Iconografia
Garuda é normalmente representado somente como uma águia ou em forma antropomórfica, com características de homem e de pássaro. Em sua forma antropomórfica, Garuda pode ser representado com dois ou quatro braços, e seus vários adornos, incluindo brincos, tornozeleiras e pulseiras, são feitos de serpentes. Em suas mãos ele carrega os emblemas de Vishnu ou o pote contendo o amrita (o elixir da imortalidade, advindo do Samudra Manthan); alternativamente, quando suas mãos estão vazias, elas são mantidas na postura anjalimudra (namaste). Quando Vishnu está montado em suas costas, duas das mãos de Garuda sustentam os pés do deus preservador.
Mitologia Hindu
O nascimento e os feitos de Garuda são contados no primeiro livro do grande épico hindu Mahabharata. Seu pai era o sábio ancião Kasyapa, descendente do deus Brahma, enquanto sua mãe era Vinata, filha do sábio divino Daksha. A irmã de Vinata, Kadru, também era esposa de Kasyapa, e as duas viviam com ciúmes uma da outra Um dia Kasyapa resolveu conceder a cada uma delas uma bênção. Kadru desejou ter mil filhos de força e valor incomparáveis, enquanto Vinata desejou ter somente dois filhos, porém queria que eles ultrapassassem a força e o valor dos filhos de sua irmã.
O desejo das irmãs foi atendido, e após algum tempo, Kadru pôs mil ovos, enquanto Vinata pôs somente dois. Passados quinhentos anos, os ovos de Kadru chocaram, e deles nasceram mil serpentes, originando a raça das Nagas. Os ovos de Vinata ainda não haviam chocado, e com ciúmes da irmã, ela resolveu quebrar um dos ovos, revelando um filho meio formado. Este filho, chamado Aruna, ficou furioso com sua forma física e amaldiçoou sua mãe por ter se precipitado, dizendo que ela seria uma escrava de Kadru por quinhentos anos até que o filho de seu segundo ovo nascesse. Aruna tornou-se um cocheiro e arauto do deus sol Surya.
Enquanto aguardava o nascimento de seu segundo filho, Vinata aceitou uma aposta feita por sua irmã Kadru, sobre qual era a cor do cavalo divino Uchaishravas, e quem perdesse a aposta se tornaria escrava da vencedora. Vinata respondeu que o cavalo era totalmente branco, e essa era a resposta certa, porém Kadru trapaceou e ordenou que seus filhos serpentes enroscassem na cauda de Uchaishravas. Quando as duas irmãs chegaram até o cavalo para checar quem era a vencedora, sua cauda estava escura como a noite. De acordo com os termos da aposta, Vinata tornou-se escrava de sua irmã. Passados mais quinhentos anos, o segundo filho de Vinata, Garuda, nasceu na forma de um pássaro enorme e dotado de imenso poder. Garuda emitia um brilho tão forte que os deuses sequer eram capazes de olhar para ele. Atendendo ao pedido dos deuses, Garuda reduziu seu brilho e tamanho de forma que pudessem enxergá-lo.
Como sua mãe, Garuda também se tornou um servo de Kadru e seus filhos, e passava seus dias obedecendo toda e qualquer ordem que eles delegavam a ele. Um dia, cansado de obedecer às ordens de seus meio-irmãos, Garuda perguntou a sua mãe Vinata sobre o porquê deles terem que obedecer as ordens deles. Vinata contou a Garuda sobre a aposta que havia feito e perdido, então Garuda resolveu abordar Kadru e perguntar o que ele poderia fazer para que ele e sua mãe fossem liberados de suas obrigações. Kadru então decretou que Garuda deveria trazer para ela e seus filhos o amrita, o elixir da imortalidade que estava em posse dos deuses.
Obter o elixir seria uma tarefa difícil, pois os deuses o guardavam fortemente. O local onde o elixir era guardado estava cercado por um círculo massivo de fogo, e o pote em si era protegido por uma roda repleta de lâminas afiadas e que girava em alta velocidade ao redor dele, impedindo qualquer aproximação. Por último, no caso de alguém superar os dois primeiros obstáculos, ao seu lado haviam duas serpentes venenosas prontas para abaterem qualquer invasor.
Destemido, Garuda se apressou em ir até à morada dos deuses, com a intenção de roubar o elixir. Cientes de seu poder, os deuses prepararam um grande exército composto por 1000 devas para recepcioná-lo e enfrentá-lo, mas Garuda derrotou todos e seguiu em frente.
Ao ver a enorme barreira de fogo que protegia o local onde o elixir era guardado, Garuda aumentou de tamanho, coletou com sua boca um grande volume de água de muitos rios e o despejou sobre ela, extinguindo-a. Em seguida, ele encolheu de tamanho e se lançou em alta velocidade contra a roda repleta de lâminas que girava ao redor do pote, passando entre os raios dela e chegando finalmente até ele. Por fim, Garuda convocou uma tempestade de areia que cegou as serpentes momentaneamente. Incapazes de vê-lo, elas foram destruídas por Garuda, que pode assim tomar posse do elixir e deixar o local.
No caminho de volta, Garuda encontrou Vishnu, que ficou impressionado com a sua força e também com o fato dele próprio não ter consumido o elixir da imortalidade, e em vez de lutar contra ele, decidiu recompensá-lo com a imortalidade, sem que fosse necessário ele beber do elixir. Garuda ficou agradecido com a misericórdia de Vishnu e se ofereceu para tornar-se sua montaria, oferta essa que foi aceita. Seguindo em frente, Garuda deparou-se com Indra, e o rei dos deuses não estava disposto a permitir que ele fugisse. Indra convocou sua astra Vajra e então atingiu Garuda com seu poderoso raio, mas para sua surpresa ele saiu praticamente ileso do golpe, perdendo apenas uma única pena.
Após testemunhar o poder de Garuda, Indra decidiu pedir uma trégua a ele, e então os dois selaram um pacto: Garuda prometeu que assim que entregasse o elixir às serpentes e libertasse a si próprio e a sua mãe de suas obrigações, ele possibilitaria que Indra recuperasse a posse do elixir para devolvê-lo aos deuses. Indra, por sua vez, deu permissão a Garuda para ter as serpentes como alimento.
Após finalmente chegar até o ilha onde Kadru e as serpentes o aguardavam, Garuda entregou-lhes o pote contendo o elixir, e exigiu que cumprissem com o combinado. A partir daquele momento, Garuda e sua mãe estavam livres de sua servidão aos Nagas. Porém, quando as serpentes começaram a avançar em direção ao pote com o elixir da imortalidade, Garuda os aconselhou a se purificarem nas águas de um rio antes de consumirem o mesmo.
As serpente aceitaram o conselho e foram ao rio para se purificar. Indra, que estava esperando por essa oportunidade, aproveitou para roubar o pote e o devolver ao seu lugar entre os deuses. Assim, as serpentes foram frustradas em sua tentativa de alcançar a imortalidade. Desde então, Garuda tornou-se um aliado dos deuses e montaria de Vishnu, bem como o implacável inimigo das serpentes, as quais ele atacava em todas as oportunidades. Garuda foi o primeiro ser a ensinar a humanidade como curar o veneno das serpentes; além disso, dizem que a adoração ou meditação em Garuda remove as serpentes do caminho.
Fora do Mahabharata, Garuda também está simbolicamente ligado às esmeraldas. No Garuda Purana, após o demônio Vala ter sido morto por Indra, sua bile foi roubada por Vasuki, rei dos Nagas. Garuda confronta Vasuki antes que ele possa fugir com seu saque, fazendo com que ele derrubasse a bile. Garuda a agarra no ar, mas ela eventualmente cai de seu bico e se espatifa no chão, solidificando-se na forma de uma esmeralda. A crença de que tocar em esmeraldas pode mitigar os efeitos do veneno deriva desse mito.
Já no Bhagavata Purana é contada uma lenda onde Garuda luta contra a temível serpente de muitas cabeças, Kaliya. Há muito tempo, as ofertas eram deixadas para as serpentes durante os primeiros dias de cada mês e uma parte dessa oferta era dada pelas serpentes a Garuda. No entanto, em uma ocasião Kaliya, pensando que estava a salvo de Garuda por causa de seu terrível veneno, guardou para si todas as oferendas. Não satisfeito com esse ato de impertinência, Garuda atacou Kaliya, acertando-o com tanta força com suas asas que Kaliya se escondeu em um lago localizado no rio Kalindi. Nesse local Kaliya estava segura porque certa vez Garuda foi amaldiçoado por um sábio por roubar muitos peixes desse rio, e se Garuda entrasse em suas águas novamente, ele morreria imediatamente. Kaliya receberia sua punição mais tarde pelas mãos de Krishna, que o castigaria pisando em cada uma de suas muitas cabeças.
Consorte e filhos
A consorte de Garuda chama-se Unnati, e com ele teve seis filhos; Sumukha ("belo rosto"), Sunāma ("belo nome"), Sunetra ("belos olhos"), Suvarcas ("belo vigor"), Suruk ("belo brilho") e Subala ("bela força"). De seus filhos, são ditos descenderem todas as aves devoradoras de serpentes.
Budismo
Na mitologia budista, Garuda não é apenas uma criatura, mas uma uma raça de enormes pássaros predadores dotados de grande inteligência e organização social. Amonghasiddhi, um dos chamados Cinco Budas da Meditação, é ocasionalmente representado montado em um garuda. Assim como no hinduísmo, os Garuḍas são inimigos dos Nagas, a quem eles caçam implacavelmente.
Garuda no Sudeste Asiático
O termo sânscrito garuda foi emprestado e modificado pelas línguas de vários países budistas do sudeste asiático. Em birmanês ele é conhecido como Galon ou Nan Belu, e no Japão como Karura (迦楼羅). Em tailandês, a palavra para garuḍa é Krut (ครุฑ). A Tailândia e a Indonésia usam o garuḍa como seus símbolos nacionais. Uma forma de garuḍa, usada na Tailândia como símbolo da família real, é chamada de Krut Pha, que significa "garuda agindo como o veículo de deus".
A companhia aérea nacional da Indonésia é chamada de "Garuda Indonésia". A Mongólia também se apropriou do símbolo de Garuda, referindo-se a ele como Khangard, um servo de Yama, o deus da morte. De acordo com a crença popular mongol, Khangard é o guardião da cordilheira Bojdochan-ula e aparece na bandeira e no brasão de Ulan Bator, a capital da Mongólia.