, que o condenou a ser desmembrado. No entanto, embora tenha sido esfaqueado com uma cimitarra, golpeado por um machado, entregue ao fogo e submetido à ação de um raio, ele não sofreu o menor arranhão. Lao-tzu então obteve permissão para levá-lo embora e refiná-lo como ouro. O braseiro esteve, de fato, fechado por quarenta e nove dias, mas nada adiantou contra o macaco rebelde. Assim que sua tampa foi levantada, ele saltou do Brasiero dos Oito Trigramas e começou a esmurrar os guardas celestiais, chegando ao Salão da Luz Perfeita. Quando ele estava prestes a entrar no Salão da Névoa Divina, Wang Ling-guan, assistente do Imperador de Jade, saiu ao seu encontro, envolvendo-o em uma luta terrível da qual também participaram os trinta e seis deuses do trovão. Com indiscutível senso militar, eles o cercaram, mas até o momento não conseguiram avançar um único passo. A situação tornou-se tão desesperadora que o Imperador de Jade optou por implorar que você venha em defesa de seu trono.

Após Tathagata ouvir tudo isso, voltou-se para os bodhisattvas e disse: 

— Fiquem aqui no templo principal e que nenhum de vocês abandone sua postura contemplativa. Minha obrigação é enfrentar aquele demônio e, assim, salvar o imperador.

Ele pediu a Ananda e a Kasyapa que o acompanhassem e partiu imediatamente para o Palácio Celestial. Assim que passaram pelos portões do Salão da Névoa Divina, o rugido ensurdecedor do combate alcançou seus ouvidos. Xingamentos e gritos podiam ser ouvidos por toda a parte. O Grande Sábio continuava mantendo em xeque os trinta e seis deuses do trovão. 

O Patriarca Budista então emitiu uma ordem-dharma, dizendo:

— Que os deuses do trovão parem de lutar instantaneamente e que o Grande Sábio se aproxime de mim, para que eu lhe pergunte sobre o tipo de poderes divinos que o auxiliam.

Os vários guerreiros imediatamente baixaram suas armas e recuaram, enquanto o Grande Sábio voltou à sua forma normal. Ele então aproximou-se furiosamente do ancião, perguntando-lhe rudemente:

— Posso saber quem você é, para ousar interromper a batalha para me questionar?

— Eu sou Sakyamuni, o Venerável da Região Oeste da Felicidade Suprema respondeu Tathagata, sorrindo. — Se estou aqui agora é porque ouvi falar de sua audácia, de sua total falta de respeito e de seus contínuos atos de rebelião contra o Céu. Então, responda-me sem demora as seguintes perguntas: Onde você nasceu? Onde você aprendeu a Grande Arte? Por que você é tão violento e contrário às regras?

Estranhamente calmo, o Grande Sábio respondeu:

— Eu fui magicamente engendrado pelo Céu e pela Terra,  e vi a luz na Montanha das Flores e dos Frutos. Na Caverna da Cortina D'água estabeleci minha morada, mas depois busquei a amizade e o conhecimento de um grande mestre, que teve a gentileza de me iniciar nos ensinamentos do Tao. Com ele aprendi a eternizar minha vida, a me metamorfosear e me tornar o ser que eu queria. Portanto, achei os caminhos da vida mortal na terra muito estreitos e decidi habitar no céu de jade verde. No entanto, descobri amargamente que não tinha permissão para morar no Salão da Névoa Divina, pois, como acontece com os homens, um rei sucede o outro e apenas ele pode residir em tal palácio. Mas eu não aceito tais regras! A honra está intimamente ligada ao poder e apenas aqueles que são capazes de guerrear e obter a vitória devem ser reis.

— Você não passa de um macaco! — exclamou, desdenhoso, o Patriarca Budista, soltando uma gargalhada. Como você pode ser tão presunçoso e aspirar a tomar o respeitável trono do grandioso Imperador de Jade? Desde a mais tenra juventude começou a praticar atos de misericórdia, passando mais tarde pela amarga experiência de mil setecentos e cinquenta kalpas (8) , cada um dos quais tem duração de cento e vinte e nove mil e seiscentos anos. Você pode calcular por si mesmo os séculos que levou para alcançar a posição muito elevada que ele agora desfruta. Você nada mais é do que uma besta, que obteve nesta reencarnação uma forma humana. Como ousa, então, aspirar por algo que nunca poderá alcançar e está totalmente além de suas possibilidades? Sua atitude constitui pura blasfêmia e, consequentemente, acabará encurtando significativamente sua vida. Arrependa-se agora enquantoo ainda tem tempo, e pare de falar besteira. Perceba que sua língua pode levá-lo à ruína e fazer com que suas muitas qualidades desapareçam como uma névoa.

— Embora o Imperador de Jade tenha se dedicado ao ascetismo desde a mais tenra idade respondeu o Grande Sábio — , não deveria ser permitido que ele permaneça aqui para sempre. Como diz o ditado, "são muitas as voltas que a realeza dá e ninguém me garante que no ano que vem ela não vai me tocar". Então o que você pode fazer é dizer a ele para deixar seu trono o mais rápido possível e entregar o Palácio Celestial para mim. Isso acabará com todos os conflitos. Caso contrário, continuarei lutando e jamais haverá paz.

— Além da imortalidade e de sua capacidade metamórfica, que outros poderes você tem para ousar usurpar o trono desta região sagrada? perguntou o Patriarca Budista.

— Tenho muitos! — respondeu rapidamente o Grande Sábio. — Eu domino setenta e duas transformações e tenho uma vida que permanecerá inalterada por mais de dez mil kalpas. Também sei caminhar por entre as nuvens e com um único salto sou capaz de percorrer uma distância de cento e oito mil quilômetros. Te parece pouco para que eu possa ocupar o trono do céu?

— Então façamos uma aposta respondeu o Patriarca Budista. Se você conseguir escapar da minha mão direita com um salto, todos nós o consideraremos o vencedor. Você não terá que continuar lutando, porque eu mesmo pedirei ao Imperador de Jade para vir morar comigo no oeste e deixar o Palácio Celestial para você. Se, por outro lado, você não conseguir sair da minha mão, você retornará às Regiões Inferiores, onde deverá passar por mais alguns kalpas, antes de causar problemas novamente.


— Que tolo é esse Tathagata! — disse o Grande Sábio para si mesmo, ao ouvi-lo. —  Um único de meus saltos mortais pode me transportar por mais de cento e oito mil quilômetros, e sua mão está a apenas um palmo de distância. Como não escaparei dela? É ridículo! 

Wukong então ergueu a voz e perguntou, ansioso: 

— Você vai cumprir o acordo depois?

 De minha parte não haverá problema respondeu Tathagata, estendendo sua mão direita, que tinha aproximadamente o tamanho de uma folha de lótus.


O Grande Sábio, por sua vez, largou o bastão de ferro e, após reunir todas as suas forças, deu um salto que o levou direto ao centro da mão do Patriarca. Em seguida, Wukong disse: — Estou indo! — partindo em direção aos céus numa velocidade velocidade tão grande que parecia um feixe de luz riscando as nuvens. O próprio Patriarca Budista teve que forçar os olhos o máximo que pôde para vê-lo se mover como um redemoinho. 

Seu fantástico salto o conduziu a uma região de ar esverdeado, sustentado por cinco enormes colunas de cor rosada como a pele. 


Ao se aproximar delas, disse a si mesmo, exultante:

— Este deve ser o fim do mundo. Voltarei até Tathagata e o forçarei a cumprir o acordo, permitindo-me habitar para sempre no Palácio da Névoa Divina. 

Mas, quando Wukong estava prestes a iniciar o caminho de volta, parou de repente e exclamou:

— Espere! É melhor eu deixar aqui uma prova de que cheguei a este lugar, antes de eu voltar à presença de Tathagata.

Sem perder tempo, Wukong puxou um fio de cabelo e, após expirar sobre ele um sopro de ar mágico, gritou:

— Transforme-se! — e o mesmo tornou-se um pincel embebido em tinta, com o qual escreveu em letras grandes na coluna central: "O Grande Sábio, Sósia do Céu, esteve aqui."

Assim que terminou de escrevê-lo, recuperou o pêlo e, com total desrespeito, deixou uma poça de urina na base da primeira coluna. Então ele deu uma cambalhota e retornou ao lugar de onde havia saltado. Posicionado no centro da mão de Tathagata, Wukong levantou a voz e disse:

— Como você pode ver, eu fui e voltei. Então diga ao Imperador de Jade para entregar o Palácio Celestial para mim o mais rápido possível.

— Maldito macaco mijão! disse Tathagata, o repreendendo. — Você nunca deixou a palma da minha mão!

— Como você pode ser tão ignorante! — respondeu o Grande Sábio, surpreso. — Fui até o fim dos céus, onde encontrei cinco colunas de cor rosada, que sustentavam uma massa de ar esverdeado. Aliás, para que não haja dúvidas sobre a veracidade do que afirmo, deixei lá provas irrefutáveis ​​da minha passagem. Você se atreve a ir comigo para vê-lo?

— Não há necessidade de ir a lugar algum respondeu Tathagata, zombando. — Abaixe um pouco a cabeça e olhe.

O Grande Sábio assim o fez e, após aguçar ao máximo seus olhos de fogo e pupilas de diamante, viu que no dedo médio da mão direita do Patriarca Budista estava escrito: "O Grande Sábio, Sósia do Céu, esteve aqui." Ao mesmo tempo, um cheiro forte de urina de macaco vinha da junção de seu polegar e indicador. 

Intrigado, o Grande Sábio exclamou: 

— Como é possível? Eu mesmo escrevi essas palavras nos pilares sobre os quais repousa o céu. Como eles agora aparecem em um de seus dedos? Ele deve ter usado poderes de adivinhação em mim. Não acredito. Recuso-me a acreditar! Deixe eu voltar lá e conferir.

Sem perder tempo, Wukong se abaixou para ganhar impulso, mas quando estava prestes a pular, o Patriarca Budista deu-lhe um peteleco e o atirou para fora do Portão Oeste. 

Em seguida, transformou cinco de seus dedos em cinco elementos: metal, madeira, água, fogo e terra, e esses cinco elementos se tornaram uma cordilheira composta por cinco picos, chamada de  Wuxingshan, que significa Montanha dos Cinco Elementos. A montanha caiu sobre o Grande Sábio e o aprisionou com força, impossibilitando sua fuga. 

Ananda, Kasyapa e os deuses do trovão deram as mãos e exclamaram com alívio:

— Maravilhoso! Fantástico!

Desde que saiu de um ovo de pedra, o macaco se empenhou em adquirir hábitos humanos, almejando aprender o Caminho da Verdade. Por mais de dez mil kalpas ele habitou um lugar onde o silêncio e a paz floresciam por toda parte. Mas um dia ele mudou repentinamente e começou a exalar vigor e força. Seu desejo era alcançar as mais altas posições e ascendeu ao próprio coração do Céu, onde zombou dos sábios, roubou as pílulas da imortalidade e destruiu as relações que mantinham o cosmos em ordem. Escravo do mal, ele finalmente encontra seu castigo, do qual ninguém sabe quando poderá escapar.

Uma vez livre do Rei dos Macacos, o Patriarca Budista Tathagata voltou-se para Ananda e Kasyapa e ordenou que voltassem com ele para o Paraíso Ocidental. Naquele exato momento, Tianpeng e Tianyou, dois enviados do Salão da Névoa Divina, correram para encontrá-lo e disseram:

— Por favor, espere um momento, por favor. A carruagem de nosso senhor está prestes a chegar.

Quando o Patriarca Budista ouviu essas palavras, ele se virou e esperou com reverência. Logo apareceu uma carruagem puxada por oito fênixes multicoloridas e coberta por um dossel no qual se destacavam nove gemas brilhantes. Hinos majestosos vinham da procissão que a acompanhava, cantados pelas incontáveis ​​gargantas do coro celeste. Espalhando flores preciosas e difundindo incenso perfumado, ela se aproximou do Buda, e o Imperador de Jade finalmente pôde agradecê-lo, dizendo:

— Estamos em dívida com você por ter feito o monstro desaparecer com a força do seu poderoso dharma. Permita-nos desfrutar mais um dia do prazer de sua presença e assim convidarmos os demais imortais para o banquete que pretendemos oferecer em sua homenagem.

Não ousando recusar uma oferta tão galante, Tathagata cruzou as mãos na altura do peito e agradeceu ao Imperador de Jade com estas palavras:

— Eu vim aqui em resposta à sua ordem, Venerável Veda, não por minha própria vontade. O sucesso da operação, aliás, deve-se à sua boa sorte e à cooperação dos outros deuses. Não há nada de que eu possa me gabar. Como posso ser digno de sua gratidão?

O Imperador de Jade voltou-se para os deuses do trovão e ordenou que, sem perda de tempo, enviassem convites para o banquete de ação de graças aos Três Puros, aos Quatro Ministros, aos Cinco Anciãos, às Seis Oficiais (9), às Sete Estrelas, aos Oito Polos, aos Nove Planetas e as Dez Capitais, assim como aos mil imortais e aos dez mil sábios que tinham sua residência fixa no céu. Ao mesmo tempo, os Quatro Grandes Preceptores Imperiais e as Donzelas Divinas dos Nove Céus foram convidados a abrir os portões dourados da Capital de Jade, o Palácio do Segredo Primordial e as Cinco Moradas do Brilho Eterno. Tathagata ocupava o lugar mais alto na Plataforma Espiritual dos Sete Tesouros, enquanto os outros deuses sentavam-se, de acordo com sua posição e idade, ao redor de uma mesa esplêndida, sobre a qual havia fígados de dragão, tutano de fênix, suco de jade e pêssegos imortais.

Em pouco tempo, o Puro Respeitável das Origens, o Puro Honorável dos Tesouros Espirituais, o Puro Exaltado da Virtude Mortal, os Mestres Imortais das Cinco Influências, os Espíritos Estelares das Cinco Constelações, os Três Ministros, os Quatro Sábios, os Nove Planetas, os Conselheiros da Direita e da Esquerda, o Devaraja Li Jing e o Príncipe Nezha marcharam liderando um comboio de bandeiras e mantos em pares. Todos eles carregavam em suas mãos tesouros esplêndidos, pérolas magníficas, frutos da longevidade e flores exóticas, os quais deram agradecidos a Buda, curvando-se diante dele e dizendo:

— Somos muito gratos pelo poder insondável de Tathagata, que subjugou o monstruoso macaco. Somos gratos, também, ao Mais Honorável Deva, por sua gentileza em nos convidar para um banquete tão esplêndido. Seria pedir demais ao honrado Tathagata para dar um nome a este banquete?

— Se é isso que você deseja respondeu Tathagata, condescendentemente, que este banquete seja lembrado como o "Grande Banquete da Paz Celestial"!

— Que nome esplêndido! — exclamaram os imortais em coro. — Este é, de fato, o Grande Banquete da Paz Celestial.

Eles então se sentaram e o vinho foi servido. Após os brindes, foram distribuídos buquês de flores, ao som de instrumentos e cítaras. Aquele foi, de fato, um esplêndido banquete, do qual diz um antigo poema:

"O Grande Banquete da Paz Celestial supera em muito
O Grande Festival dos Pêssegos Imortais que o macaco destruiu.
O esplendor brilha nas bandeiras dos dragões e nas carruagens imperiais;
Vapores auspiciosos flutuam acima de flâmulas e símbolos de ofício.
Melodiosa a música de fadas e canções misteriosas;
Som alto os tons da flauta fênix e cachimbo de jade
O mais raro dos perfumes flutuava em torno dos Imortais, reunidos calmamente no céu.
Para parabenizar a corte por Pacificar o Universo."

Quando estavam mais entretidos comendo e bebendo, a Rainha Mãe apareceu à frente de uma autêntica legião de donzelas celestiais. Ainda cantando e dançando, elas se curvaram respeitosamente perante ao Buda e disseram:

— O macaco estragou a celebração do Festival dos Pêssegos Imortais. Sentimo-nos, então, em dívida com você por tê-lo dominado e punido como ele merecia. Há pouco que possamos oferecer a você como sinal de agradecimento em uma ocasião tão festiva como a celebração do Banquete da Paz Celestial. Aceite, portanto, esses poucos pêssegos imortais, que nós mesmas colhemos com nossas próprias mãos das árvores que os nutriram por milênios.

Os frutos que lhe ofereceram, meio vermelhos e meio verdes, exalavam um atraente aroma adocicado, não deixando dúvidas quanto à sua origem. Apesar de terem uma idade que ultrapassava em muito os dez mil anos, eram superiores em todas as ordens às que crescem junto ao ribeiro Wu-Ling (10). Incomparável era a sua doçura, inimitável a sua cor, irrepetível a delicadeza de suas veias roxas e a sua pele de veludo imperecível. Como poderia ser diferente, se eles eram capazes de prolongar a vida e fazer uma idade se identificar com a do céu? Feliz quem os pusesse na boca, porque jamais experimentaria o sabor da morte!

O Patriarca Budista agradeceu à Rainha Mãe por seu presente, cruzando as mãos e curvando a cabeça respeitosamente. Emocionada, ela se voltou para as donzelas celestiais e as incentivou a continuarem cantando e dançando. Todos os imortais presentes no banquete aplaudiram com entusiasmo. Redemoinhos de incenso preenchiam os espaços que separavam as mesas, competindo seu aroma com o das flores e pétalas que caíam incessantemente sobre a cabeça dos convidados. Quão esplêndida era a Capital de Jade com suas arcadas douradas e os presentes inestimáveis ​​que abrigava! Todos os convidados eram da mesma idade que os céus; alguns até o excediam em mais de dez mil kalpas. Aqueles que aqui vivem não sentem dor nem medo.

A Rainha Mãe pediu às donzelas que continuassem cantando e dançando, enquanto taças de vinho eram erguidas em brindes e as taças tilintavam como sinos. Pouco a pouco, começou a se espalhar um aroma tão inebriante que as estrelas e os planetas se levantaram, os deuses e Buda esqueceram o licor e todos olharam surpresos. A venerável figura de um ancião apareceu de repente no ar, segurando em suas mãos a exuberante planta de uma vida imperecível. Em sua cabaça guardava o elixir de dez mil anos e em seu livro havia listas de nomes com mais de doze milênios de existência. O céu e a terra mostravam toda a sua força no interior de sua caverna, enquanto o sol e a lua atingiram sua perfeição em seus vasos. Ele vagou pelos Quatro Mares e fez das Dez Ilhas seu lar. Ele costumava ficar bêbado durante a celebração do Festival dos Pêssegos Imortais, mas quando acordava, a lua ainda estava brilhante como sempre. Ele tinha uma cabeça alongada, uma estrutura fraca e orelhas muito grandes. Se chamava Estrela da Vida Duradoura do Polo Sul

Após cumprimentar o Imperador de Jade, ele foi até onde Tathagata estava e mostrou sua gratidão, dizendo:

— Quando soube que Lao-tzu havia levado aquele macaco vaidoso com ele ao Palácio Tushita para refiná-lo como ouro, pensei que tudo estava acabado. Nunca imaginei que ele pudesse escapar e que fosse justamente você quem acabaria por dominá-lo com sua gentileza. Decidi vir felicitá-lo, assim que recebi a notícia da celebração deste banquete. Meus presentes certamente são pobres para seus méritos, mas eu imploro que você gentilmente aceite esta planta de jaspe, esta raiz de lótus de jade e este elixir dourado.

O poema diz com razão:

"Sakya recebeu o lótus de jade e o elixir de ouro. Sua idade é a mesma das areias do Ganges. O brocado dos três vagões (11) que conduzem os viventes pelo doloroso caminho da reencarnação não está cheio de alusões à felicidade eterna. As guirlandas dos nove graus de generosidade celestial exalam um aroma de vida sem fim. Ele é o autêntico professor da Escola San-Lung (12) e sua morada é no céu do vazio e da forma. Não é à toa que o universo e a terra o consideram seu senhor. Felicidade e vida fluem de seu corpo de diamante."

Tathagata aceitou alegremente seus agradecimentos, e a Estrela da Vida Duradoura ocupou o assento que lhe foi reservado. Novamente correram rios de vinho e brindes foram repetidos, os quais foram interrompidos momentaneamente pela chegada do Grande Imortal dos Pés Descalços. Depois de prestar homenagem ao Imperador de Jade, ele foi até onde estava o Patriarca Budista e disse:

— A gratidão que sinto pelo seu dharma, por ter dominado a besta, é inexprimível. Para mostrar-lhe meu apreço, não tenho nada além de duas peras mágicas e algumas tâmaras de fogo, que imploro que aceite.

É por isso que o poema afirma

"Verdadeiramente perfumadas são as peras e tâmaras que o Imortal dos Pés Descalços ofereceu a Amitabha, o dos anos infinitos. A Plataforma de Lótus dos Sete Tesouros tem a segurança das montanhas, e seu Trono de Flores é inteiramente bordado a ouro. A idade daquele que se senta sobre ela supera a do céu e da terra, e sua boa fortuna é tão vasta quanto o oceano. Nisto não há falsidade ou engano. Nele a felicidade e a longevidade atingem o ápice de sua plenitude. Sua morada de bem-aventurança eterna está nas regiões ocidentais."

Tathagata agradeceu ao imortal por seus presentes e pediu a Ananda e Kasyapa para colocá-los junto dos outros. Então ele foi até onde o Imperador de Jade estava e expressou sua gratidão pelo esplêndido banquete que ele havia oferecido em sua homenagem. A essa altura, todos os convidados já estavam um pouco bêbados. Nisso chegou um dos Espíritos da Inspeção Universal e anunciou, nervoso:

— O Grande Sábio acabou de colocar a cabeça para fora!


— Não há com o que se preocupar o Patriarca Budista o tranquilizou.

Ele então tirou de suas mangas um pergaminho no qual havia sido escrito em letras douradas as seguintes palavras, "Om mani padme hum" (13) , e o entregou a Ananda, ordenando-lhe que o colocasse no topo da montanha sob a qual o Grande Sábio foi enterrado. O deva pegou o pergaminho e o levou até a Montanha dos Cinco Elementos, onde o amarrou firmemente a uma rocha quadrangular logo no topo. A montanha imediatamente criou raízes que cobriram todas as suas rachaduras, deixando espaço apenas para que seu prisioneiro respirasse e se movesse um pouco. 


Com a missão cumprida, Ananda voltou ao palácio imperial e relatou ao seu senhor, dizendo:

— O pergaminho foi bem amarrado no local que me indicou.

Tathagata então se despediu do Imperador de Jade e dos outros deuses e deixou o Portão Celestial, seguido pelos dois devas. Compadecido, porém, do destino do Grande Sábio, ele pronunciou uma fórmula mágica e imediatamente o espírito local e os Intrépidos Guardiões dos Cinco Pontos Cardeais vieram à sua presença, a quem ele ordenou que vigiassem dia e noite a Montanha dos Cinco Elementos. Ele ordenou que, ao mesmo tempo, alimentassem o prisioneiro com bolas de ferro quando ele estivesse com fome e lhe dessem cobre derretido para beber quando estivesse com sede. Uma vez expirado o tempo de sua punição, um enviado do céu viria para libertá-lo, e eles deveriam obedecer a ordem sem questionar.

O macaco rebelde sofria, assim, o castigo devido à sua rebelião. Foi precisamente Tathagata quem quebrou seu orgulho blasfemo, envolvendo-o sob o peso de uma montanha. Para enfrentar as inclemências do céu, alimenta-se de bolas de ferro e mergulha os lábios em cobre derretido. Duro e amargo é o castigo, mas ele está feliz por ainda estar vivo. Se um dia conseguir obter a liberdade, colocar-se-á ao serviço do Buda e empreenderá uma longuíssima viagem para o Ocidente.

Orgulhoso de seus poderes extraordinários, ele domou o dragão e domesticou os tigres. Não é à toa que ele encontrou favor e respeito na Capital de Jade. Mas ele quebrou essa confiança invejável, roubando os pêssegos e o vinho sagrados e mergulhando os céus em uma desordem insuportável. Por esta razão, ele agora purga sua culpa na escuridão de uma prisão de pedra. Somente suas boas ações poderão livrá-lo de tão extremo castigo, fazendo com que seus olhos voltem a contemplar a luz. Para isso, porém, terá que esperar a chegada de um santo monge da ilustre corte dos Tang. Não sabemos o mês ou o ano em que sua culpa foi finalmente expiada. Quem quiser descobrir terá que ouvir com atenção o que é dito no próximo capítulo.


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    Notas do Capítulo VII:

    1. "Samadhi" é o fogo místico que devora o corpo do Buda a partir do momento em que ele alcança o estado nirvânico. A partir daí passou a significar, nos contos budistas populares, o fogo que domina os guerreiros que alcançaram a imortalidade. É tão poderoso que às vezes até serve como arma de proteção.
    2. O taoísmo dá aos números uma forte carga simbólica. O número quarenta e nove, em particular, tinha um sentido marcante de destruição, sendo resultado da multiplicação por si mesmo de sete, o número sagrado.
    3. Os três refúgios, ou "trisarana", referem-se às três realidades às quais os fiéis budistas devem se submeter: ao Buda como professor, à lei, ou "dharma", como remédio, e à comunidade de monges, ou “sangha”, como amigos.
    4. Os cinco mandamentos proibiam matar, roubar, fornicar, mentir e preparar bebidas venenosas.
    5. As duas árvores idênticas referem-se aos dois arbustos que cresceram na entrada da caverna em que Buda atingiu o estado nirvânico.
    6. Tathagata é o mais glorioso dos nomes de Buda, pois significa "aquele que renunciou completamente à conexão entre causa e efeito", alcançando assim a sabedoria absoluta.
    7. Provável alusão à pérola "mani", que se dizia ser tão brilhante que podia devolver a visão aos cegos.
    8. "Kalpas" são as provas que devem ser submetidas àqueles que, uma vez iluminados, desejam alcançar o estado de Buda.
    9. Durante a dinastia Han, seis mulheres foram escolhidas para encarregar-se, na categoria de funcionárias públicas, da manutenção do palácio, dos assuntos protocolares, das vestimentas da corte, dos remédios, da realização de banquetes e das legiões de artistas e cortesãos que enxameavam a corte.
    10. O ribeiro de Wu-Ling, província de Hunan, é famoso por ter sido cantado por poetas renomados como Tao-Chien (365-427) e Wang-Wei (655-729). Sua menção tem, portanto, fortes ressonâncias literárias.
    11. Refere-se aos “triyana”, ou meios de transporte puxados, respectivamente, por uma cabra, um veado e um boi, que conduzem os seres vivos ao nirvana, libertando-os da roda da reencarnação e da morte.
    12. A escola San-Lung defendia a doutrina do vazio e da ausência de forma.
    13. "Om mani padme hum" é um encantamento atribuído a Padmapani, cujas sílabas, acreditava-se, possuíam separadamente um extraordinário poder salvífico.


    • Tradução em pt-br por Rodrigo Viany (Sleipnir). Favor não utilizar sem permissão.
    • Tradução baseada na tradução do chinês para o espanhol feitas por Enrique P. Gatón e Imelda Huang-Wang, e do chinês para o inglês feita por Collinson Fair.
    fontes consultadas para a pesquisa:
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