Arte de Rodrigo Viany (Sleipnir) |
O Gritador (também conhecido como Zé-Capiongo) é uma espécie de assombração (por vezes dito ser um duende) pertencente ao folclore brasileiro, dito geralmente aparecer durante a noite gritando e assustando as pessoas. Ele é bastante conhecido na região do Vale do São Francisco, mas também possui muitas versões de sua lenda espalhadas por todo o Brasil. No Vale do São Francisco, dizem que ele é a alma de um vaqueiro que, desrespeitando a Sexta-feira da Paixão, saiu a campear e nunca mais voltou. Sumiu misteriosamente com o cavalo, o cachorro e o gado que campeava, tornando-se uma assombração. Hoje, vive gritando no mato, tocando uma boiada invisível como ele. Embora os seus gritos sejam mais ouvidos durante a noite, o Gritador não tem hora para gritar. Dizem que até o meio-dia ele clama no meio do mato, assombrando os vivos e assustando os bichos. Nas noites de sexta-feira, além de seu aboio triste, são ouvidos o rumor dos cascos do seu cavalo e o ladrar de seu cachorro de campo.
No Sul, a versão mais famosa de sua lenda localiza sua origem na época em que os jesuítas foram expulsos do Brasil pelo Marquês de Pombal. Ao partirem, muitos deles enterraram seus tesouros, esperançosos que um dia retornariam à nossa terra. Enquanto todos cavavam buracos para esconderem suas riquezas, um homem pedia para que eles gritassem para saber a localização de cada um. Esse homem, segundo dizem, não foi embora e ficou no local cuidando do tesouro enterrado. Ao morrer, sua alma ficou presa na região e, à noite, quando alguém grita por um motivo ou outro, ele acha que são seus amigos indicando o lugar de outro tesouro enterrado. Segundo relatos, quando tropeiros ou criadores de gado estão trabalhando à noite e gritam uns para os outros, às vezes escutam outro grito distante. Quando respondem, esse mesmo grito que parecia estar longe, soa cada vez mais perto. Dizem ainda que, se ele chegar até você, ele inicia um duelo; caso você ganhe, ele lhe entregará o tesouro; caso você perca, tomará o lugar dele para cuidar do tesouro eternamente.
Em Santa Cecília, Santa Catarina, conta-se que um jovem muito maldoso, que gostava de judiar dos animais, tinha um cavalo no qual andava o dia inteiro em disparada. Não o tratava como devia, nem ao menos lhe dava água. A noite, deixava o pobre animal preso com uma corda curta, impedindo-o de escapar. A mãe desse jovem, vendo o animal ser surrado e maltratado, esperou que ele dormisse e foi cuidar do cavalo. Após dar-lhe comida e água, ela soltou sua corda, permitindo dessa forma sua fuga.No outro dia, quando o jovem acordou, procurou o animal, não o encontrando, ao descobrir o que havia ocorrido, amarrou sua mãe, encilhou-a e montou, esporeando-a de tal forma que a fez chorar de dor. A mãe rogou uma praga ao filho: ele haveria de gritar de dor, mesmo após a morte. Na noite em que o homem morreu, todos os moradores dos arredores ouviram gritos vindos dos abismos, alguns dizem que seus gritos ecoam até hoje no alto da Serra do Espigão.
Arte de Douglas Viana |
No litoral piauiense, mais precisamente no município de Parnaíba, existem muitas explicações para a origem do Gritador, o qual dizem passar as noites gritando nas ruas. A mais popular delas diz que ele é uma alma condenada a vagar gritando em eterno sofrimento por ter sido amaldiçoado pelo pai em razão de ter assassinado a um irmão seu. Há quem diga que, em seu suplício, ele carrega nas costas uma outra assombração, que tem as pernas nos ombros e a cabeça para baixo e, no caminho, passa o tempo inteiro mordendo os seus pés, sendo esse o motivo de seus gritos. Dizem que se algum curioso for olhar quem grita de perto, ele joga aos pés do curioso a entidade que traz nas costas, na tentativa de livrar-se de seu tormento. No entanto, nesse mesmo instante, a terra treme e a alma atormentadora volta às costas da alma atormentada como que por mágica, e a pessoa, vendo que uma não aflige, senão à outra, perde o medo da aparição.
Relatos do povo da zona rural de Luzilândia, também no Piauí, dizem que de tempos em tempos, se ouve altas horas da noite gritos estrondosos vindo das estradas. Esses gritos vêm do Gritador, um homem que carrega outro, que o mesmo tinha assassinado, e como penitência carrega-o pelos ombros e de cabeça para baixo seguido por dois assombrosos cachorros. Os gritos que se ouvem, é de quando o homem para de caminhar e os cachorros mordem seu calcanhar. Alguns dizem que o gritador era Caim, levando seu irmão Abel, e que ele levava seu irmão como castigo até o fim dos tempos sem poder parar de caminhar. Até hoje não há notícia de nenhum corajoso que tenha conseguido encarar a assombração de frente, até porque basta escutar os seus gritos pra perder o controle do corpo de tanto medo.
Segundo o povo de Esperantina, o Gritador é uma figura muito esquisita, de quem só se vê a sombra, e, quando a pessoa dá de cara com ele, ele abre sua boca até o queixo se aproximar do chão e dá um grito tão alto que faz toda a terra tremer. Diante disso, a pessoa cai no chão desmaiada, tremendo de tanto medo. Depois de dar dois gritos, o Gritador vai embora.
Em São Raimundo Nonato, na zona rural piauiense, também aparece um Gritador. Lá, ele é descrito como sendo mais ou menos da altura de um homem, só que horroroso e todo cabeludo. Quando dá de cara com alguém, só para de gritar quando o galo canta pela primeira vez. Na Lagoa de São Francisco, se ouvem gritos aterrorizantes entre as comunidades Chã dos Bringel e Mororó, mais precisamente nas margens do Rio dos Matos e do Riachão. Segundo populares da região, haveria também por ali um Gritador. Dizem que ele é a alma de um homicida, que, como punição, tem de carregar em suas costas sua vítima por toda a eternidade. Os que já deram de cara com o bicho, dizem que antes de proferir seus gritos, ele dá um sopro forte de cansaço e, só então, começa a gritar, com gritos cada vez mais fortes. O povo dali diz que ele anda vagando pela região em cumprimento de sua maldição, de modo que dela só poderá se livrar para alcançar o descanso eterno no dia em que um idiota qualquer responder aos seus gritos com outros gritos, ocasião em que o Gritador passará sua maldição para o pobre desavisado.
Gritador x Bradador
Por seus nomes terem o mesmo significado e por terem praticamente o mesmo modo de agir, o Gritador e o Bradador são por vezes considerados a mesma figura, embora o Bradador tenha a peculiaridade de ser uma espécie de morto-vivo, similar a outra figura do folclore brasileiro, o Corpo-Seco.
Bradador, arte de Vinícius Galhardo |
fontes:
- https://www.jornalnovaepoca.com/artigo/lendas-do-sul-o-gritador;
- https://www.santacecilia.sc.gov.br/cms/pagina/ver/codMapaItem/25526
- Dicionário do Folclore Brasileiro, de Câmara Cascudo;
- O Médio São Francisco, de Wilson Lins;
- https://causosassustadoresdopiaui.wordpress.com/2017/03/19/o-gritador/
- https://fantasia.fandom.com;
caraca muito bom. Eu sempre achei que o diferencial do bradador era que ele é um espirito que vaga.
ResponderExcluirEu conheço a lenda do gritador do rio grande do sul na divisão de São Francisco e rolante RS que dis que a cada 7 anos o gritador sobe o rio da barrinha em rolante até São Francisco gritando e se alguém ouvir o grito dele e aremedar ele gritando ele aparece bem perto de você e faz um grito ensurdecedor que você desmaia de medo e depois de ele te deixar segue rio acima até chegar a o mato de São Francisco no mato do gritador e lá desaparece até sete anos depois quando ele volta a fazer o mesmo denovo
ResponderExcluirAqui em São Joaquim, SC, também existe essa lenda.
ResponderExcluirE eu mesmo já escutei os gritos.
Mas o autor do grito nada mais é que o graxaim, uma espécie de canideo selvagem, muito curioso, que quando vê um movimento urra ("grita,") e se aproxima pra ver do que se trata.
É mesmo horripilante, daí a origem da lenda.