9 de julho de 2025

Fogo Morto

۞ ADM Sleipnir

Arte de Rodrigo Viany (Sleipnir)

Fogo Morto é uma crença folclórica presente no Rio Grande do Sul, que envolve tabus e superstições associados ao ato de reacender uma fogueira sobre os vestígios de outra já extinta. Associada ao culto do fogo como elemento sagrado, essa prática simboliza respeito, temor e transgressão espiritual. Acender uma nova chama sobre as cinzas de outra é visto como um ato profano, capaz de atrair desgraças. Essa tradição se aproxima de práticas religiosas de outros povos antigos, como os romanos e os gregos. No culto à deusa Vesta, por exemplo, não se reacendia uma nova chama sobre as cinzas de outra. O mesmo princípio era observado em cerimônias dedicadas aos Penates, deuses domésticos da Roma Antiga. Já entre os povos indígenas mixtecos, no México, é proibido reutilizar um tição usado anteriormente, como forma de respeito à  divindade Titna Nihi, "la Abuela Encantada".

Um dos relatos mais emblemáticos da tradição do Fogo Morto é narrado pelo escritor e jornalista Roque Callage (1886-1931). Ele se passa na época anterior à chegada dos trens de ferro, quando carretas cruzavam lentamente o interior do Brasil. Um carreteiro rico, viajando com sua comitiva e sua boiada, decidiu acampar ao entardecer na beira de uma restinga. Vendo os vestígios de uma fogueira feita no local por outro viajante, resolveu aproveitar os restos de lenha e carvão ainda incandescentes para reacender o fogo e preparar o jantar.

A decisão, embora prática, é recebida com horror pelo seu ajudante, um piá, que identifica o ato como um mau presságio, dizendo: "Fogão de carreteiro, em cima de outro fogão, é sinal certo de desgraça!". E, de fato, a maldição se concretiza. Durante a noite, as chamas ganharam força e consumiram as carretas e suas cargas. Apesar dos esforços para conter o incêndio, inclusive trazendo água de uma sanga próxima, tudo virou cinzas. Quando o fogo finalmente se apagou de forma misteriosa — após o arroio secar —, o estrago já estava feito. E os infortúnios não param por aí. Pouco depois, o carreteiro descobriu que seus bois haviam desaparecido e, para completar sua desgraça, sua companheira fugira com outro homem, levando consigo todo o seu dinheiro e seus cavalos.


fonte:
  • LUÍS DA CÂMARA CASCUDO. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Global Editora, 2012.

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